Para Rimbaud a poesia era uma alquimia _ verbo e sentidos.
Descobriu bem cedo o segredo corpo/alma do poema. Que vale para a arte e para
as relações _ o infinito pode definir esta imagem.
– A Lemniscata de Bernoulli –
Pode ser absolutamente matemático incluir este signo em um
pensamento metafísico ou poético, mas, é a junção perfeita. Onde não há fissura
– corpo/alma – verbo/sentidos. Na poesia o verbo é a materialidade daquilo que
se avoluma como avalanche, ou big bang ou terremoto pensamento-relâmpago dentro
da alma do poeta. E ele verte para a matéria, acionando o verbo, materializando
o poema. Estive pensando nestas pequeninas faíscas que escapam da obra de
Rimbaud e que ficam iluminando os poetas pelo mundo inteiro. Tudo isto flui
após ter visto – finalmente – o filme Eclipse de uma paixão, que conta a
tumultuada história de amor de Rimbaud e Verlaine. Sou muito arisca aos filmes,
eles conseguem demolir as obras de arte, caricaturar belos livros. Mas, alguma
coisa deste filme dirigido por Agnieszka Holland suscitou em mim a grande
chama, compus alguns poemas, escrevi ao embalo da aura de fogo de Rimbaud, e
fiquei tocada com suas frases ásperas ao amante. O amor precisa ser
reinventado!! Isto é genial. Nem sei mesmo se o menino Rimbaud pronunciou estas
palavras, mas, certamente as teria dito. E a insistência em querer saber de
Verlaine se ele amava a alma de sua esposa, ou apenas o corpo. Verlaine
insistia em dizer que era só o corpo, talvez por isto o menino não sente culpa
por roubá-lo da mulher. Só na alma pode residir o amor, só na alma. Os corpos
suscitam paixões. O amor é esta união indivisível da lemniscata – um é
continuação do outro e um retorna ao outro sem saber onde termina um e começa o
outro. Foi bom ter visto o filme. Muito embora o esforço de Leonardo de Caprio
tenha dado vida a um Rimbaud quase verdadeiro, o verdadeiro Rimbaud eu o
imagino menos criança que no filme, eu o vejo sério, muito sério, de uma
genialidade que assombra. Eu o vejo inquieto, mas, de uma inquietude que quer
descascar as membranas da vida para acolher os pobres, as crianças, os
abandonados. Eu o vejo místico, acreditando que os animais rezam e que o amor
deve mesmo ser reinventado. Eu o vejo segurando com as mãos a rosa de fogo do
amor, que se materializa em ferida no tiro do amante.
**texto publicado em maio de 2008 no Chapar as Borboletas**
Abaixo uma poesia do livro **O rasurado azul de Paris** que
está na Antologia _ O melhor da Festa 3 (Festipoa Literária/Casa Verde Ed.)
Dans l’air
Tínhamos a mesma idade
Quando vimos o mar
Este mistério de impaciência
Tínhamos a mesma impaciência
– Rimbaud e eu –
Por isto
Pisamos telhados
Ao invés do chão
Por isto
Machucamos nossos amores
Com nossas próprias mãos
Por isto
As velas acabam na madrugada
Antes que o poema acabe
- Por isto, tão pouca a vida para tanta voracidade
Bárbara Lia
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