Ah, suave é ser sozinho
quando o perfume do vento
não nos traz melancolias
e andamos ao crepúsculo
apenas com a vontade
de andar e ir andando.
Atrás, saudade nenhuma
e nenhum desejo à frente:
somente o vento indeciso
a nos brincar nos cabelos
como os dedos de uma extinta
namorada, embalando
o coração quase sereno,
quase alegre – e um tanto triste.
Sejamos como uma eterna
despedida, pois os laços
– de amizade, de ternura –
são algemas invisíveis
ancorando os nossos passos
na estação já percorrida.
E não volvamos o rosto
para os rostos indistintos
– e já distantes – do cais:
eles vieram chorar
nossa morte diante deles.
Sim, morremos. Nada mais
nos reclama nesse porto.
Fantasmas que aqui nós somos,
não velaremos as cinzas
do cadáver que ontem fomos.
Seguiremos adiante,
não bem necessariamente
em frente, mas para onde
quiserem os nossos passos
vagabundos, indolentes,
sem saudades, sem desejos,
nem recordação de beijos
– se acaso os tivemos –,
com os corações vazios
e livres como esse vento
preguiçoso acarinhando
as profundas águas mansas
que refletem nossas sombras.
Sim, suave é ser sozinho,
tendo os seixos como cúmplices
e as flores por confidentes,
seguindo, seguindo sempre,
quietos sobre a estrada,
solenes sob as estrelas,
e sem desejar mais nada
que não seja andar, andar,
caminhar por tudo e sempre,
mas com a condição expressa
de ser – sim! – dos nossos passos
o nosso rastro e o caminho
entre auroras e poentes.
Ah, suave é ser sozinho.
Otto Leopoldo Winck
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