quarta-feira, 4 de junho de 2014

O Dia Em Que Cai Dentro de um Bueiro


Em 1994, eu estudava na Reitoria da UFPR. Um certo dia caminhava rumo à universidade, quando, de repente, escorreguei e cai dentro de um bueiro. Notei que era um local fundo, fedido e cheio de canos. De repente, comecei a gritar:
- Socorro!          
- Socorro!          
Um grupo de estudantes, aproximou-se do buraco e uma menina exclamou:
- Mais uma desgraçada que caiu dentro de um bueiro!
Após gargalhadas escandalosas, os estudantes se afastaram e foram embora.
Depois uma velhinha aproximou-se de mim, jogou uma moeda e disse:
- Um tesouro para o fantasma do bueiro.
A idosa foi embora. Porém uma outra pessoa jogou uma casca de banana e uma lata vazia de Coca-Cola na minha cabeça.
Continuei a berrar, mas reparei que as pessoas sempre olhavam para mim. Porém, não faziam nada. Então, passei a gritar mais alto e quando mais eu implorava por socorro, mais lixo os pedestres tacavam na minha pessoa. Jogaram de tudo: papéis, plásticos e até um preservativo usado.
Logo me lembrei do famoso conto de Dalton Trevisan chamado: Uma Vela Para Dario, onde um homem morre na rua e as pessoas nem sequer tentam socorrer o pobre. Porém tiram tudo o que ele tem, inclusive as roupas.
Quatro horas depois, após os passantes terem tacado lixos variados em mim, funcionários da Sanepar chegaram, colocaram uma escada especial e me salvaram. Fiquei decepcionada, pois eu esperava que bombeiros bonitos fossem meus heróis. Mas, como eu estava angustiada para sair daquele buraco, não reclamei.
Aliás, um daqueles funcionários me indagou:
- Você foi mais uma vítima do fantasma da menina do bueiro?
Respondi:
- Não conheço esta lenda.
- Como ela é?
O rapaz respondeu:
- Reza a lenda que nos anos setenta, uma garota ia para escola. Quando, de repente, caiu num bueiro e morreu. A partir daquele dia, o espírito dela passou a empurrar pessoas para dentro dos bueiros abertos. Para que a vítima seja salva, rapidamente, é necessário que alguém jogue balas da marca Sete Belo para dentro do buraco. Mas, o espírito só aceita este tipo de doce, moedas não adiantam.
Desta maneira comentei:
- Acredito que os acidentes em bueiros abertos sejam obras dos governantes que não se importam com o povo, e, não de fantasmas.
Naquele dia fui para a casa fedida e inconformada com a falta de solidariedade das pessoas com os seres humanos que caem dentro de um buraco.

Luciana do Rocio Mallon

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