Luiz Felipe Leprevost
na casa da minha mãe quando cai a noite a televisão é
insignificante diante dos
contos de Andersen que escrevo em meus sobrinhos. na casa da
minha mãe as visitas só não fazem cócegas na barriga dos cães porque não há
cães. vê-se abacate, mimosa, mamão e outras luas apodrecendo na fruteira.
damasco e castanhas nos potes pintados à mão por essa senhorinha sem pressas.
na casa da minha mãe lava a louça ela mesma e os pratos assobiam junto com suas
unhas que
fazem isso por gratidão de anfitriãs, não por
responsabilidade de funcionária. na casa da minha mãe ela dá banho nos netos
com mãos de água que envelhecem 30 anos e depois não voltam totalmente ao
normal. uma das crianças tosse e o termômetro é todo ele a casa da minha mãe.
na sala do carinho, espera-se a Páscoa porque ninguém desistiu quando foi
tempo. molha-se as plantas cantarolando “cheguei na beira do porto / onde as
ondas se espáia / a tua saudade corta / feito aço de naváia”. na casa, minha
mãe veste camisola, roupão amarelo de flanela e calça pantufas, uma ambulância
passa ao longe, abafada pela chuva. tomamos chá, antídoto contra gripe.
conferimos portas e janelas. e se a noite contém musgos, os olhos cansados da
minha mãe também.
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