domingo, 15 de fevereiro de 2015

Todas as coisas sozinhas
Um cinzeiro
Um prato
Um copo
Um corpo
São uma tragédia.
Não aquela, dos gregos:
Ésquilo, Eurípedes, Sofócles.
Mas quando um cinzeiro
Não é limpo, quando um
Prato não é lavado,
Quando um copo é abandonado
E um corpo não é celebrado
Indícios da tragédia são mostrados.
E é por isso que os deuses fecham suas bocas
e são silenciosos como um quadro.
Por acaso, você já viu
Ou sentiu em uma casa abandonada
A manifestação do pó?
Já passaste a mão em uma colher
No dia seguinte? Já tiveste a emoção
De lavar os talheres de uma noite
De celebração?
E tudo isso é noite. Tudo isso é névoa.
Tudo isso é neblina.
E se elas ficam ali é para
mostrar isso: a boca fechada dos deuses.
Intocáveis ou intocadas
Todas as coisas testemunham
O esquecimento:
Esse cimento que não constrói
Nenhum berço, nenhuma casa
Nenhuma partilha.
E lembrar é muito mais do que trazer
É muito mais do que atravessar
Ou ser atravessado
Lembrar é construir de novo
O ovo
O nascimento
As perdidas asas
a rua da infância
e um deus que fala com a gente.

Rubens jardim

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