sábado, 26 de setembro de 2009

Traíra

que deus é esse

que nos tirou
a liberdade da obediência

e deu em troca
a prisão do livre-arbítrio?


Raul Pough

Windsoriana

não falem desta lady
perto de mim; nem por sinais
ela não vale uma libra


Raul Pough

Vida ador(re)cida

um dia
dores cabiam num poema...
hoje, nem isso

lágrimas
escorregam pra dentro

da tijela de pipoca
que o microondas

acabou de parir

o consolo

decola do cristal líquido
e vem pousar

nas minhas retinas:
sessão double star

nada como
uma cameron diaz

depois da outra...


Raul Pough
Um momento

Uma paz

Um sonho

um caminho

uma nuvem



um dia comum



um meteoro

uma estrela

uma tremedeira

uma face toda vermelha

a batedeira por dentro...



um recado

uma resposta

uma espera



você chega



um olhar

um sorriso monalisa

nos lábios, um canto



a verdade acontece



o real tão real

os barulhos do carros

pessoas na rua

semáforos

esquinas

nós



tudo dentro

do

clima

uma vaga

a nossa espera

felicidade



fim.



Lúcia Gönczy

Abro a Porta

ABRO A PORTA
uma pedra retorcida
bate o tempo em segredo

a leveza não apaga a infância

janelas seminuas partem de mim
escrita no interior do rio

desce

na margem esquerda Oxum canta

tempo pintado na presença do avô
café poesia
círculos de silêncio
o vazio da retina
no tique-taque do menino

o poema em repouso não faz perguntas

– tem alguém batendo dentro do espelho –

chora a criança
caída no detalhes do medo

nenhuma voz me canta


José Geraldo Neres
outros silêncios, escrituras editora, 2009.

Macquaire Island.Território Antártico Australiano.1911

À Vapor

As nuvens ignoram
as nossas horas:
pode chover
a qualquer momento

As nuvens ignoram
as nossas orações:
pode não chover
por muito tempo

Um carrossel desatento
passeia no céu
a seu passo:

Tudo se precipita
quando é chegado
o seu tempo.


César Magalhães Borges
in Folhas Soltas (poesia incidental)

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

A Gota

Desposara a esperança, e agora viúva, lembrava o tempo da infância, brincando na chuva.
Sim; a mulher já se cansou e pede ajuda, mas não será o táxi que a salvará, quiçá a ambulância que não veio, ou a fragrância do cuidado alheio, mascarada por nossas intrépidas vilezas.
Descalça, com demônios fala. Sabe que não se dissolve sob água quem a cotidiana aridez humana faz reter tanta mágoa.
Perdera de vez, sob a intransigente rudez, sua inexprimível doçura.

Ricardo Pozzo

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Três Inscrições para uma Noite

1.
aramos nossos corpos
hasteamos a carne
naufragamos os ossos
afiamos a pele

jardinamos os pelos
vozeamos as unhas
rasuramos os lábios
semeamos os dentes

desfazemos em tempo
os nós de cada dedo
elastecemos os

tornozelos acróbatas
abrimos as gavetas
dos olhos e cabelos.

2.
quando eu a vejo,
esparramada
na cama, rama
de musgo e líquen,

de perfil – por
trás de seu ombro –,
também por dentro
de suas coxas,

desejo entrar
na eternidade,
mesmo sabendo

que a faz tão bela
exatamente
o fim das coisas.

3.
você paloma
se esbate cega
em minha pele,
luta e lençol.

lhe oferto um cravo
e nada mais.
nós morreremos?
meu endereço
é a minha carne.
mordemos drágeas
dos amanhãs

ou cianureto.
acordo, no(u)
mau hálito de amanhecer

(e foda-se o soneto), com
um soco de perfume.

Rodrigo Madeira

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Poemas de Adriano Smaniotto

fui eu quem guardou
as manhãs dos soropositivos
e dos outros filhos deste caos

estão comigo...
se não as encontro
então os sãos
insistem em continuar sorrindo

quem puder sair de seu almoço
com arrotos de tudo bem
tudo bem coma como um porco
tudo bem coma coma um porco
só não venha me dizer que é poeta

o vício da poesia implica algumas abstinências:
de focinheira
de linhas
de vida

essa/ poucos ouvidos sensíveis, nem nos quer


fui eu quem tentou apreciar o prazer dos verbos
ganhei no lugar vãs filosofias e uma única razão:

fui eu que inventei o mundo que chamam mal-estar.

*

elas sempre ficam mais belas depois do fim.
daí revelam as mentirinhas dissimuladas.

nada de mais se você não for daqueles
que se matam perdida a primeira
azar se acha que besteiras de vidas falidas a dois
são pra colecionar

vai, ferido, e aprende a namorada
que são os livros

no silêncio sem amigos
urgem úteis conselhos

ouve: amor - mútuo egoísmo!

*

patrícia claudino das vísceras
filha legítima da dor
que falta de amor nos faltou?

foi em vão esperar pêlos brindes,
os anos não nos medicaram

pede, por favor, poeta,
à mãe sublime
que me dê seio
família em teu lar

patrícia claudino das vísceras
quem nos roubou chama-se paz!
De balé mal resolvido)

*

quando cantares tua dor em poemas,
chama-os por números,
que é melhor teres no fim
uma soma ou teorema,
que sinônimos.



1.

considera as linhas por mim escritas
como um roubo à energia do sol
um convite a escurecer o dia

no enfim de religar-me ao só
iniciei uma multidão de apatias.
versejar a voz do ser é ser de si algoz


*

tudo que for lírico em mim
terá um fim de laço.
depois é claro um invólucro de cetim

porém como enforcar e embrulhar
o ar o sangue a lástima o líquido
que insistem em coabitar um lírico?

*


agora que você namora
e já não desrespeito meus rivais
entre ais pergunto ao espelho:

pra qual amor amadureço,
se amo como quem vai embora
e indo vou olhando para trás?
(De Diário da dor dos dias)

Poemas extraídos de PASSAGENS. Antologia de poetas contemporâneos do Paraná. Seleção e apresentação de Ademir Demarchi. Curitiba: Imprensa Oficial do Paraná, 202. 428 p. (Col. Brasil Diferente.)

Fonte: Site Antonio Miranda

Postado por Andrea Motta
no site "Simultaneidades"

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Proibido Falar em Trabalho

Piada que contavam na antiga União Soviética: — Quando o Mac Donald’s lá se instalou, foi um total sucesso de público. Porque todos “corriam para ver” russos trabalhando.

Isso não é nada, diríamos nós brasileiros. Vocês não sabiam que no Brasil, tem um tal de Ponto Facultativo ????

Ponto Facultativo ??? Surpreender-se-iam os estrangeiros. O que é isso ???

É uma espécie de Feriado, que o Governo decreta. Responderíamos.

E os estrangeiros, perguntariam: — E os feriados ? Acabaram então com os feriados ? Lá não era o País do Feriado ?

Calma, mais devagar ... Para que tanta pressa ... ? Segunda-feira eu explico.

E porque só na segunda-feira ??? Hoje ainda é quarta-feira ??? Surpreender-se-iam de novo os estrangeiros.

É que hoje é véspera de feriado !!! Responderíamos.

Pronto. Os estrangeiros entraram em parafuso ...

Melhor não fazê-los esperar até segunda-feira. Pois poderiam pirar de vez. Poderemos ser responsabilizados. Então vamos logo explicar a eles esta nossa instituição nacional: O Ponto Facultativo. Mesmo porque, essa coisa de responsabilidade não é conosco ...

Explicando. No Brasil, a maioria “trabalha” no Governo. Ou seja, nas Companhias Mistas, nos Ministérios, nas Secretarias, nas Autarquias, nos Departamentos, Fundações. Bom, para economizar tinta e papel, os bons brasileiros “trabalham” nas centenas de milhares de Órgãos Públicos, das esferas, Municipais, Estaduais, Federais e Autárquicas. E tem ainda aqueles que trabalham em empresas privadas, tipo, prestadores de serviço, empreiteiras, fornecedores, que atuam, diretamente com ou para o Governo. E ...

Sim ... sim ... E o Ponto Facultativo, intercederiam os estrangeiros, impacientando-se.

Ah sim, quase ia me esquecendo.

É que no Brasil, quando é feriado numa quinta-feira, é praxe o Governo decretar Ponto Facultativo, para a sexta-feira subseqüente. O que libera o Funcionário Público da obrigatoriedade de ir ao trabalho, na referida sexta-feira. Quer dizer, o Funcionário Público, pode ir trabalhar se quiser. Mas se não quiser, não precisa ir.

Então, só os puxa-sacos vão trabalhar, nestes dias de Ponto Facultativo. Afirmariam os estrangeiros.

Sabem que eu nunca tinha pensado nisto.

Mas sinceramente, acho que nem os puxa-sacos iriam trabalhar. Porque, mesmo que quisessem, quando é Ponto Facultativo, os Órgãos Públicos não abrem as portas ...

Mas no sábado, então, volta todo mundo pro batente. Concluiriam os estrangeiros.

Sábado ??? Quem trabalha no sábado é otário meu ...

Osiris Duarte de Curityba

Publicado no Recanto das Letras em 06/10/2008

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Chocolate

Entre terras de balas
encontra-se um pequeno doce
diferente dos outros
feliz para si
pequeno aos outros
grande aos fracos
exclusões por diferenças
seus ombros açúcar
entre a cana amarelada de cimento
sofre vive
em grandes embalagens
sujas e destruídas
viva-se o amargo
do doce
que não é mais doce
do amargo dos cantos
dos cantos da língua
Abner Paessens
Existem 3 tipos de pessoas neste mundo: os que constroem pontes; outros que constroem muros; e os que observam as construções.

by: Mario Auvim

Miopia Social

Anoitece
e o último quadro pardo,
um homem comum
maquiado de escravo,
gravado...
na impressão de quem esquece.

Do singular que caminha,
do transeunte...
o que cambaleia nos rumos dos sapatos
e borda a rua
às vezes sem destino...

Ri dum cansado
como quem suspira.
Trágico ensaio,
como quem suporta
a morte eterna batendo à sua porta.

Altair de Oliveira
– In: Curtaversagem ou Vice-Versos.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Soneto D'Amor

Se teu amor está distante ou perto
O tempo e seu relógio te dirão
Se existe amor e se não mais existe
Se existe amor e um dia se amarão

Teu coração pulou fora do peito
Se em tua pele amor e amor se amaram
O que foi feito foi e se foi feito
Vida e vida ali que se encontraram

Não só a descoberta foi um mundo
Sem amor os ossos enrijecem
É dele que frabricas teu sustento

É necessário amar-se Chega a hora
da alegria voltar a amar a face
Não há caminho para o esquecimento


Hamilton Faria em Encântaros

Urbe

Poema XIX

Tribos bestiais versus
conservadores primitivistas
da grande mentira.

Como reproduzir ancestrais
lutando na relva selvagem
do que um dia chamar-se-a
pátria?

Palavras arremessadas
contra uma parede
de ouvidos cativos;
escritas em páginas
impróprias
para o mundo cristão.

Ricardo Pozzo

Informe Cultural

Olá...

gente, segue um link de um blog, onde o poeta Altair Oliveira começou uma coluna nesta semana... vida longa Altair

http://www.contemporartes-contemporaneos.blogspot.com/

Mario Auvim

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Metaplasmos

E o pudor faz-se podar,
a rosa faz-se riso,
o rútilo faz-se rótulo.

E o provar faz-se prover,
o medo faz-se moda,
o límpido faz-se lâmpada.

E o devir faz-se dever,
a mira faz-se muro,
a dádiva faz-se dívida.
(Segunda pessoa,1987)

Alcides Buss

Alcides Buss nasceu em Salete,estado de Canta Catarina em 1948. É professor universitário em Florianópolis. Criador dos varais literários em 1980 implantou na UFSC uma das primeiras oficinas literárias do País.
(Do livro editado pela Garapuvu (2003), “Poesia Contemporânea em Santa Catarina”. Organização e texto de Silveira de Sousa)

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quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Paisagem Submersa

Esperança

Vida cartilaginosa
Escura
Iluminada
Triste

Feliz
Querida
Vagabunda
Porque desprezar o inevitável ?
O único
Aproveite enquanto é vivo
Porque curta a morte não é
Mas curta mesmo a esperança
esperança do ser
esperança do viver

Abner Paessens