quarta-feira, 17 de outubro de 2012

XVII




Eu perdi um livro e o lugar aonde devo ter perdido. Dentro de mim? Não sei. O livro perdido estava grifado com uma cor verde-limão de um marca-texto nas páginas que falavam do mundo contemporâneo. Intolerâncias e absurdos. Palavras as quais o sinônimo distanciava-se ao longe; quisera compor uma música, fazer versos. Ou tocar a música da pauta aberta sobre a mesa. O violão esquecido no canto, dentro de uma capa a cobrir-se de pó.
O livro tinha uma dedicatória especial de alguém que foi importante em meu universo, uma relíquia escrita em espanhol “dibujar lembranza e saudades” de alguém que desejava que aprendesse essa língua e era em retribuição à cartas esparsas.

Hilda tinha perdido o sono, perdido um amor e um filho lá no início de sua mocidade. Tinha também perdido os fios que bordava uma toalha para servir o jantar para o amor perdido. Em cima da mesa, no seco da madeira os talheres, os copos e as travessas; uma garrafa de vinho, um brinde que não aconteceu.
Era nessa mesa que colocaria o livro deles.
Tudo perdido. A mesa vazia, ela olhando no vácuo a procura de um sinal inexistente.

Que inutilidade essa procura de si-dele que por ventura estavam no livro. Fazia planos de juntar esse livro aos demais que de numa caixa no canto do quarto viriam para a estante, nas férias ou em algum feriado.

Sentei-me num degrau da escada de alumínio cansada de cavar sentimentos escritos.

No pulso as horas.
Já passava da hora de ir.


 De Mara Paulina Arruda

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