domingo, 30 de novembro de 2014

Ricardo Aleixo


A pergunta é: por que continuo a insistir em fazer tudo (em poesia/arte) sozinho? Resposta (serena, nem um pouco desencantada): por opção (ou ilusão de) e por (quase absoluta: existem, afinal, as raras boas parceiragens) falta de opção. Como dizia minha mãe, quem quer, faz; quem não quer, manda ou pede. Eu vou e faço. Até prova em contrário, faço eu muito bem.

Profes Kinder


Aprendemos sempre coisas novas.
Conversas, risadas,
chá, café e bolo.
Sorvete numa esquina
cerveja na outra.
Recados, abraços,
problemas parecidos.
Regras, cálculos
Música, Poesia
Alemão, Português
História, Arte, Geografia
Matemática, Inglês
Deutsch, Ciências, gritaria
Leseprojekt. Educação Física
Sachkunde, pátio, enfermaria.
Canto, alfabetização e dança
para mim e para as crianças.

Deisi Perin


Ricardo Aleixo


Desce do carro com o som no talo. Agora há pouco. Ouve o quê? Sertanejo, é óbvio. Deve ser pouco mais novo que eu. Deixa a porcaria tocando enquanto entra na padaria. Como um xerife. Todo bíceps. Pernas arqueadas. E óculos escuros, apesar do tempo fechado. A sonzeira é parte indissociável do carro - tal como o "possante" é, por certo, uma extensão de sua nunca suficientemente confirmada virilidade. O pior de tudo: pensar que a macheza mais escrota - porque embalada em discursos de solidariedade com os feminismos - é capaz de artifícios que deixariam no chinelo o pobre diabo que acabei de descrever.

O GAÚCHO NO RESTAURANTE ...


Um gaúcho, em dia de comemoração conjugal, leva a sua esposa a um restaurante francês, alto nível (a situação recomendava...)
Chegando lá comeram sem olhar preço. Era tudo felicidade, até que o educado e sorridente gaúcho pede a conta.
Ao ver a despesa de R$ 600,00, ele se assusta e começa a reclamar:
- Ei, alto lá, tchê! Nós não comemos couvert.
- Estava aí senhor, não comeu porque não quis! - dispara o garçom.
- Mas, barbaridade... nós também não tomamos este champanhe francês que nem o nome sei falar direito.
- Estava aí senhor, não bebeu porque não quis! - repete o garçom ironicamente.
- O índio véio, e esta sobremesa, além do um preço absurdo, também não comemos.
- Estava aí senhor, não comeu porque não quis! - repete o garçom, debochadamente.
Furioso com o garçom, o gaúcho dispara:
-Tudo bem: R$ 600,00, menos os R$ 550,00 por você ter transado com a minha china...
E o garçom interrompe:
- Êpa! Mas isso é um absurdo!!! Eu nem olhei para a sua esposa, senhor.
E o gaúcho, colocando R$ 50,00 na mesa e já se levantando, respondeu:
- Estava aí tchê, não comeu porque não quis...


Ademir Antonio  Bacca 
ouça
o que o ouvido médio
recusa
o vento
soprando
na língua
a flauta
que singra
na onda
ouça
com fino martelo
o som
do pavilhão
destruído
ouça
o murmurar
que arredonda
o ruído
do mar
ouça
o mais que ouvido
reverberando
de novo
sentido

Marilia Kubota

Ricardo Aleixo


Isto foi escrito (Barthes o fez) para nós: "Se fosse possível imaginar uma estética do prazer textual, cumpriria incluir nela: a escritura em voz alta [em itálico, no original]. Esta escritura vocal (que não é absolutamente a fala), não é praticada, mas é sem dúvida ela que Artaud recomendava e Sollers pede. Falemos dela como se existisse."

Vida de índio

 De Mara Paulina Arruda.


O indiozinho catava formigas no musgo da rua. Comia. A irmã dele catava piolhos na cabeça do indiozinho que não parava. A mãe trançava a palha, a fibra de bambu. O pai fumava, acocorado no fio da rua. Nas horas de folga esculpia tartarugas, onças e tamanduás na madeira. Uma lua, duas luas se passavam e então se levantavam juntando suas coisas e iam para outra esquina da cidade. Dois sóis, três, chuva, frio, o cobertor nas costas da mãe que no filho não havia necessidade. Precisava aprender com o tempo. E assim, de tempo em tempo, o indiozinho crescia, dobrava a esquina, desaparecia. Quando de novo voltava já não vinha mais sozinho. Junto dele outro indiozinho mamando no peito da índia, filha do cacique da outra aldeia onde ele foi parar para descansar. Começava tudo de novo: Aprender com o pai a fumar no fio da rua, buscar fibra de bambu para a mãe de seu filho tramar outros balaios enquanto o filho começava a engatinhar e a caçar formigas pelas ruas.

SOBRE ESCREVER



Escrever porque esta é,
sem sombra de dúvida,
a melhor hora
para escrever.

Não escrever porque esta,
verdade seja dita,
é a melhor época
para não escrever.

Escrever porque esta,
convenhamos,
não é a melhor ocasião
para escrever.

Não escrever porque este,
antes e acima de tudo,
é o melhor turno
para não escrever.

Escrever porque este,
só um cego não vê,
é o melhor tempo
para escrever.

Não escrever porque este,
apesar dos pesares,
é o melhor mês
para não escrever.

Escrever porque esta,
até segunda ordem,
não é a melhor noite
para escrever.

Não escrever porque este,
em última instância,
não é o melhor século

para não escrever.

Ricardo Aleixo

PAISAGEM


Árvores saqueiam o arco-íris.
Três banqueiros atiram-se
ao rio e morrem afogados.
Nuvens piscam o olho para o sol,
que enfurece os dentes-de-leão.
Ninguém me oferece uma estrela.
Quando eu morrer, me enterrem
na tua voz.
2014


Claudio Daniel 

sábado, 29 de novembro de 2014

VELHA POÉTICA


Um poema feito de seixos.
De válvulas
e vulvas.
Um poema feito de lutas.
Silêncio. O poeta labora.
De seu peito vaza um rio que varre tudo:
o lírio,
a bomba,
o beijo.
Um poema feito em desleixos.
Feito de sol.
Feito de lua:
reflexos fascinam os peixes.
Um poema feito de guelras
e gueixas.
Silêncio. O poeta sonha (ócio & cio).
Uma flor de narcótico perfume se abre em êxtase.
Estrelas choram. Estranha liturgia...
Um poema feito de eixos.
A serpente. Pandora. Idade do Ouro.
Seixos.
Seixos.
Seixos.
Há anjos transfigurados
olhando seus sexos no espelho.
Otto Leopoldo Winck

EL TAO


Yo pienso que es preciso ser simple
Y no adornar castillos,
Ni construir picadas que lleven al reino de las guerras.
Pienso en la sabiduría del Tao y me pongo ante
los cables eléctricos
Y amo los bienteveos y acaricio los pétalos
y me pierdo en los colores
Yo quería todo en una aurora de amor.
Los poderosos echando tesoros a los pies
De todos los que nunca tuvieron la mesa plena,
el vino ardiente de sangre de felicidad.
Yo pienso en Tao y en orientales palabras
Y trato de cultivar las flores
Que aún mueren en mis manos
Pues yo nunca en verdad supe
Ser tan simple como las palomas
nunca tan bella como granada madura
Ni tan suave como la rosa blanca
Ni tan callada como el arroyo de la infancia
Ni tan silenciosa como las estrellas
Ni tan buena como los maizales
Ni tan vida-nueva como la crisálida
Ni tan liviana como la mariposa
Ni tan luz como el alma de los héroes.
Bárbara Lia

DECADISMO


Cortei os pulsos
do poente.
(Nas ruas onde descaminho o sangue escorre das nuvens
nessa hora em que outrora havia ângelus e anjos acendiam as estrelas
onde hoje se acendem os anúncios luminosos...)
Cortei os pulsos
do poema
e vim à rua
contemplar o sol desfalecido.
Era fatal que me tornasse poeta.
(O sangue espirra sobre a pia e sobre o copo
e sobre o tubo de dentifrício e sobre o espelho onde outrora eu via
um rosto...)
Cortei os pulsos
do poente
e vim à rua
perpetrar o meu último poema.
Otto Leopoldo Winck
De Mara Paulina Arruda

Ao abrir a janela o vento espalhou os seus cabelos. Um gato passava na rua. A noite estrelada de Van Gogh foi a lembrança que veio ; um cipreste balançando em frente de uma cidadela distante. Ao fundo círculos em branco e amarelo sobre o azul escuro. Ali, naquele apartamento, não era uma tela. Era o breu. Era a vida. Não havia estrelas. Só o céu carregado de nuvens. Os cães acuando ao longe, pareciam estar pedindo perdão.


Nunca imaginei que seria professor. Não tenho parentes próximos professores. Sempre me falaram que ganhavam pouco. Além disso, por conta de uma gagueira renitente, que me incomodava na adolescência (e às vezes até hoje, como alguns terão percebido...), esta profissão não me passava pela cabeça. E olha eu aqui, agora, professor. E adorando. É claro que tem o seu ônus, a burocracia, essas coisas todas como lançar notas, fazer plano de ensino etc. Mas adoro ser professor. E sobretudo de literatura. Já que a literatura, como dizia Sartre, é um espelho que devolve a nossa imagem, fazendo-nos conhecer melhor. Bom sábado a todos. (A vida nem sempre é um poema mas as vezes rola umas rimas).

Otto Leopoldo Winck
não bebo da tua água
nem como da tua fome
a vida é antro sem nome
falta pão e sobra mágoa."
RR

A modernidade


O povo era mais magro, mais queimado de sol
Mais suado
Aprendi a andar de bicicleta em dois dias
Na estradinha de areia grossa
que passava diante da casa de minha elétrica tia
Hoje quase não existem bicicletas em Santo Amaro da Imperatriz
Tem muitas motos, muitas "scooters"
Bicicletas, quase nenhuma, os carros são muitos.
Tem, na cidade que evoluiu tanto,
Dois semáforos temporizados, cronometrados
E uma inexplicável e surpreendentes
rua de uns duzentos metros com "mão inglesa".
Bicicletas estão se tornando peças de colecionador.
Peças de museu.


 Carlos Roberto Rodrigues,in  Cavalos no peito ,Edições Casa Amarela, 2014

Criptonita


Pura maldade, as ilusões do cinema
Eu tinha apenas oito anos
Entrei naquela matinée
Nem sabia que estava prestes
a conhecer meu primeiro amor
O passo um tanto bambo
pelo apertado do sapato
Meu pai não estava nem aí
Distraída, sentei-me estrelinha
Entre a via láctea de assentos
(Na cidade, só o cinema e o cemitério
eram maiores que a igreja)
Lábios sugando no canudinho
umas últimas gotas de refri
Meus olhos vesgos se ergueram
quando a música estourou
Lá pelas tantas, eu meio tonta
Dividida entre o herói e o manso,
Um pouso leve e o corpo duro
Braços cruzados frente a mim
E aquele "pega rapaz" que fazia bem assim...
O safado, imagine!, cravou-me os olhos
E fez aquele sorrisim
Ai, Super Homem, vem nin mim!
Mãos suadas, coração aos saltos
Dedos dos pé encurvados
Eu não era mais uma menina no cinema
Era só uma mulherzinha e seu amante


Assionara Souza.

quarta-feira, 26 de novembro de 2014

então, eu penso naquele "brujo tímido", penso naquele médico-monstro (em um dos papéis de John Malkovich, sabe?) , naquele mestre sadomasoquista, naquele deus-(quase grego)-uzona-meu-querido, naquele "bebé de pecho-hombre araña"; ... em meu pai, naquele dia fatídico, entre os sinos e ... os cataventos...
e tudo gira... e perco alguns sonhos quando acordo triste.
e eu acredito que: - viver é muito mais que isso.
então, eu peço perdão a mim
mesma.


Adriana  Zapparoli 

Últimos dias



Já morri tantas vezes
que sonhar é vaidade miséria em oração
as mãos juntas
perdem o rumo
quando isso estiver terminado
(Um engano)
Eu abraço deus por nós dois

A mulher que me ergueu banhado de sangue
o vidro que cortou a carne no brinde com a insônia
eu posso voltar em pedaços
Mas materno nos braços fico

Afogo no cinza da terra
Há quem espie as portas fechadas do céu pássaros trazendo
o verão que evitamos
A água desce
os braços levantam
Lençóis brancos
Somatoria
Redson vitorino
Já morri tantas vezes
que sonhar é vaidade miséria em oração
as mãos juntas
perdem o rumo
quando isso estiver terminado
(Um engano)
Eu abraço deus por nós dois

A mulher que me ergueu banhado de sangue
o vidro que cortou a carne no brinde com a insônia
eu posso voltar em pedaços
Mas materno nos braços fico

Afogo no cinza da terra
Há quem espie as portas fechadas do céu pássaros trazendo
o verão que evitamos
A água desce
os braços levantam
Lençóis brancos
Somatoria

Redson vitorino

Lenda da Garota Que Afanou o Menino Jesus


                                              
Em 1978, na cidade de Curitiba, Laura era uma órfã de cinco anos que morava com suas três tias solteiras. Ela sempre via estas suas tutoras fazendo simpatias para Santo Antônio e tirando o Menino Jesus dos braços dele. Por isto, a garota ficava com pena do santo.
Um certo dia Laura entrou no presépio da Loja Hermes Macedo, que no fundo era um ambiente que juntava vários presépios num só. Deste jeito, esta criança avistou um Menino Jesus pequeno e pensou:
- Poxa este bebê cabe nos braços do Santo Antônio lá de casa. Por isto acho que pegarei esta peça para ele.
Assim a menina, olhou para os lados, pegou o Menino Jesus e saiu correndo. Mas uma idosa observadora gritou:
- A garota roubou o presépio!
Desta maneira o segurança correu atrás da menina, que entrou numa casa do Bairro São Francisco e fechou a porta.
Então Laura pegou o Santo Antonio e tentou colocar o Menino Jesus nos braços dele.
O guarda pulou a janela, se emocionou ao ver a cena e perguntou à garota:
- Você roubou o Menino Jesus para colocar nos braços do Santo Antônio?
A criança respondeu:
- Sim. Pois minhas tias são tão egoístas e só porque se sentem sozinhas tiram o bebê dos braços do santo, mas não entendem que deste jeito é o Antônio que se sente sozinho.
Uma lágrima escorreu dos olhos do segurança que comentou:
- Você roubou um Menino Jesus para dar a um Santo Antônio, que mora no Bairro São Francisco. Porém eu não farei nada porque meu nome é Noel.

Luciana do Rocio Mallon

                

As torrenciais



Nós pensamos que podemos nos banhar numa noite de lua cheia

Pisamos em poças d'águas
Em merda de cachorro
E agradecemos
Deus em sua misericórdia
Ele ignora

Nós pensamos num final feliz em tardes de 8sol sem desesperos

Traído por quem nossos braços alcançam
No corte do ego
Na impotência de zelo
Eu ignoro

Água sanitária
em nossas bandeiras

Redson  Vitorino 
A terra é azul.
O mar é azul.
O céu é azul.
Azul é a vida.
Somente o poema
não é azul
– porque ele sangra.


Otto Leopoldo Winck

Abortos diários



Um bebê abandonado na lixeira implorando braços

Quer as tetinhas de um mundo que só existe no papel

quando o sol se aproxima e queima a pela ele pensa que é papai erguendo-o

quando aprende a desejar mamãe torna-se chuva de verão

Um bebê que pula do galho fugindo da ditadura de deus nas alturas

Que anseia o colo farto de uma sinceridade que só vem antes de uma queda

Tirado e retorcido em algum noticiário onde a primeira lição já foi aorendida

Posto na incubadora de hipocrisia coletiva ele aprendeu a sonhar como deus


Redson Vitorino 

SONETO DA INCOMPREENSÍVEL UNIÃO


Sobre o corpo do amado adormecido
desliza um par de olhos, hesitante.
Se um em paz repousa, o outro, embevecido,
não cessa de admirar o imoto amante.
E a visão desse dorso distendido,
ao mesmo tempo próximo e distante,
não lhe apazigua o coração arfante,
nem quando um o outro roça, distraído.
Antes, desperta-lhe a sanha mais louca
de unir os corpos e beijar-lhe a boca,
até que o duplo se converta em um.
Mas também lhe suscita um pensamento:
a distância é o mais certo sentimento
e a estranheza é o que há de mais comum.

Otto Leopoldo Winck

Os Barros de Manoel Barros


                                                         
O mestre poeta Manoel
Com sua leve candura
Hoje viajou para o céu
Só para espalhar ternura

Os barros de Manoel Barros
São simples e nada caros
Eles são feitos de melodia
Esculpindo a mais linda Poesia!

Manoel, hoje, virou a estrela que cintila
Transformando o poema em escultura
Suas mãos moldam a mais fina argila
No universo inspirador da formosura!

Os Barros de Manoel Barros
São divinos e muito raros!
Eles são adubos de sabedoria
Para a doce flor da Poesia.

Luciana do Rocio Mallon

PARTIDA


Todos os caminhos são vazios
quando não pisados por ti.
Mortas as luas e sombrios os sóis,
se não vais ao meu lado.
Ontem, por exemplo, a água do poço
travou-me a boca, com sabor de ferrugem
– só porque não estavas no jardim.
E todas as maçãs amanheceram podres
na compoteira da varanda
porque não foram as tuas mãos que as dispuseram.
Sou um homem orgulhoso
e de coração duro, mas admito
que esta terra de delícias
não será mais que um sítio desolado
depois que tiverdes partido.

Otto Leopoldo Winck

PARTIDA - II


Hoje todos os caminhos estão desertos
porque já não podes andá-los.
Não há mais luar e o sol é amargo,
pois me fugiu para sempre o teu vulto.
Agora, a água do poço é salobra
e de cardos se vestiu o antigo jardim.
Na compoteira trincada da varanda
nem um sinal dos teus cuidados.
Sou um homem alquebrado
e já sem orgulho.
Mas peço ao Senhor
que estenda indefinidamente os meus dias sobre a terra
só para sofrer tua ausência
– porque, morto, tu morrerias também.

Otto Leopoldo Winck

Lendas Sobre Santa Cecília, a Padroeira da Música


Na Idade Antiga, na época em que muitas pessoas ainda não aceitavam o cristianismo, existia uma menina rica e católica chamada Cecília, que gostava de cantar e de fabricar instrumentos musicais para crianças carentes. Além de ensinar a garotada a tocar.
Um certo dia ela foi obrigada a casar-se com um homem, que não amava, chamado Valeriano. Na lua-de-mel a garota disse que não gostaria de permanecer casada e chamou seu anjo da guarda que apareceu ao noivo explicando toda a situação. Assim, Valeriano que era pagão, tornou-se cristão.
Então Cecília e este rapaz decidiram doar toda a sua riqueza para os pobres. Porém, reza a lenda, que um baú de ouro foi enterrado nos subterrâneos de Roma.
O prefeito da cidade ao saber da conversão pediu o tesouro ao casal, mas como ele foi doado, Valeriano foi enforcado em praça pública. O governo colocou Cecília numa câmara de gás, mas ela cantou para Deus e permaneceu viva. Assim o prefeito pediu para que a jovem levasse três golpes de machado no pescoço, o algoz obedeceu, mas não conseguiu arrancar a sua cabeça. Mesmo assim a donzela permaneceu viva por três dias.
Seu corpo ficou escondido durante muito tempo. Mas o espírito de Cecília apareceu ao Papa Pascoal e indicou o lugar onde estava sepultada. Quando o caixão foi aberto, as pessoas viram que seu corpo estava intacto e continua assim até hoje.
Ela tornou-se padroeira da Música e sua data é comemorada dia 22 de novembro.


Luciana do Rocio Mallon     

Parodiando Roberto (com uma dose de William Teca):

Parodiando Roberto (com uma dose de William Teca):er me conhecer?
entre no meu carro
onde nunca rolou sertanejo
só stones e led zeppelelin
e outros destilados fortes
e vamos descer pela graciosa
ver o sol nascer na praia
em meio a um monte de latinhas de cerveja
amanhã estamos de volta
mas saiba
que o carro não vê revisão há uma cara
os pneus estão carecas
e eu ando meio de saco cheio da vida.

olw

segunda-feira, 24 de novembro de 2014



Aí você vai no banco e descobre que te cortaram o limite. Assim, sem avisar. Aí você se lembra que não pagou o cartão no mês passado. Aí você se lembra também que não vai poder pagar até o final do mês. Aí você olha pra folhinha e vê que tem mais uma semana até o final do mês. Aí no desespero você vem pro face e escreve: alunas, alunos, quem quiser o Jaboc me procura nos corredores. Trintinha. E ganha um autógrafo. Aí você reza. Mesmo sem fé.

Otto Leopoldo Winck



Sei que calendário é um sistema para contagem e agrupamento de dias que visa atender, principalmente, às necessidades civis e religiosas de uma cultura; sei que a unidade básica para a contagem do tempo é o dia, que corresponde ao período de tempo entre dois eventos equivalentes sucessivos como o intervalo de tempo entre duas ocorrências do nascer do Sol... Sei que não é nada. Sei que é um marcador. Um recurso de logística. Mas acontece que, de uns anos para cá, quando vai chegando o final do espaço intervalar de cada marcação, ou seja, pouco mais de 300 dias, eu começo a ficar com uma sensação meio estranha sobre o aproveitamento do tempo... Tenho uma sensação de que estou perdendo tempo ... Que deveria ter produzido mais. Vivido mais. Etcs e tais....E fico com essa fisionomia abaixo até o início do próximo espaço intervalar.Mais um marcador...É bobo isso. Mas é assim que me acontece.

Adriana Zapparoli
A dor impede o pensamento criativo. Dipirona não resolve e nunca mais tomo paracetamol depois que o dona do Empório da minha rua contou que sua mãe morreu de cirrose medicamentosa, de tanto tomar Paracetamol e Novalgina. Eu tive duas complicações no meu pé direito, e o ano ficou restrito a médicos, exames e oitocentos medicamentos, dias e meses sem andar. No meio de tudo, evitava tomar remédio para dor e fiquei verde de dor por muitos dias, semanas, meses. Uma coisa meio maluca. Literariamente o ano ficou prejudicado. Em fevereiro escrevi uma espécie de novela em prosa poética (Todas as tardes de maio serão tuas), com o verso de Drummond como epígrafe.

Como esses primitivos que carregam por toda parte o
maxilar inferior de seus mortos,
assim te levo comigo, tarde de maio,
Carlos Drummond de Andrade

Foi o único livro que escrevi em 2014, pois passei o ano inteiro em médicos, hospitais, meio a exames e uma enxurrada de remédios e nadando em dor, como disse. Com uma vontade ferrenha e por saber que os livros nascem como crianças, quando tem que nascer... Separei poemas e editei - Respirar. Foi o suficiente para tornar 2014 muito especial. Respirar é um lindo livro e estou bem feliz por esta epopeia poética embalada em minaretes azuis. Espero que em 2015 eu retome o ritmo da Literatura e que consolide este momento em que minha saúde se recupera. Sem mais dores. Que os anjos digam - Amém!

Bárbara Lia 

domingo, 23 de novembro de 2014

É...
A vida, quando escrita
em linha reta, não compõe
a melhor parte da cena.
A palavra que faz curva,
é poema.

Albertina Laufer

Aros de aço



Se prometesse nunca sair
rastejante sob meus pés
abriria a cabeça com 12 intenções
para ser motivo de todos seus sonhos

Nós que batemos contra o tempo
ausente num jornal de domingo
fazemos nossas preces ao acordar
enforcando-nos nas xícaras de café

Adormeço sob suas pupilas
acariciando minha derrota
se no teu trago viro fumaça
quero ser sempre os bocejos

redson  Vitorino

Poeta = sujeito inviável.


Poeta = sujeito inviável.
Disse tudo, o Manoel de Barros.
Sou um sujeito inviável. Programado para não dar certo.
Por isso alinhavo palavras no branco imaculado do papel (ou da tela).
Tentando entender o que não tem explicação.
Alguns chamam isto de poemas.
Eu prefiro chamar de ensaios do abismo, ballet do caos, coleção de incompletudes, antologia de espasmos, suspiros do purgatório, cataclismos líricos, rosário de encantos, solilóquios polifônicos...



 Otto Leopoldo Winck

Um poeminho-lembrete:

Pé no caminho
andando a esmo
dono de nada
nem de ninguém

só de mim mesmo

Ricardo Aleixo

quinta-feira, 20 de novembro de 2014


ANTIMÍDIA VIII



A Colunista do Grande Jornal Diário
equilibra-se
nos indispensáveis
saltos Christian Louboutin
para analisar os fatos políticos
com distanciamento crítico
e objetividade jornalística.
Ela é jovem, moderna, sofisticada,
usa vestidos Patrícia Bonaldi
e bolsa cor de prata Hermès
(Mercúrio é a divindade que rege
as comunicações). Em seu twitter,
dispara o último grito
dos bastidores do Congresso,
com senso de humor peculiaríssimo
e a mais apurada reflexão.
Entre um e outro gole de cherry brandy,
folheia, na revista novaiorquina,
as últimas criações de Domenico Dolce
e Stefano Gabbana, inimagináveis
nessa selva selvagem de mortos de fome.
Vivemos no pior dos mundos possíveis,
diz ao seu personal trainer,
o último círculo do ínfero Hades,
onde desfilam hordas de africanos,
índios, pederastas, crianças ramelentas,
estudantes bolcheviques. Massa mal-cheirosa,
escura, ignara, que nunca leu Paulo Coelho,
Afonso Arinos, Fernando Henrique Cardoso.
É impossível viver com essa gente,
pondera com a sua manicure ucraniana,
é preciso dividir o Brasil em bantustões,
para que a raça branca tenha um futuro possível.
Ela acredita na Divina Providência,
no Destino, nas Forças Vivas da Nação.
E aplica suavemente gotas aromáticas
(Ralph Lauren) em sua nuca,
enquanto espera pela Vinda do seu Fuhrer.

Claudio Daniel


ANTIMÍDIA V



Contra a entranha —
multiplica o medo
no borrão desfigurado;

unhas enegrecidas,
maxilares arrancados,
miuçalha de carcaças.

Nenhuma língua enterrada
na fossa onde caranguejos
copulam com capulhos;

mistério ou talvez corrosão
de ácidos na decapagem
para a despossessão de tudo.

Retrátil, contra teu sangue,
a exaustão do que esfiapa
o símile do pensamento.

Esta pele, tua pele, nenhuma pele:
tudo é número e o número
é legião; meu nome é legião.

2014

Cláudio Daniel 

ANTIMÍDIA IV



desentranha.
voz que vem da carne;
adensamento da voz
que recusa ser centaura.
desmultiplicada,
limítrofe da afasia.
no antilabirinto:
fugitiva do Limbo.
que ninguém escuta:
hermafrodita, hermafrodita.
onde queimam fetais:
é absurda, quimérica.
fala para si, solipsista,
como jargão
de ofícios militares;
soa tantálica, prometeica,
como se saísse
de uma boca costurada;
como ressurgido mugido
de um mamute siberiano.
como se não fosse nenhum
som humano.


2014

Claudio Daniel

contemplar está no templo
o ar no amargo
a ilha é o lugar
mais perto ?
a hora mais amarga
é a f lt ? de memóri ?
ou o que morre lentamente
lembrando o imenso


Marilia Kubota

Pó e poeira


ele não sabe dizer acorde
mundo imóvel
pequenas luzes insensatas
mal-estar
pensa beleza é inteira
não desconforto
palavra inquieta
& brilho simultâneo
de felicidade ordinária
ao mesmo tempo dor
e coragem não
escamotear a dor:
comer com farinha
de matéria humana
é poesia
quando não
só estrela
cai na saboneteira
do banheiro público
quem
não sabe o que é
Poesia
lava o rosto
fica alegre
e sai rindo
para encontrar
o amor

Marilia Kubota



VIDA NAMIDA


vou ali volto voando
vai chegar o dia
de falar com joaninhas
dançar com tartarugas
jogar cinco marias
com vadios de rua
longe a alforria
não sou dono do tempo
vida namida
quando acordar
é do outro lado
sem ver o sol+dado
que lutou comigo


Marilia Kubota
a criança alonga a tromba:
a nuvem negra !
desmancha o elefante
Marilia Kubota

pensam que faço poemas a machado?
faço poemas com fino tratamento:
no corpo do poema o meu tormento
na sua pele meu corpo revelado."

RR









a sombra some aos pés
do grande homem.
a formiga corre.

Marilia Kubota

consciência


para os devidos fins, eu, brasileira, sou mistura
e temperança. minhas orações futuras
serão as alianças
entre os genes que colorem a carnadura
com abastança.
e saibam todos, não há cores nas escrituras
sejam sacras ou profanas.

rosa ramos

 eu tenho medo de adultos que usam camisetas estampadas com miniaturas de ursinhos, coelhinhos, gatinhos e essas coisas...juro!
Adriana zapparolli

psicogeografia


vi a casa onde o vi pela vez primeira
era quase noite e havia café na mesa
um menino de vinte e poucos anos
e eu me sentia tão senhora
era só uma mulher a ignorar
que dali trinta anos eu iria amá-lo
vi a casa e pensei em viagens no tempo
pela luz de alguma estrela, voltar a pisar tua casa
dizer com voz delicada e sem poesia
- dá-me tua boca, amor!
e então soaria como vaticínio
os poetas são - os fingidores -
e te amar agora traz a maldição de Pessoa
a "dor que deveras sinto"
a dor que me devora
a dor de não soar como eternidade
o amar severo e firme
o amar décadas depois
o menino que brinca na cabeceira da mesa
de uma cozinha quase às escuras
e lembrando nossos encontros raros
você sempre espanta o sol
tem sempre neve, bruma, luz amena
acho que a tua alma solar
clareia mais que a estrela-mor
ontem eu vi aquela casa
e te desejei de novo, com tanta poesia
que quase toquei tua mão pousada na toalha
com o mesmo desejo daquele encontro atual
de tomar tuas mãos largas acima da mesa
e dizer suave como se fosse ordem:
- dá-me tua boca, amor!

Bárbara Lia

quinta-feira, 13 de novembro de 2014

Marilia Kubota

Ontem fui tomar caldo-de-cana na Praça 29 de Março. Na terra em que nasci, Paranaguá, caldo-de-cana se chama "garapa". Da infância, lembro de uma bebida estranha, sorvida em tacinhas de metal, com filtros de papel, na festa em homenagem à Nossa Senhora do Rocio. Só em Curitiba, a garapa passou a ser caldo-de-cana, e deixar de ser a bebida estranha da festa popular.
Há cerca de duas semanas, na barraca em que costumo tomar caldo-de-cana na Praça 29, um trio chegou. Não sabia se tomava ali ou levava a bebida para o escritório. Afinal decidiram tomar ali . Além de mim, a dona do caldo-de-cana teve que atender outra pessoa que chegava, um carteiro. Pelo visto, o carteiro sempre passava por ali. A senhora ficou um pouco confusa por ter que atender tanta gente. Uma das pessoas do trio começou a zombar, dizendo que a "tia" não conseguia fazer tudo ao mesmo tempo: extrair o caldo, servir e receber o dinheiro de cinco clientes. Não sei se ela ouviu, mas achei cruel. Eu e o carteiro ficamos em silêncio, esperando que ela encontrasse o tempo dela. Na semana anterior, quando fazia um belo dia de sol eu havia parado ali para conversar. Pedi o caldo e, com tempo, papeamos sobre primavera, passarinhos e árvores.
Contar, ler ou ouvir histórias talvez seja perder tempo. Não há nada pior do "perder tempo" na sociedade time’s money. Mas também penso numa crônica de Lya Luft, que dizia que a leitura era útil para os que estão doentes ou são mais velhos. Talvez eu tenha nascido velha, por isso os mais jovens, enérgicos e competitivos sempre me pareceram agressivos e cruéis. Ainda ouço pessoas mais jovens ou rápidas do que eu dizerem que sou muito lenta, tímida e que faço coisas de gente velha. Elas me falam e pensam que não ouço. Tenho certeza que sempre se ouve qualquer sinal de impaciência dos mais jovens, por isso a crueldade. Não se pode fazer nada, essa "ética" demanda de uma sociedade competitiva. Mas acredito que no plano pessoal, cultivar a paciência traz o beneficio mínimo de ouvir belas histórias.


Marilia Kubota

Bom dia ! Comecei a publicar histórias singulares em oposição à discussão de histórias públicas que saem nos jornais. Será que a nossa voz, pequena e fraca, pode ser ouvida , numa rede feita por nós e para nós ? 
arte a fundo perdido?

the art of losing isn’t hard to master
(elizabeth bishop)

saber perder é ardoroso ofício
ser vencido por inocentes
oportunidade difícil
quem desiste
vaga na imaginação
dispensa a ouriversaria
de artífice inexperiente
num mundo de labirintos e acúmulos,
frequente a perda de sentido
a cada esquina
a águia ergue túmulo
vendo o gigolô de destinos
defenda seu fim , contundente:
“com a distração, trevas ilumino”.
18/05/96


Marilia Kubota


A graça é um estado superior. Conheci pelo menos duas pessoas que viviam em estado de graça. Uma delas foi o poeta Rollo de Resende. A outra, o artista visual Claudio Seto. A graça era saber como tratar cada pessoa que se aproximasse deles. Cada um de nós pode ser gentil em alguns momentos e grosseiro em outros, conforme o estado de espírito. Rollo sempre agia em todas as situações com humor. E Seto ou era extremamente gentil ou extremamente bem humorado. Não cultivamos a graça todos os dias, mas temos santos para nos inspirar.
Amanheci com toda a intenção de ser trilho de trem - linear, organizada, dando conta de cada minuto programado - Súbito, meu dia pegou delírio e me desgovernei como folha de árvore no meio do vendaval. Meu poeta Manoel de Barros morreu sem eu ter consciência de sua mortalidade. Precisarei de mil bocas de bárbaros para encostar meus ouvidos e sentir o rumor de sua poesia, como se concha acústica fosse. Alinho, organizo e dou conta de cada um dos seus livros, na minha biblioteca. Atividades prosaicas e prazos finais para entrega de originais, que esperem...Hoje o poeta dedilha o sotaque do além e nós mortais integramos um entresonhado coral.

Glória Kirinus.

As ciganas

 De Mara Paulina Arruda

O Professor já um tanto meio surdo estava deitado no sofá de frente para a janela. A metade da cortina puxada. Ele via o céu. Neste espaço entre o céu e o seu ver algumas aves passavam e interrompiam sua leitura fazendo um risco de sombra na luminosidade que ele recebia. Estava, sim, que bom, de férias! Deliciava-se com essa folga e lia sobre os ciganos. Imbuído dos mistérios deste povo refletia: como seria viver assim entre carroças e cidades novas a cada mês?
Voltava os olhos para tempos idos. Que ano?
Foi próximo de um assentamento. Ele viajava de Santa Catarina para o Rio Grande do Sul quando viu no meio da rodovia três ciganas sentadas em frente de uma barraca. Uma via o futuro da outra, a outra fazia trança nos cabelos de uma. Estavam vestidas a caráter, sobre a cabeça lenços com pingentes pregados nas bordas. Em iídiche as ciganas se comunicavam.
Na viagem um dos pneus do carro furou. Ele foi obrigado a parar ali. Buscou o estepe e quando começava a troca uma das ciganas apareceu se oferecendo para ler a sua sorte. O Professor agradeceu sem olhar para a cigana. Estava envolvido com o carro. Ela, insistiu e pediu que ele fosse até onde elas estavam, ouvisse uma delas que iria ler a palma de sua mão. Depois, talvez, um pouco das lendas ciganas elas contariam.
Ele parou. Viu os olhos amendoados, mãos e braços cheios de anéis e pulseiras... Foi.
Para ai!
O Professor se levantou do sofá.
Cheio de dúvidas não sabia mais se era o livro que lia ou se era a verdade vivida.

Alguém já tinha dito pela manhã: meu velho meu velho... Cuidado!

Melancholia II


esta tristeza vaga profunda e persistente
esta música permanente – Nona Sinfonia
a rasgar o coração sinto acre odor podre
de tua alma. lavo-me com bucha vegetal
sabonete de lavanda para espantar esta
carnadura de ódio das minhas entranhas
anseio ir viver em um antro de gueixas
onde um velho cultua uma espada fria
para transpassar teu coração – cima/abaixo
o meu canto é negro e triste e nada nada
vai alterar esta caótica visagem – esfuma
a cada giro das asas do temível beija-flor
Bárbara Lia


quarta-feira, 12 de novembro de 2014

20 ANOS RECOLHIDOS


chegou a hora de amar desesperadamente
apaixonadamente
descontroladamente
chegou a hora de mudar o estilo
de mudar o vestido
chegou atrasada como um trem atrasado
mas que chega

Chacal


Tem dias que eu me acho.
Outros que eu me perco.
Hoje, por exemplo, estou perdido
num labirinto de desejos,
louco por achar-te.

olw

RAMBOU?


Não se fazem mais poetas
como antigamente
Ouvi dizer…
De fato, ser uma voz
que exale todas as outras
E são tantas…
Pois bem...
não contasse eu com tantos invernos
seduziria alguém de mais idade
faria uma temporada no inferno
(take a walk ont the wild side)
escreveria alguns versos putativos
desses que arrostam putas, travestis
michês, polícias e lambisgoias
todos carregando sua própria
Cruz Machado
Depois, sairia de cena abruptamente
o resto de meus dias entre noias
traficando nos fundos da Catedral
Até amputarem o poema

Marcelo De Angelis


NIETZSCHENEANO


As musas estão mortas
e o Espírito do Senhor já não me visita com a mesma regularidade.
Ando a esmo,
procurando o outro no mesmo
e o todo no nada.
Ainda resta
uma réstia de sol detrás dos últimos edifícios.
Mas é difícil virar a esquina, engolir a saliva
quando, morto o amor, não sobra nem raiva nem rima.
Mas quem sabe
se eu te visse sem blusa,
do grande caos que há em mim
nasceria
uma estrela bailarina.
Olw

SÓCIO DO ÓCIO


doce ociosidade
sacia minha sede de ser assim
largado no mundo caído na vida
terra mãe luz da manhã
doce sociedade ociosa sempre no cio
já aboliram a escravatura
pendure sua rede mate sua sede
de se espreguiçar
de volta ao princípio
onde o que come é comido
cru ou cozido
vou te devorar
viva nossa carne mortal
de partículas imortais
para pulsar
filhos do sol
até que se cumpra
nosso destino cósmico
sou sócio do ócio
eu sou

Chacal



CARA A CARA


Detrás dos olhos
da cara
do cara
que no espelho
me olha agora,
eu penso:
vou morrer.
E daí?
E daí que não levo nada
das coisas que tive,
dos livros que li,
dos versos que escrevo.
(Tremem as pálpebras
do cara
e no peito, eu sei,
o coração.)
Detrás dos olhos
da cara
do cara
que no espelho
me encara agora,
pressinto:
não vai sobrar nada.
E daí?
E daí que vou dizer pra ela
na primeira ocasião:
danem-se as máscaras,
as caras feias,
e as etiquetas.
Me dá um beijo agora!
(Tremem as pálpebras
e dos olhos
uma lágrima rola.)

Otto Leopoldo Winck
O som das teclas à revelia
Do som dos homens batendo
Canecas em cadeias cheias
De mofo
Escrever como quem foge de alcatraz.
De resto
Um pensamento cheio de merda
Dizendo "dorme, dorme, dorme..."

Alexandre França 

MOCIDADE MORTA


adeus ócio
adeus vícios
entre vinicius
e sid vicious
eu vou ficando por aqui
de cara
pros edifícios

olw

limite

daqui a duas horas,
sempre terei sabido que você não viria
daqui a duas horas,
o fio da palavra já terá se desconectado
daqui a duas horas,
o poeta não explodiu,
simplesmente tornou-se mais uma paisagem urbana,
poderei continuar sonhando,
mas somente daqui a duas horas
de onde você está.
não que me importe, eu não me importo
não que faça diferença, não acerto o relógio biológico
não que sobreviva:
é sempre um ponto a se alcançar,
turbilhão de negativas a negociar,
eu ficarei mansinho,
assobiando em minha própria sombra.
-


claudinei vieira

MAS-VALIA


o negócio
mata o ócio
e nega o cio

olw

domingo, 2 de novembro de 2014

Nas ruas estreitas não sorriem mais os pés da infância
entre as lágrimas de pedra dormem moradas sonhadas
o denso humo esconde os trapos de corações e vidas
e uma fronteira invisível de arame farpado nos corações
suando sangue como leite derramado de orações.
Gaza onde as balas não são perdidas só são assassinas
gafanhotos de metal ceifando o trigo tenro da manhã.

Nas ruas estreitas  entre escombros nascem flores
nos capacetes ninhos de andorinhas .
Sonhos escorrem entre as frestas dos muros
escondem-se nas explosões.

nascem manjares da fome de desejar saciar de pão a angústia.

Mas as portas sempre estarão abertas para uma xícara de café...

As Salam Aleikhum.

Wilson Roberto Nogueira

Tudo é perda. Na vida
nada se ganha. Tudo se perde.
Mas se o maior ganho desta vida é perda,
a maior perda nesta vida é ganho.
Por isso, ao tocar-te,
eu te perco, e perdendo-te,
te ganho, perdida
para sempre na memória.

Olw