terça-feira, 29 de setembro de 2015


desprezo
ouro:
séquito
é
negro
mar
negro
day
desprezo ouro séquito é
lampejo after corte final



  

 Leticia Tandeta Tartarotti ,poeta carioca

Fonte : mallarmargens
o sertão é gado limpo
música semi-colcheia.
com que roupa eu chego lá?
que pente que me penteia?"

RR


"Pra ti as coisas iguais só serão"
Vê: aquele sol radiante alto
Aproximando-se a trôpegos passos
Em direção aos teus desejos claro
Que só pode ser o amor a queimar
O teu corpo e o espírito o tudo e o nada
Artimanhas e armadilhas da fala
De calor e chamas convulso mar
Vê: o que demais a existência abala
Esse sol que é mesmo o frio do Ártico
Também que amedronta e ao vazio lança
A gasta esperança e o que já lhe basta
Vê: aproveita ainda tens visão
Porque brevemente a ti verás não
Pra ti as coisas iguais só serão

Adriano Nunes



FOLHA SECA


.
"Deixe a folha seca.
Que o vento não a desperte e,
nem a prive desta sombra.
Pois durante sua vida,
sombra ela fez.
.
Deixe que o outono embale seu sono,
mesmo neste chão frio.
Que sua morte seja velada
pelos olhos da solidão e,
pelas noites estreladas.
.
Deixe que sua triste forma
seja símbolo da saudade.
Que poetas, a vistam de versos.
E se Deus, piedade dela tiver,
um dia, no alto de uma árvore ...
.
Ninho será."
.

__ Bruno de Paula

DEVIR



esqueço das várias que fui aos poucos,
o devir vem brutalmente
sem nitidez
rasgando os espectros entorpecentes
das possibilidades
do infinito

sinto meu corpo desvanecer e reintegrar-se
e lembro que
o espaço
é só uma questão de tempo,
um detalhe...
minha mente existe

já imaginei que pudesse brincar com os anjos
e tocar a placidez dos planetas
com um sorriso,
e trazer a luz de um metal precioso
nos gametas,
e declamar um poema incandescente
com um só beijo...
como um tapa na cara
da morte
e nos relógios atômicos que desenham as linhas
de nossa humana
imperfeição

houve um tempo que
acreditei na indecência
do céu e das estrelas...
com tantas constelações
não poderia haver tanta
solidão e violência

desvencilhei-me de amarras
e armadilhas;
escalei um poço escuro arrebentando as vísceras
do tempo
e deixando seus pedaços pelas pedras escorregadias...

não tive medo do desfalecimento
do ser
solucei de saber-me só em trilhas
que pensara que só eu conhecia

reli linhas escritas
displicentemente largadas no lodo
como se valessem todos
os choros,
como cartas indesejáveis sem destinatários
pelas horas infatigáveis que impõem
o seu próprio fim

temi perder meus pensamentos que fugiam,
não os tinha seguros
quando tinha pensamentos demais

enamorei-me da paz do silêncio
que mostra nuances invisíveis
do impossível

enquanto decifrava imagens em mim
indecifráveis,
vasculhava meu coração e sangrava
aquela coragem absurda
de acreditar
e de sentir-se
completamente minha...

sentir é um pequeno momento
de lucidez,
amar é sorver-se e reencontrar-se
no caos de ser várias
ao mesmo tempo;
de sermos nós
no tempo que há

minha mente ainda resiste
ao nada...
meu coração ainda insiste
em fazer morada
no templo do infinito...


Samantha B. S.

segunda-feira, 28 de setembro de 2015




Erótika


minha língua
entre tuas coxas
lambuzando tua Flor de Lótus
de saliva
tudo em couro cru
tudo em carne viva
Artur Gomes
http://artur-gomes.tumblr.com

PRISÃO


Tranquei-me
em mim
e engoli
a porta
da chave.

Luiz Medina
Ela reparava o quanto o céu era grande
enquanto recolhia as roupas do varal
Ela olhava o céu e as crianças.
Ela queria ser parte daquele céu
se via tão pequena diante dele mas ao
mesmo tempo tão grande dentro de si.
Ela voava de dentro de sua cabeça
e era bela a paisagem que inventava
para o resto dos seus dias.
Sua mãe lhe dizia o quanto ela era
parecida com seu pai, seu pai era seco
e infeliz, e isso não lhe deixava nada bem.
Ela sabia que tinha que sair dali
Sabia que não podia ser mais uma mulher
obediente e casta.
Ela agora lavava as louças, mas já não
era mais parte daquele lugar, daquele mundo. Um dia ela virou céu, ao se desprender da perfeição que todos exigiam dela.
Ela virou céu, ela virou o céu mais lindo que os olhos podem alcançar, vivendo sua própria vida sem se importar com o que os outros iam pensar sobre ela.
Agora ela tem asas extravagantes e voa.

MT. Lannes


Eu sempre serei inconveniente
Quando o conveniente
É ser conivente
Com um situação
Deprimente
Indecente
No sentido de que
Tire a dignidade da Minha gente
Sou a mosca
Minha picada é resistente
Não há polícia
Nem recipiente
Que cale a minha voz descontente
A realidade não mente
Só se movimenta
E transforma
Quem luta
Renova

E anda pra frente

Denis Portela

poÉtika 68


era para ser assim como se foice
no papel de seda era língua e sangue
unhas muitos dedos dentes
nos teus céus de boca
era assim como se fosse
meus olhos no cinema
nos teus olhos presos
e o destino do poema teus lábios indefesos

Artur Gomes

do livro: SagaraNAgens Fulinaímicas


https://www.facebook.com/Sagaranagens-Fulina%C3%ADmicas-…/…/
Fuga alada
Nesta manhã de setembro
Depois de uma noite de chuva
Metade de mim
Desaba-se
Em pardais...
Enquanto o dia segue
Com seus para-choques
Atropelando o silêncio.
Num chilreio monótono, insistente...
Ósculos na face da aurora,
Ela voa sobre muros
Daqui pra ali
De lá pra cá
Com ciscos
De poesia no bico
Querendo que o coração continue sonhando
Após meu despertar...
A outra metade,
A qual espera a escada
Da racionalidade,
Reza,
Se levanta
Vai ao toilette
Toma café
Abre a realidade
Nua e crua
No jornal
E, logo, também se desmancha
Em pardal

Valdeci Almeida

SagaraNAgens Fulinaímicas


guima meu mestre guima
em mil perdões eu vos peço
por esta obra encarnada
na carne cabra da peste
da hygia ferreira bem casta
aqui nas bandas do leste
a fome de carne é madrasta
ave palavra profana
cabala que vos fazia
veredas em mais sagaranas
a morte em vidas severinas
tal qual antropofagia
teu grande serTão vou cumer
nem João Cabral severino
nem Virgulino de matraca
nem meu padrinho de pia
me ensinou usar faca
ou da palavra o fazer
a ferramenta que afino
roubei do meste Drummundo
que o diabo giramundo
é o Narciso do meu Ser
Artur Gomes

https://www.facebook.com/Sagaranagens-Fulina%C3%ADmicas-…/…/

Quando olho para o tempo


Quando olho para o tempo
que fica distante dos meus pensamentos,
um medo invade o meu momento,sim,
aquele momento em que eu estou me preparando
para entrar no mundo fantâstico da imaginação.
Os poetas amam,vivem,são amados,são anjos,
porque difícil é entrar num labirinto de palavras
e não sair alimentado de sentimentos,de afeto,
de carinho e compaixão,ser um poeta hoje é saber,
olhar para o nada e vê tudo que um coração sente.

___Nillo Sergio.


Poeta do balcão.

CAFÉ C/ POESIA...90

simplesmente


(carlos careqa, rui werneck de capistrano)

Seja simples
Simplesmente
Mente aberta
Abertamente
Mente doce
Docemente
Mente certa
Certamente mente rara
Raramente mente doida
Doidamente mente clara
Claramente
Seja frágil
Fragilmente
Mente Linda
Lindamente
Mente ágil
Agilmente
Mente meiga
Meigamente
Mente viva
Vivamente
Mente calma
Calmamente
Mente nova
Novamente
Mente simples





não há palavra dentro:
só a palavra dentro
tenta dizer-se inutilmente
um pouco além da pele
não há verbo que transcenda
ou que espere no princípio
alçar nem que seja sílaba
fora de seu círculo
de fora a fora: só assim
a palavra dentro se comprime
no espaço entre ser e ser
mesmo que ausente
só assim a palavra-ato
se conforma e se confirma:
nem dentro nem palavra:
só o fora onde tudo é líquido

Carlos Moreira

Caraá



ser do avesso
é ter a capacidade
de viver
com o antagonismo
nas tripas
algo que se expele
todo dia
contudo
amanhã
ele terá
nascido
diferente
é preciso
botar
no amanhã
o peso
do agora

Júlio Alves




Poema Para Touro Rompesuelas



Rompesuelas era um touro escuro
Como uma linda noite de inverno sem Lua
Porém, de um jeito duro e obscuro
Foi sacrificado e torturado em plena rua

Numa festa chamada “ Toro de La Ve ga “,
Onde a crueldade não se nega,
O pobre Rompesuelas foi escolhido
Para ser morto, perseguido e ferido!

Ele correu como uma assustada criança
Fugindo de homens maus com lança!

Seu sangue sagrado escorreu pela cidade
E, com uma lança no pescoço, foi morto de verdade!
Agora, eu me pergunto onde está a humanidade
Que pensa que fazer festa é praticar maldade?

Hoje, Rompesuelas é uma estrela que brilha
Por toda a cidade de Tordesilhas
Pois ele sempre possuiu uma alma que vale ouro
Por isto se juntou à constelação de touro

Para onde vão todos os bovinos
Sacrificados com desatinos!
Rompesuelas virou um símbolo contra a tortura
Pois apesar da morte, seu brilho ainda perdura
Seus chifres viraram uma torre de marfim
Pois a esperança contra a dor não tem fim!

Seu sangue virou um sagrado rubi
Com aroma mágico de patchuli!
Até quando o homem vai matar por prazer?
Estrelas avisam que isto não pode mais acontecer

Rompeseuelas rompe o solo e mais de mil sacrifícios
Contra bovinos nas touradas e nos frigoríficos.

Luciana do Rocio Mallon

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

SERENATAS


Nas quentes madrugadas do estio, de repente ouvia-se, como se surgida do nada, as vozes dos cantores acompanhadas por seus instrumentos, geralmente sob alguma janela do quarto de uma jovem ou mesmo para alguma família amiga.
E como era bom acordar com as músicas românticas, próprias para serenata, esmeradamente executadas pelos amigos em nossa homenagem. Recebemos várias as quais guardamos com carinho inolvidável em nossas memórias.
Em Piraí do Sul havia um grupo de amigos que sempre nos presenteava com a sua maravilhosa música noturnal - só não cito os nomes dos componentes para não cair no pecado de esquecer-me de alguém - . Então, esperávamos que cantassem algumas delas para degustarmos um pouco mais aqueles momentos encantadores e, só depois, acendíamos a luz e os convidávamos a entrar.
E aí, entre alguns petiscos e alguma bebida, o “papo” rolava intercalado por mais algumas peças musicais, até quase ao amanhecer.
Bons tempos e boas recordações de uma terra encantadora e mágica, onde as pessoas ainda tinham tempo para encantar os seus amigos

Jorge Abrão

ABNEGADOS


Em todas as cidades, principalmente nas de pequeno porte, onde todos conhecem todos, sempre existiram e existem pessoas conhecidas por sua dedicação ao próximo que, mesmo depois de seus passamentos, vivem nas memórias de todos que as conheceram.
Em Piraí do Sul não é diferente, e um exemplo marcante desses abnegados foi o casal Dinorá Quirilo Milléo e Sanito Milléo - dona Didi e seu Tota -. Muito embora fossem comerciantes na área da saúde, proprietários de farmácia, sempre extrapolaram as suas funções, procurando ajudar os que não tinham recursos para manter os seus tratamentos, saindo de casa a qualquer hora do dia ou da noite para aplicar injeções nos doentes, de alguma forma tentando aliviar a dor e o sofrimento de seus concidadãos. Eram altruístas por excelência.
Dona Didi, com seu sorriso cativante e sua voz cadenciada, encantava a todos com a meiguice e o carinho que lhes eram peculiares, nunca se ouviu dizer que tivesse rusgas com quem quer que fosse. Além desses seus predicados, somem-se ao fato de ser uma excelente dona de casa, dedicada à culinária, fazendo sempre cursos de aperfeiçoamento e confeccionando pratos diversos para brindar os seus familiares e amigos.
Seu Tota, com a sua simplicidade e seu modo de ser, era homem de muitos amigos e a quem todos queriam bem. Além do seu mister no comércio, gostava muito da vida no campo e tinha uma chácara onde criava, plantava e passava os seus momentos livres.

E são pessoas devotadas como eles que ajudam e ajudaram a construir uma cidade mais humana e singular como é Piraí do Sul.

Jorge Abrão

CONCURSO DE CRÔNICAS E POEMAS "PIRAÍ DE ANTIGAMENTE"

JOIA DA SERRA DAS FURNAS




Quanto encanto nos morros que a cercam,
E quanto verdor nas matas que os recobrem,
Quanta beleza nessas molduras naturais,
Da cidadezinha que é uma linda joia,
Encravada na Serra das Furnas!
Todos que a conhecem se apaixonam,
Se ficam, é como seus filhos fossem,
E se partem, sempre querem voltar.
Pois quem bebe a sua água e respira seu ar,
Jamais a deixará de amar, jamais a olvidará.
Assim é Piraí do Sul, terra bela e amada,
Berço de grandes homens dos quais se orgulha.
Relicário de Nossa Senhora, São José e do Menino Deus,
Sítio de muita fé e de grande religiosidade.

Um cabedal de riquezas históricas e culturais.

George Abrão 

CONCURSO DE CRÔNICAS E POEMAS "PIRAÍ DE ANTIGAMENTE"
para mim ela virá
dos terreiros de salvador
das entranhas de yansã
dos raios de qualquer manhã

para mim ela virá
dos cabelos de Oxum
das águas de Yemanjã
do cosmo colo de Oxalá

para mim ela virá
da espada de Ogum
dos tambores de Olodum
para mim ela virá

da lavagem do Bonfim
de algum anjo SerAfim
para mim ela virá

Artur Gomes

http://artur-gomes.tumblr.com/…/para-mim-ela-vir%C3%A1-dos-…


Sempre que venho a São Paulo a metrópole suscita emoções várias. O monstro com tantas caras, tantas bocas, braços e pernas...e sou alguém que vem de um lugar pequeno, uma aldeia, como a maioria dos que moram aqui. Pensar que tenho este lugar p voltar, e que cada vez mais me encanto pelo minúsculo me dá a certeza de que um dia conquista rei as metrópoles por ter sabido sair da Fortaleza da solidão.

Marilia Kubota

COMPANHEIRISMO


Quando a Música
Vem
Das profundezas
Do Ser
A pele
Se tatua
Com as notas
Do Amor
E assim
Será possível
Exalar
Compaixão
Pelos poros
E o toque
Dos nossos
Corpos
Em outros
Corpos
Será
A expressão
Do toque
Divino

Mirian Cerqueira Leite

Modus Operandi


Se não és senhor de ti mesmo, ainda que sejas poderoso, dá-me pena e riso o teu poderio.
(Josemaría Escrivá)
Inventei outra dor. A de ontem era insuportável, estava aprisionada com
seu destino de dias memoráveis, na cela pretensa da previsibilidade. Esperada. Morrerei de uma dor amorfa e estrangeira, distinta, incoerente. Uma dor homicida, que furará com olhar de desdém, as muitas que já senti.

Julio Urrutiaga Almada do Livro Caderno de Ontem

Nossa Infância


Nossa infância em Pirai foi repleta de alegrias, brincadeiras e peraltices.
Vou simplesmente relatar alguns fatos, esperando que “os personagens” se identifiquem e curtam estas lembranças.
Quem se lembra de algumas pescarias e acampamentos no tanque de uma olaria lá no Butiá? Quando era fisgado algum peixe (cará, lambari ou traíra) saímos correndo e gritando:
- Batatinhaaaaaaaaaaaaaaaaaa!
Naquela mesma propriedade fizemos algumas “maldades”, tais como: caçar rolinhas, fazer guerras de pelota de argila e até mesmo assar churrasco na boca do forno de queima de tijolos.
Sem contar que num certo dia, no retorno para a cidade, todos de bicicleta (naquele tempo era bicicleta e não bike) ouvimos um forte barulho oriundo do mato, nas proximidades da bica de água; lembro só do “tropé”; teve um que até carregou a bicicleta nos lombos....
E o campinho da Gerça, quantos “corridões” levamos. Um dos “atletas”, quando ficava irritado, levava as traves e a bola para sua casa.
Tinha também o barracão aonde íamos “caçar” morcegos, ou melhor: “vampiros” para dar mais emoção.
O tanque do Zé Mico, onde tomamos muitos banhos e também muitas pescarias.
As “praínhas” do Vete, do Orestes e da Apolônia, refrescaram muito de nós; quantas vezes (muitas escondidas de nossos pais) frequentamos aqueles locais?
O time de futebol de salão do “Paraná”, cujos treinamentos eram realizados na quadra do Clube União Piraiense, disputando varias partidas nas cidades da região;
Numa das viagens, acho que para Carambeí, um dos nossos amigos, hoje comerciante, chegou num restaurante e foi perguntando: “O moço, quanto sai este kochito?”, se referindo ao chocolate da moda: Chokito.
O morrinho, local de manobras da estrada de ferro, aparentava ser uma elevação gigante, da qual descíamos felizes a bordo de pedaços de papelão.
São apenas algumas reminiscências, cujo objetivo principal é relembrar nossos bons tempos na nossa terra natal.

George Abrão

CONCURSO DE CRÔNICAS E POEMAS "PIRAÍ DE ANTIGAMENTE"

A ESTAÇÃO


Ao longe se ouvia um apito dolente e, logo após, o “blém-blém-blém” do sino dando o “pode” para que o comboio adentrasse o pátio da estação.
E a maria-fumaça chegava célere e resfolegante, soltando chispas pela chaminé, soberba e majestosa, sobre os trilhos de ferro que a conduziam ao seu destino.
E nos domingos à tarde, a plataforma da graciosa estaçãozinha de madeira ficava apinhada de piraienses - moças e rapazes – que lá iam para assistir a passagem do trem de passageiros. E isso era uma festa, pois na estação o trem ficava por algum tempo para que os passageiros pudessem descer e “esticar as pernas”, ou até mesmo fazer um lanche no boteco lá existente.
E nessas paradas nasceram muitos amores platônicos, alguns namoros e até casamento entre passageiros e habitantes locais.
Mais tarde a maria-fumaça foi aposentada, vindo em seu lugar as deselegantes locomotivas movidas a óleo diesel que mesmo sendo feias, cumpriram por muito tempo a sua missão. Os trens de passageiros também foram extintos, ficando somente os de carga, perdendo a estação o seu encanto das tardes de domingo.
Com o passar do tempo e com as rodovias sendo pavimentadas, até os trens de carga se acabaram, mas a velha estação manteve-se lá, encantadora, tendo como cenário de fundo o serro piraiense e sendo símbolo de uma época que deixou saudades.
E como era bom ver a estação no final da avenida, pois embora inativa, quando por lá passávamos, parecia-nos ainda ouvir o apito, o sino e o burburinho em sua plataforma. Só que numa noite fatídica, vândalos incendiaram aquele que era um dos símbolos da pacata Piraí do Sul. Ao amanhecer, só restavam um monte de cinzas e carvões, ainda fumegantes,
Hoje, a querida estação só existe em algumas fotos e em imagens nas lembranças dos piraienses, que saudosos, sempre relembram da sua estação.

George Abrão


CONCURSO DE CRÔNICAS E POEMAS "PIRAÍ DE ANTIGAMENTE"

A RAINHA DE PIRAÍ DO SUL


Foi numa ensolarada tarde de domingo de 2002 que ela retornou a Piraí do Sul, para novamente reinar no local de onde nunca deveria ter saído.
E então, naquele abençoado dia ela voltava caprichosamente restaurada, e o povo piraiense, que já algum tempo estava sem a sua rainha, festejou, louvou, acenou e rezou, acompanhando-a até ao seu palácio, no meio de um belo bosque, de onde ela fora, há cerca de um ano, rapinada por vândalos ímpios e cruéis, que depois a laceraram e a jogaram no mato.
E a bela imagem em cedro de Nossa Senhora das Brotas, Rainha de Piraí do Sul, que há anos fora confeccionada em Portugal, encomendada por Frei Guido Husman, no meio de muita festa, foi novamente entronizada na bela capela onde fica exposta, aguardando seus filhos fiéis que sempre estão lá, pedindo-Lhe a benção e proteção ou agradecendo por graça alcançada através da Sua intercessão, principalmente em todo dia 27 de dezembro, dia da grande festa em sua homenagem.
Nossa Senhora das Brotas, Padroeira dos Tropeiros, protetora do gado, agricultura, doentes e necessitados, cujo culto em Piraí do Sul deu-se no ano de 1808, quando uma sua estampa foi trazida por Santo Antonio de Santana Galvão e deixada com uma família.

Nossa Senhora das Brotas, Rainha de Piraí do Sul!

George Abrão

CONCURSO DE CRÔNICAS E POEMAS "PIRAÍ DE ANTIGAMENTE"

O SACI DE PIRAÍ


Quase todas as noites meu pai contava histórias para as filhas pequenas pegarem no sono. Sentava numa cadeira colocada entre as camas e invariavelmente começava assim: “Quando eu era guri, em Pirai...”.
E aí lá vinha o saci-pererê, que morava embaixo da ponte, onde ficava pitando um cachimbo, cuja “fumacinha” subia e passava pelas frestas dos tabuões, intrigando os passantes. Certa vez o cavalo da carroça do Joaquim Barrigudo empacou, levantando as orelhas, assustado. Ôooou, ôooou, tentava o carroceiro, mas nada do animal sair do lugar. Esse saci era o responsável por coisas muito estranhas que aconteciam. Certa vez os meninos tinham ido tomar banho no tanque da serraria, escondidos dos pais, como sempre. Por isso as roupas tinham que ser mantidas sequinhas, estendidas nas moitas de capim. Quando saíram da água, na hora de ir embora, as roupas tinham sumido. Já cansados de tanto procurar, resolveram que era melhor esperar anoitecer para não serem vistos pelados andando pelas ruas. Bronca na certa! Coisa do saci, só podia ser! Esse moleque de uma perna só, que ninguém via, tinha o hábito de dar nó nos rabos das vacas durante a noite. De manhã, na hora da ordenha, era uma trabalheira danada. Ele também gostava de esconder tudo em casa. Sumia algo, era o saci. Certeza que tinha passado por ali. Até pouco tempo atrás, confesso, eu tinha dúvidas se as histórias eram inventadas ou se tudo realmente aconteceu. Mas ao encontrar na internet uma fotografia do Joaquim Barrigudo e seu carroção, pude comprovar: era tudo verdade mesmo!

Meu pai nos deixou há pouco tempo, e em todos esses anos eu só estive em Piraí de passagem, mas esse lugar mágico, onde coisas incríveis podem acontecer, existe! E embaixo de alguma ponte, lá em Piraí, deve estar pitando um moleque arteiro, tramando a próxima travessura.

Jorge Abrão
CONCURSO DE CRÔNICAS E POEMAS "PIRAÍ DE ANTIGAMENTE"

ODE A PIRAÍ DO SUL


Piraí, terra de Nossa Senhora das Brotas,
De São José e do menino Deus,
Dessa trindade sagrada que abençoa o seu povo,
Que a torna berço de fé e de religiosidade!
Piraí do Bosque das Brotas, do Morro da Nhá Gica,
Da Vila Bethania, da Fonte do Bicão.
Da singeleza das suas praças e das suas ruas,
Dos seus bairros rurais e de seus campos em flor!
Do Campo da Baixada e do Ginásio de Esportes,
Dos grandes bailes e das antigas serestas,
Dos antigos cinemas: Íris e Imperial,
Dos belos pinheiros e das suas palmeiras!
Ah, minha querida Piraí!
Pequena cidade, encantadora e hospitaleira,
De um povo acolhedor, alegre e bondoso,

Você é tudo isso e muito, muito mais!

Jorge Abrão
CONCURSO DE CRÔNICAS E POEMAS "PIRAÍ DE ANTIGAMENTE"

HOMENAGEM A PIRAÍ DO SUL


Piraí querida!
Quanto lembrar de você
Lembranças tão boas...
Saudades que trago em mim
Da sua gente bondosa
Da acolhida generosa
Com que você nos recebeu
Quando, anos e anos atrás,
Fizemos aí nossa morada;
Não foi por muito tempo
Mas o suficiente
Para você nos cativar
E não querer ir embora
Nunca, nunca mais ...
Mas nós continuamos aí
Pois você está em nós
Impregnada na alma
Do sentir seu sangue bom...
Trazemos conosco,
O manto com o qual,
Ao chegarmos nos cobriu...
Piraí de mim
Dos meus
Piraí dos seus
Onde aponta o dedo de Deus
Pra abençoá-la ainda mais...
Piraí dos meus ais de saudade
Mãe da tranquilidade
E da paz que é de você...
Piraí das graças
Das praças
De raça boa
Piraí das matas verdes
Do matar da sede
Daqueles que sedentos
Buscam a sua acolhida
Pra se sentirem em casa...
Piraí das grandes araucárias
Com seus pinhões colhidos no chão
Assados lá mesmo sob as árvores
Ah... quanto fiz isso... que saudade...
Piraí das hortências e agapantos
Brotados assim... tão azuis,
Nos canteiros dos jardins...
Saudosa e alegre Piraí do Sul
Dos bailes tão animados
Dos tantos amigos deixados
Porém nunca, nunca esquecidos...
Piraí de Nossa Senhora
Das Brotas, do santuário,
Das barraquinhas lotadas
De tantos penduricalhos
Contornando a bela igreja
Bem no centro, imponente
Toda cercada de gente
Festejando, congraçando
Alto-falante animando
Cabreúva não faltava
E as pipocas pipocando,
Alegria em profusão
Crianças de lá pra cá
Ah, meu Deus...como era bom...
Que saudade isso me dá...
E então, o que dizer
Do colégio lá no alto
Tão lindo, tão majestoso
Cartão postal da cidade
Onde sempre imperou
E creio que ainda impera
Excelente educação...
Irmãzinhas Marcelinas,
Coração e alma boas
Vocês sempre tão presentes
Me ajudaram em tantas coisas
Ensinaram o melhor
Para os meus queridos filhos
Quando eles tão crianças
Tiveram o privilégio
De estudar aí com vocês...
Piraí, tão terna e eterna
Cidade do coração
Paixão pela sua gente
Amor pelo seu solo
Que nos dias muito frios
Me aqueceu com seu colo
Nos fez gostar de você
Feito fôssemos seus filhos;
Piraí... quanta saudade
Dos nossos tantos amigos
Ah... que saudade eu tenho
Dos amigos dos meus filhos
Daqueles ajuntamentos
Bem em frente à nossa casa...
Saudades das serenatas
Saudades dos meus vizinhos
Tão amáveis... tão solícitos...
Volto aí e me deparo
Com tantos... tão sempre iguais...
Gente que nunca envelhece
Volto aí e percebo que ao crescer,
Você Piraí querida
Se tornou mais bela ainda...
Volto aí, e recebo de todos
O mesmo acolhimento
Que eu sempre recebi.
Que saudades, minha linda...
Beijo você tantas vezes
E me curvo em gratidão
Piraí, amor eterno
Guardado dentro de mim

Bem aqui no coração...

Jorge Abrão.
CONCURSO DE CRÔNICAS E POEMAS "PIRAÍ DE ANTIGAMENTE"

PIRAÍ DO SUL: UM BERÇO DE CULTURA


Uma cidade de formações, onde nasceram os mais ilustres cidadãos!
Do mais simples matuto, muito astuto ao comandante de um vasto chão!
Uma cultura apreciada no estado inteiro: o “Paranazão !
Somos conhecidos, somos fortes e unidos! Salve Piraí, terra querida,
Que jamais será esquecida por quem tomou a água do Bicão!


George Abrão 

CONCURSO DE CRÔNICAS E POEMAS "PIRAÍ DE ANTIGAMENTE"

O PERFUME DA GIESTA


No início da primavera, à noite, em Piraí do Sul, um doce e delicado perfume invadia o ar. Era o início da florada da giesta, uma planta arbustiva que produzia belas e olorosas flores amarelas, ficando recoberto por elas. E como em Piraí muita gente a tinha plantada em seus jardins, na cidade toda, os moradores deliciavam-se com ele.
Sobre a giesta existe uma história muito bonita, pois depois de Jesus nascer, o Rei Herodes mandou matar todos os meninos recém-nascidos para eliminá-lo. Só que, um dos ajudantes do cruel rei, para evitar que se matassem muitas crianças, sugeriu que na porta da casa de Jesus se colocasse um ramo de giesta, pois dessa forma os soldados de Herodes saberiam onde o Menino estava. Porém, no dia seguinte, quando os soldados procuraram a casa ficaram espantados, porque todas as casas estavam enfeitadas com gistas nas portas. Dessa forma, essa bela planta está associada à tentativa infrutífera de matar Jesus.
E por isso, em Portugal, na sua região norte, a todos os dias 1º de maio é comum ver-se ramos de giestas decorando as portas das casas, pois segundo a crença popular, a giesta tem a propriedade de afastar o diabo e o mau-olhado das casas.
Coincidência ou não, como o Senhor Menino Deus é o padroeiro da cidade de Piraí do Sul, talvez a profusão de giestas que lá existiam, ou ainda existem, esteja relacionada com isso, pois esta linda e aromática flor significa preferência e renovação.



George Abrão 
CONCURSO DE CRÔNICAS E POEMAS "PIRAÍ DE ANTIGAMENTE"


"(...) Como João do Rio, Moutinho vasculha todos os cantos do Rio de Janeiro. Como Rubem Braga, sabe catar a poesia desenhada em cada uma de suas calçadas, e como Nelson Rodrigues, arranca os dramas gregos de cada cidadão comum e os conta com lirismo e graça, como fez Fernando Sabino. Em outras palavras, Marcelo Moutinho retoma uma das mais sólidas tradições de nossa crônica, o texto feito para falar de uma cidade e não apenas o olhar individualista e petulante que tanta grassa nos cronistas de plantão (...)"

Marcelo Moutinho

Resenha de "Na dobra do dia" no Jornal Rascunho


Saia Daqui


Desde o paço da ordem
Até o largo da liberdade
Meus olhos alterados
Acaso olhos exaltem
exalarão fogo e forte
vontade
de sorver
em um picar de olhos:
o vício da imagem
A Esperança é
O trago mais
Sujo da humanidade
Com respeito aos velhos vocábulos
Com despeito aos iniciáticos
Comamos pão e ácido
Não há comida senão:
O roubo galáctico
Eles vendem nossa alma
Entregam flor de plástico
O selvagem a nos informa:
O museu fecha no sábado:
Sabático?
Eu não quero descanso
Eu não quero guarida
Eu só quero uma noite
Que vença a vida


Julio Urrutiaga Almada
do Livro O amor é um precipício do cão

CARTA A UM IRMÃO



Convirá tantas vezes morrer,
tantas vezes fluir,
tantas vezes amar,
tantas vezes viver com a vida entre os dentes como um sabre?
Convirá crescer para a possibilidade de sermos podados?
Convirá a pungência das horas amargas, das horas
comuns?
Talvez nos convenhamos assim,
com a grande paisagem a ser construída --paisagem bruta e de pureza.
Assim nos conviremos, cheios de arestas e dilemas,
encravados na praça interior dos brinquedos de metal.

Aceitar e passar a existir sem tréguas.
Aguardar com cicatrizes um ao outro para surpreender.
Convirá viver não do que se vive
mas do que se conquista?

Convirá viver não do maldito tempo e do bendito tempo,
mas do tempo que nasce para nascer?
Eu abençoo porque nada se acresce em vão.
Nem o mútuo roubo das redomas --vestígios de noite,
reencontros, memórias e ventos--
nem o trauma de caminhos interrompidos
e o silo das coisas perdidas
que pouco a pouco fecha o seu portal.

Sentir o peso das abóbodas
e não sucumbir.
Sacudir a árvore com vento nascido de dentro
para que pássaro nenhum se agasalhe
e o verde de fruto nenhum
permaneça em estagnação.
Drenar o presente como um passaporte.
Parir contra as fachadas dos muros
para o pânico esplender
como um barco de asas
ou uma crisálida dentro do cérebro
fingindo voar.

Convirá isto que nos comprime para fora,
este quase inteiro infinitamente multiplicado em pedaços,
este ter uma vara nas mãos para buscar água
e ser caminheiro no reino das passagens a vau?
Assim nos conviremos. Nunca mais o fingir
para caber no porto
e saber das dores todas do nascer
com anos, águas e sedas.

Oh! Convém, inteiramente convém,
convém viver,
convém viver com inconsequência,
convém viver como convém ter membros e sangue,
confluir sem intercalações,
com nenhuma sobra,
com nenhuma senha.


LINDOLF BELL

(1938-1998) poeta catarinense, publicou mais de 12 livros de poemas, formou-se pela EAD e iniciou o movimento Catequese Poética, logo após o golpe militar de 64. A primeira apresentação foi na Boate Ela, Cravo e Canela, situada logo abaixo do Juão Sebastião Bar, na rua Major Sertório. Após o sucesso dessa apresentação, Bell participou de recital no Teatro de Arena e do Sermão do Viaduto, organizado pelo poeta Alvaro Alves de Faria. A partir daí a Catequese Poética conquistou a adesão de vários poetas, criou núcleos em algumas cidades do Brasil e realizou a 1ª Feira de Poesia, na Galeria Ouro Fino, Rua Augusta. A Catequese Poética levou poetas e poemas a mais de 100 cidades brasileiras. As apresentações aconteciam em livrarias, teatros, sindicatos, universidades, colégios, bares e praças. Os poemas divulgados aqui estão no livro Lindolf Bell – 50 anos de Catequese Poética (Editora Patuá,2014).

POEMA PARA UM ALIENADO



Nada se converte fora de si
apesar dos deuses
E não existe exoneração,
existe vocação
Não significam tanto, tantas verdades,
em verdade
Lastro de carne e alma
os homens se prolongam
nas semeaduras
e se arrancam nas segas
e porque caminham com os ombros em forma de arco
de tanto visar o solo
e porque as paisagens os arrastam
conhecem pouco do universo

No entanto, podemos ser próximos
sem sermos anexos,
a imagem do tambor
pleno de velhas mensagens
da floresta tão fechada
como o ventre antes da madurez

Tudo é determinado como a conjugação das coisas
A plenitude dista sempre um ponto além
e as genituras não transpõem
os corpos de ensaio

A vida lembra um catavento
fatigado de tantas direções

Morte — feixe de crimes a constranger

E porque o núcleo é onde tudo cessa
nada se converte fora de si

Lindolf Bell


O POEMA DAS CRIANÇAS TRAÍDAS


Eu vim da geração das crianças traídas
Eu vim de um montão de coisas destroçadas
Eu tentei unir células e nervos mas o rebanho morreu.
Eu fui à tarefa num tempo de drama.
Eu cerzi o tambor da ternura, quebrado.

Eu fui às cidades destruídas para viver os soldados mortos.
Eu caminhei no caos com uma mensagem.
Eu fui lírico de granadas presas à respiração.
Eu visualizei as perspectivas de cada catacumba.
Eu não levei serragem aos corações dos ditadores.
Eu recolhi as lágrimas de todas as mães numa bacia de sombra.
Eu tive a função de porta-estandarte nas revoluções.
Eu amei uma menina virgem.
Eu arranquei das pocilgas um brado.
Eu amei os amigos de pés no chão.
Eu fui a criança sem ciranda.
Eu acreditei numa igualdade total.

Eu não fui canção mas grito de dor.

Eu tive por linguagem materna, roçar de bombas, baionetas.
Eu fechei-me numa redoma para abrir meu coração triste.
Eu fui a metamorfose de Deus.

Eu vasculhei nos lixos para redescobrir a pureza.
Eu desci ao centro da terra para colher o girassol que morava no eixo.
Eu descobri que são incontáveis os grãos do fundo do mar
mas tão raros os que sabem o caminho da pérola.
Eu tentei persistir para além e para aquém do contexto humano,
o que foi errado.

Eu procurei um avião liquidado para fazer a casa.
Eu inventei um brinquedo das molas de um tanque enferrujado.
Eu construí uma flor de arame farpado para levar na solidão.
Eu desci um balde no poço para salvar o rosto do mundo.
Eu nasci conflito para ser amálgama.

II

Eu sou a geração das crianças traídas.
Eu tenho várias psicoses que não me invalidam.
Eu sou do automóvel a duzentos quilômetros por hora
com o vento a bater-me na cara
na disputa da última loucura que adolesceu.
Eu sou o anti-mundo à medida que se procura o não- existir.
Eu faço de tudo a fonte para alimentar a não-limitação.
Eu sei que não posso afastar o corpo que não transcende
mas sei que posso fazer dele a catapulta para sublimar-me.

Meu coração é um prisma.
Eu sou o que constrói porque é mais difícil.
Eu sou o que não é contra mas o que impõe.
Eu sou o que quando destrói, destrói com ternura
e quando arranca, arranca até a raiz
e põe a semente no lugar.
Eu sou o grande delta dos antros
Os amigos mais autênticos são as águas que me acorrem.

Eu sou o que está com você, solitário.
Quando evito a entrega, restrinjo-me.
Quando laboro a superfície é para exaurir-me.
Quando exploro o profundo é para encontrar-me.
Quando estribo braços e pernas na praça sobre o não alterável
É para andar a galope sobre a não-liberdade.

III

Sem bandeira que indique morte qualquer,
avanço das caliças.
Sem porto fixo à espera, nem lar de maternas mãos
ou rua de reencontro.
Ostento meus adeuses.
Sem credo a não ser à humanidade dos que se amam e desamam,
anuncio a catarse numa sintaxe de construção.

Eu escreverei para um universo sem concessões.
Eu saberei que a morte não é esterco,
mas infinda capacidade de colher no chão menos adubado,
que poderei sorvê-la como à laranja que esqueceu de madurar,
que serei alimento para o verme primeiro da madrugada,
que a vida é a faca que se incorpora em forma de espasmo,
que tudo será diferente, que tudo será diferente, tão diferente...

Eu quero um plano de vida para conviver.
Eu ostentarei minha loucura erudita.
Eu manterei meu ódio a todos os cetros, cifras, tiranos e exércitos.
Eu manterei meu ódio à toda arrogante mediocridade dos covardes.
Eu manterei meu ódio à hecatombe de pseudo-amor entre os homens.
Eu manterei meu ódio aos fabricantes das neuroses de paz.
Eu direi coisas sem nexo em cada crepúsculo de lua nova.
Eu denunciarei todas as fraudes de nossa sobrevivência.
Eu estarei na vanguarda para conferir esplendores.
Eu me abastardarei da espécie humana.
Mas eu farei exceções a todos aqueles que souberem amar.

Lindolf Bell


Lenda da Cigana Rosa dos Ventos


Por volta do ano 250 a. c. existia um navegador chamado Aristóteles Timóstenes. Um certo dia ele decidiu navegar com o seu barco. Mas, de repente, foi surpreendido por uma forte tempestade e, no meio da confusão, sua bússola simples, feita de pedras especiais, quebrou. No meio daquela chuvarada, ele percebeu que uma moça se afogava no mar. Então, jogou uma espécie de boia feita de bexigas de animais, que estava amarrada a uma corda, em direção da jovem. Assim ela chegou até seu barco e lhe agradeceu:
- Obrigada, senhor!                                            
O homem disse:                             
- Disponha!                        
- Porém não sei se conseguirei achar terra firme, depois que esta tempestade passar, porque meu aparelho guiador quebrou.
Naquele mesmo instante, a chuva parou e o Sol voltou a brilhar.
Desta forma a moça explicou:
- Sou a cigana Rosa dos Ventos e posso construir uma bússola nova para você. Basta eu sapatear, em forma de círculo e formar uma estrela com as batidas dos meus pés no chão do seu barco.
Desta maneira, a donzela bailou os passos prometidos e formou uma flor, que acabou virando uma bússola diferente que mostrava todos os pontos cardeais porque apontava a direção dos quatro sentidos fundamentais de orientação geográfica e representava uma volta completa do horizonte, com seus pontos cardeais: norte, sul, leste e oeste; pontos colaterais: nordeste, noroeste, sudeste e sudoeste; e pontos subcolaterais: nor-nordeste, lés-nordeste, lés-sudeste, su-sudeste, su-sudoeste, oés-sudoeste, oés-noroeste e nor-noroeste.
Assim os dois chegaram a uma ilha. Mas a cigana faleceu na floresta deste lugar e nasceu uma flor debaixo do solo onde se corpo foi enterrado. O problema é que seu amigo, navegador, não conseguiu divulgar tão bem o novo modelo de bússola.
Alguns séculos depois, Rosa dos Ventos apareceu nos sonhos noturnos de um outro inventor, chamado Flávio Gioia, onde ela ensinou este homem a fazer uma nova bússola, com seu nome, por meio de uma agulha sobre um cartão onde havia uma flor desenhada. A partir daquela noite, este tipo de instrumento tornou-se popular.
Reza a lenda que a cigana Rosa dos Ventos é uma entidade que ajuda as pessoas que estão perdidas, precisando de uma direção. Ela, também, auxilia seres que se perdem em lugares ermos e não conseguem mais voltar a seus locais de origem.

Luciana do Rocio Mallon

Lenda da Procissão dos Mortos


Aqui, no Brasil, um conto oral que mais se aproxima da tradição do Halloween é a Lenda da Procissão dos Mortos, que possui várias versões, dentre elas a mais conhecida é esta:
Na época do Brasil-Colônia existia uma vila no interior do Nordeste, onde moravam muitos descendentes de irlandeses, que logo se misturaram com afrodescendentes, índios e descendentes de portugueses que estavam antes aqui.
Neste tempo, havia uma menina chamada Beatriz que sabendo do novo casamento de sua mãe, fugiu para a floresta bem no dia 31 de outubro. Então ela achou uma estrada secreta e escutou um barulho ao longe. Com medo de ser reconhecida, a garota se escondeu atrás de uma moita. Logo apareceu uma procissão. Mas ela notou que a maioria dos integrantes eram criaturas já falecidas como seu pai, sua avó e até o seu bichinho de estimação. Deste jeito, ela correu para perto de sua falecida vovó, que disse baixinho:
- Volte logo para a casa, pois esta é a procissão dos falecidos, que somente acontece dia 31 de outubro. Pois nesta data abre-se um portal para que os mortos voltem à Terra e, deste jeito, eles tem uma chance de sair do purgatório e esta procissão é uma destas chances. Se orarmos, com fé, durante este desfile, conseguiremos sair dos vales das sombras.
Desta forma, Beatriz obedeceu à anciã. Porém, depois ela descobriu que outros vivos da vila já passaram por experiência semelhante, sempre na mesma data: 31 de outubro.

Luciana do Rocio Mallon

segunda-feira, 14 de setembro de 2015

O Homem Público N. 1 (Antologia)



Tarde aprendi
bom mesmo
é dar a alma como lavada.
Não há razão
para conservar
este fiapo de noite velha.
Que significa isso?
Há uma fita
que vai sendo cortada
deixando uma sombra
no papel.
Discursos detonam.
Não sou eu que estou ali
de roupa escura
sorrindo ou fingindo
ouvir.
No entanto
também escrevi coisas assim,
para pessoas que nem sei mais
quem são,
de uma doçura
venenosa

de tão funda.

Ana Cristina Cesar

domingo, 13 de setembro de 2015

aylan kurdi



não morreu a história.

numa praia pedregosa
de halicarnasso, terra de heródoto,
não morreu a história.

melhor seria
que um fósforo de hegel, riscado
nos faróis e cátedras
de quantas teleologias,
não apagasse
ao sopro desta tempestade.

o mar é tautológico,
argos que roesse os infinitos
ilíacos de homero, baralhados e cuspidos
feito búzios.

um cão dormirá talvez
naquelas mesmas praias e pedras,
desmemoriado.
um cão,
um turista,
uma criança viva.  (dormiriam aliás,
                         tranquilos,
                         à ilharga
                         de qualquer outra praia.)

não morreu a história.
numa praia pedregosa
de halicarnasso, terra de heródoto.


***

abdullah kurdi

                             
                                     (o mar é o mesmo, mas)


a concha espraiada
guarda na concavidade
o grito do pai



Rodrigo Madeira

nas tuas fases difíceis
sempre vou te ajudar
a cada frase triste

um beijo pra sarar

*refrão de canção que acabei de terminar aqui. retornei pelo jeito às canções de amor


Luiz Felipe Leprevost

e eu com as varetas da espinha
batendo no tambor da pele os arrepios.
não há música nisso, mas
produção de calor.

o silêncio é uma coberta invisível.

Alexandre França

sábado, 12 de setembro de 2015



Faço briefings o tempo todo. mas isto não é nada comparado a flor azul sem crase que atravessa a imanência hormonal das palavras de minhas irmãs. elas trazem conchas, revoluções, discordâncias. tudo em pétalas de bruxa lacrimosa. quando a bruxa chora e chove sobre a terra. os dias estão difíceis, pois invoquei pavonia, de uma forma mais evolutiva que a forma espiritual. ela quer dizer e ainda me confunde. sua carne provável impede-me de realizar poemas. e eu sofro cortando a face dos dedos (falanges de água sutra) no império das imagens. mas sei que ela dirá, pois não está sozinha. tem um príncipe emancipado que me disse não ser possível alcançar a realeza sem uma rainha forte. flor azul de minhas indecisões: torço que nasça com um rebento inadmissível na terra dos sonhos mortos. forte na corpulência das beatitudes da sororidade. e mais não digo, porque o vinho é insano de rubis e versículos de animais marinhos. e por hoje, contento-me na invocação de nomes femininos que soam o álcool de cereais na desenvoltura alquímica dos perfumes.

Andréia Carvalho Gavita

Enseadas

Evandro Souza Gomes


Em vagas de espuma
inflo velas. E vago
desejoso de âncoras
aportando nas enseadas
da tua pele litorânea

arenosa bruma nua.

Evandro Souza Gomes
‎Vidráguas

MOINHO-POESIA


Vento sopra
O sal da alma.
Encantada poesia,
Que no moinho gira...
Passado salineiro.
Passado brasileiro.
Passado...passado
No papel rotineiro.
Imagem verso
A mover o reverso
Na alma que sopra
A poesia que gira...
Gira no moinho,
Oh salineiro!
Gira no moinho,
Oh salineiro!
Palavras vivas
Na mente do poeta
Em seu moinho-poesia
Da alma de salinas.

(Rodrigo Poeta - 11-09-15)

Espelho de Seivas


Enquanto não apareces,
torno-me duas em uma,
gêmea alma das preces,
tão volátil quanto bruma.
Vens, amado, enroscar-se
no odor dos cabelos meus
que cheira a amor virginal
à procura dos beijos teus!

Carmen Cardin
Da noite se diz:
Os olhos do silêncio irradiam,
um manancial de luz.

Albertina Laufer

DENTRO DO POEMA SUJO


(Homenagem a Ferreira Gullar)

Escrever não tem a menor importância.
O que importa, de fato,
é o exercício, o ato
pelo qual desato minha ânsia
dos abismos em que se perdera
em noites sem esperança,
sem vinho, sem passo de dança:
desespero maior, que em mim se instalara.
Por favor! Não me busquem em entrelinhas.
Leiam-me sem duplo sentido.
Claro, que, com algum cuidado,
pois, do poema saltam farpas envenenadas,
que poderão atingir o leitor desavisado,
ferindo-o e levando-o ao lamentável estado
de, também, querer abrir suas veias,
mostrando-se despido, e sem defesas, ao mundo.
Ah, essa dor e esse prazer de escrever.
Ah, essa vontade de sangrar a própria jugular
e, depois, esvair-se na hemorragia, lentamente,
tentando a vida compreender
à medida que se esvazia a Mente,
buscando alento onde não se supusera havido.

Ah, essa ânsia e essa sina, eu as descobri, incauto, num repente,
ainda menino, dentro do Poema Sujo de Ferreira Gullar.


- por JL Semeador de Poesias, o José Luiz de Sousa Santos, na Lapa, em 07/09/2010 –

Mancha Vermelha na Tanga Branca



Ela vestiu uma calcinha branca
E foi meditar no florido jardim
De uma maneira suave e franca
Entre a leve rosa e o doce jasmim!

Então, o Sol iluminou todo o breu
E a sua menstruação, naquele instante, desceu
A tinta vermelha fez uma gravura
Em sua calcinha com doçura e ternura

Ela fez um desenho de uma donzela
Meditando na posição mais graciosa
E o vapor da sua mente tão bela
No alto da tanga virou uma rosa.

Luciana do Rocio Mallon

Dicas de Etiqueta de Como Se Comportar Diante de Escritores


                                                                                             
Desde 2003, recebi muitas mensagens perguntando coisas como:

“– Tia Lu, tem como escrever um texto dando dicas de como agir diante de autores?”

Bem, na verdade, não sou uma professora de Etiqueta experiente como a grande Danusa Leão. Mas tive aulas, desta matéria, com boas mestras durante o curso de Hospitalidade, equivalente ao Técnico em Hotelaria, no Colégio Estadual do Paraná, no ano de 2006. Lá, as professoras explicaram como agir diante de lançamentos literários em hotéis e eventos.

Além disto, conversei com alguns amigos escritores sobre como as demais pessoas agem com eles nos saraus culturais e fora deles.

Então, acredito que agora, estou apta a oferecer algumas dicas de etiqueta de como se comportar diante de autores:

1 – Não Peça Ao Escritor Para Dar um Livro, de Sua Autoria, Para Você:

A maioria dos lançamentos e saraus são para que os autores vendam as suas obras. Quando você pede um livro, de graça, ao escritor você está desvalorizando o esforço do artista. Sem falar que esta atitude é, totalmente, deselegante.

Alguns escritores tem se queixado que quando vão dar palestras voluntárias em escolas e em estabelecimentos comerciais, a maioria dos responsáveis pede doações de livros. Neste caso, se o autor fez uma apresentação gratuita, isto não deixa de ser um trabalho e precisa ser recompensado de alguma maneira. Afinal, a pessoa gastou tempo e o dinheiro do transporte. Então, a melhor forma de agradecer ao autor é comprando a sua obra.

2- Nunca Reclame Se o Escritor Não Tiver uma Caneta Disponível

É normal uma pessoa pedir o autógrafo do autor no dia do lançamento da sua obra. Se você deseja fazer isto, por favor, leve uma caneta junto com você.

Já vi autores levarem várias esferográficas, mas elas costumam desaparecer em eventos.

Infelizmente, também, já presenciei a seguinte situação:

A moça pediu um autógrafo e o escritor falou que não tinha uma caneta. Assim, a jovem criticou:

- Você é escritor e anda sem caneta ?!

Neste caso, a moça foi mal-educada.

3 – Frases Que Nunca Devem Ser Ditas a um Escritor

Por favor, não fale as seguintes orações a um autor:

- Não gosto de ler, mas comprei seu livro só para lhe ajudar.

Em vez disto, diga:

- Não curto leitura, porém acredito que sua obra mudará esta minha opinião.

Também, nunca fale expressões como:

- Adquiri sua obra só por causa da capa.

Neste caso, comente:

- A capa do seu livro é agradável e inspiradora.

Não fale coisas como:

- Preciso de mais livros para enfeitar a minha estante nova, que é enorme.

Em vez disto, exclame:

- Mais uma obra maravilhosa para a coleção da minha estante!

Nunca comente:

- Seu livro é excelente, mas tem erros de Português.

Neste caso, tenha a consciência de que a culpa é do revisor.

Estes tipos de comentários criticados acima, detonam com a autoestima de qualquer autor.

4- Não Faça Caretas Em Eventos Públicos

Se você pretende ir a um lançamento literário coletivo e tem problemas pessoais com algum autor, por favor, não faça caretas para ele em público. Para evitar discussões, em eventos, o melhor é cumprimenta-lo, educadamente, e manter-se afastado. Pois, transtornos pessoais devem ser resolvidos na intimidade. Afinal, fazer careta e gestos obscenos são atitudes desaprovadas pela etiqueta.

Espero que estas dicas tenham sido úteis e desejo-lhe ótimos saraus literários.


Luciana do Rocio Mallon