sábado, 31 de outubro de 2015
Eu escrevi há algumas horas, que nas minhas festas infantis,
costumava colocar papéis com poemas dentro das bexigas de aniversários.
Mas, antes de aprender a escrever, eu já tinha atitude
semelhante.
Lá, pelos meus cinco anos de idade, notei que quando um balão
se estourava, a criança que era a sua “dona” chorava no mesmo instante.
Então, nos preparativos do meu aniversário, comprei
estrelinhas de papel cintilante na papelaria. Assim coloquei constelações em
cada bexiga de borracha que soprava. Desta maneira, na hora da comemoração,
quando de repente um balão se estourou, a menina que estava brincando com ele
fez cara de choro. Porém, quando ela avistou a chuva de estrelas, que caia do
alto, ficou encantada e deu um sorriso. Deste jeito, a minha festa virou uma
tempestade de astros cadentes e ninguém mais derramou lágrimas.
( Confissões da Tia Lu )
Luciana do Rocio Mallon
Carta de Graciliano Ramos para a irmã Marili: duro e valioso conselho a quem escrever
Rio, 23 de novembro de 1949.
Marili: mando-lhe alguns números do jornal que publicou o
seu conto. Retardei a publicação: andei muito ocupado estive alguns dias de
cama, a cabeça rebentada, sem poder ler. Quando me levantei, pedi a Ricardo que
datilografasse a Mariana e dei-a ao Álvaro Lins. Não quis metê-la numa revista:
essas revistinhas vagabundas inutilizam um principiante. Mariana saiu num
suplemento que a recomenda. Veja a companhia. Há uns cretinos, mas há sujeitos
importantes. Adiante. Aqui em casa gostaram muito do conto, foram excessivos.
Não vou tão longe. Achei-o apresentável, mas, em vez de elogiá-lo, acho melhor
exibir os defeitos dele. Julgo que você entrou num mau caminho. Expôs uma
criatura simples, que lava roupa e faz renda, com as complicações interiores de
menina habituada aos romances e ao colégio. As caboclas da nossa terra são meio
selvagens, quase inteiramente selvagens. Como pode você adivinhar o que se
passa na alma delas? Você não bate bilros nem lava roupas. Só conseguimos
deitar no papel os nossos sentimentos, a nossa vida. Arte é sangue, é carne.
Além disso não há nada. As nossas personagens são pedaços de nós mesmos, só
podemos expor o que somos. E você não é Mariana, não é da classe dela. Fique na
sua classe, apresente-se como é, nua, sem ocultar nada. Arte é isso. A técnica
é necessária, é claro. Mas se lhe faltar técnica, seja ao menos sincera. Diga o
que é, mostre o que é. Você tem experiência e está na idade de começar. A
literatura é uma horrível profissão, em que só podemos principiar tarde;
indispensável muita observação. Precocidade em literatura é impossível: isto
não é música, não temos gênios de dez anos. Você teve um colégio, trabalhou,
observou, deve ter se amolado em excesso. Por que não se fixa aí, não tenta um
livro sério, onde ponha as suas ilusões e os seus desenganos? Em Mariana você
mostrou umas coisinhas suas. Mas – repito – você não é Mariana. E – com o
perdão da palavra – essas mijadas curtas não adiantam. Revele-se toda. A sua
personagem deve ser você mesma. Adeus, querida Marili. Muitos abraços para
você.
Graciliano.
Você com certeza acha difícil ler isso. Estou escrevendo
sentado num banco, no fundo da livraria, muita gente em redor me chateando.
Carta extraída da Revista Graduando, núm. 1 jul/dez 2010
fonte : https://fluxoeditora.wordpress.com/2015/09/29/carta-de-graciliano-ramos-para-a-irma-marili-duro-e-valioso-conselho-a-quem-escrever/
Poesias de Jovino Machado
lúcifer no cio
seu próximo passo
é retocar o batom
e assassinar
o amor que não existe
seu próximo passo
é pintar as unhas
e furar os olhos
da menina triste
que quer ser madonna
seu próximo passo
é usar os novos brincos
e derrubar do viaduto
o menino pobre
que quer ser guevara
seu próximo passo
é escolher a minissaia
e comprar a alma
do último trovador
enxofre
nem o perfume
da chuva azul
da brisa da tarde
do azeite de oliva
do chanel número 5
da coxa da marlyn
do sexo selvagem
do vinho tinto
do quarto de hotel
do esmalte vermelho
do salmão defumado
dos versos vazios
vão dissipar o seu cheiro de enxofre
educação sentimental
como abortar um amor
não é uma lição
que pode ser estudada na biologia
mas pode ser apreciada
em qualquer antologia
cachorro
a palavra que me mata
é a mesma que me ressuscita
me agradar é difícil
como pisar na sombra
me desagradar é fácil
como cuspir pra cima
sou como um cachorro
vou onde me dão
comida e carinho
mas não é bom brigar comigo
tenho memória de cão vingativo
e fico imensamente triste
quando o mundo não me obedece
Jovino Machado nasceu em Formiga ( MG ), em 1963. Foi criado
em Montes Claros e vive em Belo Horizonte. Publicou 15 livros de poemas: Só
poesias (1981) , Em cantos e versos ( 1982 ), Uma mordida para cada língua (
1985 ), Deselegância discreta ( 1993 ), Trint' anos Proust' anos ( 1995 ),
Disco ( 1998 ), Samba ( 1999 ), Balacobaco ( 2002 ), Fratura exposta ( 2005 ),
Meu bar meu lar ( 2009 ), Cor de cadáver ( 2009 ), Amar é abanar o rabo ( 2009
), Cantigas de amor & maldizer ( 2013 ), Meu jeito bêbado de ser ( 2015 ) e
SOBRAS COMPLETAS ( 2015 ). Tem poemas publicados no Suplemento Literário de
Minas Gerais, Revista Poesia Sempre, Jornal Rascunho, Jornal Cândido, entre
outras publicações. Publicou poemas e entrevistas com personalidades do teatro,
do cinema e da literatura no no portal www.cronopios.com.br, na revista
eletrônica GERMINA - REVISTA DE LITERATURA & ARTE e no blog Blog do jovino
machado - UOL Blog...
NÃO É SÓ MAIS UMA NOITE NO INFERNO
Você prometeu que estaria aqui quando eu voltasse
me esperando com uma garrafa de Jack e sorvete de caramelo
Você estaria ouvindo Headcat e ia ser uma noite longa num
motel de beira de estrada
A gente ia rir como nos bons tempos
com minhas piadas sem graça e meu senso de humor sem nenhum
senso de oportunidade
e ficar morgando na banheira de hidro ouvindo uma trilha
sonora do inferno
Você me prometeu uma vida
sem abutres voando sobre minha cama na beira do abismo
Você prometeu que haveria um Deus que cuidaria de mim
e fui estúpido e inocente o suficiente
pra acreditar em você
Agora quando eu olho pra essa parede vazia
apenas com o retrato da Sasha Grey na parede
é que eu entendo que o tempo todo você tava mentindo pra mim
Eu só precisava perder o medo de te perder
pra não ter mais medo de nada
(Mário Bortolotto)
CAMINHA INVISÍVEL
Caminha invisível o amor
na multidão doída e apressada
entre olhares dispersos.
O amor caminha só,
anjo atravessado por passos rápidos.
É menos do que um mendigo o amor
na hora do rush, na plataforma dos trens
e a cidade incandesce
minutos antes do pôr do sol.
Francesca Cricelli .
Está no seu livro, REPÁTRIA (Selo Demônio Negro,2015)
Sobre Emil Cioran
O primeiro livro que li dele foi ''
Breviário da Decomposição '' em 2004, a identificação foi imediata; depois dois
outro, que li em italiano, embora comprados na mesma ocasião, só iria ler
alguns anos mais tarde (2009 e 2011). O niilismo e pessimismo dele, e o senso
agudo da decadência ,foram marcas visíveis para mim -- então um niilista na
época. Um fato perceptível , porém, não translúcido ao leitor , é sua paradoxal
crença espiritual através da negação , alguém que tenha estudado Santo Tomás de
Aquino , entenderá; - Cioran, ironiza o cristianismo e ao mesmo tempo acusa a
modernidade de tê-lo eliminado em nossa civilização, às vezes mais parecia ser
um cismático do Oriente Europeu que temia aderir o catolicismo, e não iria
aderir a nada, pois entender o nada com o mesma revolta do absurdo de um Camús,
foi a meta do filósofo - sem dúvida o exílio era a condição ímpar no longo
percurso da reflexão que aborda a decrepitude e a inevitável autodestruição do
Homem. Era um insone convicto e portanto alguém fadado a pensar demais, e ele
pensou, as vigílias de seu limbo dissecam os muitos limbo da vida humana. O
cardeal Gianfranco Ravasi em um excelente artigo sobre o filósofo cultor de
desesperos em seus cumes, escreveu : " Este inclassificável
escritor-pensador, em 1937, aos 26 anos, emigrou para Paris, onde viveu até a
morte, em 1995. Foi estrangeiro para a sua própria pátria, cujo nome tinha
suprimido de seu registro civil, abandonando inclusive seu idioma natal. Foi
estrangeiro no país que o acolheu, por causa do seu constante isolamento:
"Eliminava do meu vocabulário uma palavra após a outra. Acabado o
massacre, só uma sobreviveu: solidão. Despertei satisfeito".Estrangeiro,
por último, para Deus, apesar de Cioran ser filho de um sacerdote ortodoxo. Tão
estrangeiro que se inscreveu na "raça dos ateus", mas viveu com a
ânsia insone de seguir o mistério divino. "Sempre rondei a Deus como um
delator: sem ser capaz de invocá-lo, eu o espionava". A sua obra é produto
de um eremitério ora niilista, ora quase crente ... viveu tentado entre Deus e
o diabo , até em seu eremitério ,era estrangeiro , todavia , não exilado.
Tullio Stefano Sartini
sexta-feira, 30 de outubro de 2015
Lenda do Preso Que Tentou Escapar Disfarçado de Idosa
Reza a lenda, que neste final de semana, um marginal que já
foi preso por crimes como: roubo, tráfico e violência à mulher, tentou escapar
disfarçado de idosa com uma máscara de silicone.
Com certeza, o bandido não tinha a meiguice das trans e nem
a criatividade das drags. Pois ele foi descoberto através da maneira patética
de andar.
Seria bom que este detento fizesse a última prova do ENEM.
Pois através do texto, de Simone de Beauvoir, ele descobriria que ninguém nasce
mulher, torna-se mulher.
( Tia Lu Muito Irônica)
Luciana do Rocio Mallon
Lendas Brasileiras Com Personagens Assexuais
Assexual é a pessoa que não sente atração sexual e nem tem
vontade de fazer sexo.
Alguns personagens de nosso folclore, que leremos abaixo,
podem ser considerados assexuais:
Vitória-Régia:
Numa aldeia do Norte do País, existia uma índia chamada
Naiá. Vários homens queriam se casar com ela, mas a moça sempre recusava os
pretendentes. Pois vivia dizendo que preferia se casar com a Lua e virar
estrela a deixar um homem tocar em seu corpo. Porém seus conhecidos sempre
diziam:
- Você não pode ser levada para a Lua e virar estrela porque
você é muito bonita. Por isto precisa se casar e conhecer as delícias da paixão.
Porém, todas a noites Naiá, ficava admirando a Lua.
Numa madrugada em que o luar estava forte, esta donzela
chegou à beira do rio e viu a imagem da Lua refletida nas águas. Assim ela
pensou que a Lua estava se banhando e tentou abraçar o satélite natural. Porém,
como não sabia nadar direito, morreu afogada. A Lua ficou com pena e
transformou a índia numa planta aquática chamada Vitória Régia. Dizem que por
Naiá ter morrido virgem, suas flores são perfumadas e brancas.
Esta índia seria o que chamamos de uma pessoa assexual
romântica.
Amazonas
O mito das Amazonas, corajosas e feministas, vem da Antiga
Grécia. Reza a lenda que por elas serem de uma raça superior não sentem desejo
sexual e só usam os homens para a reprodução. Por isto, costumam viver em
aldeias, exclusivamente, de mulheres. Elas costumam cortar o seio direito para
melhor manusear as armas. Mas tem o poder de escolher os tipos de homens com as
quais desejam reproduzir. Se a criança nasce menino elas dão para o pai criar,
porém se nasce menina, estas mulheres levam a pequena para a aldeia com o fim
de educa-las, o que para as Amazonas, não é tão difícil porque estas garotas já
vem com a genética das guerreiras e o dom de não ter interesse sexual.
Dizem que as Amazonas chegaram à Região Norte do Brasil
através do Estreito de Bering.
Em 1540, o explorador espanhol Francisco Orellana, fez parte
de uma jornada exploratória na América do Sul, cruzando, então, o rio que
penetrava uma das mais misteriosas florestas. Reza a lenda que ele teria visto
no reino das Pedras Verdes, mulheres sem um dos seios, conhecidas pelos
indígenas como Icamiabas, expressão que tinha o sentido de ‘mulheres sem
marido’. Assim, estas moças derrotaram os brancos com seus arcos e flechas.
O estado do Amazonas recebeu este nome por causa da lenda
destas moças.
As Amazonas são exemplos de assexuais arromânticas, pois não
querem viver um relacionamento e o sexo é só para a reprodução.
A Virgem do Velório
Esta lenda tem diversas versões em muitas partes do país.
Mas me baseei num causo de Curitiba, na cidade do Paraná.
Em toda a cidade, sempre existe a figura de uma senhora
solteirona que namorou pouco na juventude, é tímida, inteligente e diz a todos
que permanece virgem. Por isto, torna-se vítima de bullying da vizinhança, que
sempre costuma dar apelidos pejorativos a esta figura como: geladeira, frígida,
etc.
Nos anos setenta, uma senhora, com estas características,
faleceu em Curitiba e no seu velório dois moços fizeram o seguinte diálogo, em
voz alta:
- Será que ela era virgem?
- Eu duvido!
Naquela noite, a senhora morta apareceu nos sonhos dos dois
e disse-lhes:
- Eu, realmente, sou virgem. Tanto que os anjos me deram
esta autorização, de descer à Terra e falar isto a vocês.
Reza a lenda que quando uma mulher virgem e que, nunca teve
desejos sexuais, morre é melhor não duvidar de sua honra. Pois, ela pode
aparecer em seus pesadelos.
Luciana do Rocio Mallon
Por 30 Moedas
eu tenho medo...
daqueles que
não se indignam com nada
receio dos indiferentes
desconfio dos que só elogiam
tenho vergonha...
dos que se omitem
dos que não se posicionam
dos oportunistas de situação
dos que só curtem
e ficam ao lado dos mais fortes
tenho vergonha...
dos que escondem
suas origens e raízes
medo de pobre
disfarçado de rico
de rico disfarçado de ovelha
tenho fobia...
dos que mudam de lado
por cargos e promoções
trocando sua ideologia
por interesses pessoais
tenho medo...
dos que puxam o tapete
sem escrúpulos
dos invejosos do brilho alheio
dos que beijam a face
e apunhalam às costas
tenho medo...
dos falsos amigos
os que juram cumplicidade
dos que fingem fidelidade
para manipular e tirar proveito
tenho medo...
dos que se utilizam de fake
para dizerem o que pensam
sem mostrar a verdadeira face
fingindo ser o que não são
tenho medo...
dos donos da verdade
tratorando a verdade
de quem pensa diferente
desrespeitando o ser de cada um
tenho medo...
dos sociopatas de campanhas
dos lambe botas dos poderosos
dos que vendem a alma
por 30 moedas.
________________GoVermelha
Goretti Bussolo
Você não viu
que eu roubei a lua?
Toma ela então
de presente
neste tubo do Ligeirinho,
com todas as estrelas
e uma bola de fogo
que ora se chama sol,
ora se chama amor.
Otto Leopoldo Winck
ÁGUA FORTE
Girando
ritmadamente
(ela submersa
no inferno denso e negro
do café)
esta pequena
colher de prata
da qual
vês apenas
— preso entre teus dedos —
o cabo
sem grandes
arabescos
fazes emergir
em torvelinho
a partir da tona
líquida
escura
uma nuvem de fumaça
até teu rosto
que a recebe
sorrindo.
Carlito Azevedo
VENTO
A manhã e alguns atletas desde cedo que estão dando voltas
— á Lagoa.
Outros seguem para o Arpoador (onde o ar é de sal e insônia
e a beleza ri com urna flor de álcool entre os dentes).
O mar desdobra suas ondas sob o violeta dos
olhos da menina no alto da pedra.
Um falsete fica reverberando sem querer morrer.
Dos cabelos desgrenhados de meu filho
se desprega, ao vento, como um
sorriso, como um relâmpago,
um pensamento triste.
Carlito Azevedo
De Sob a noite física (1996)
LIMIAR
A via-láctea se despenteia.
Os corpos se gastam contra a luz.
Sem artifícios, a pedra
acende sua mancha sobre a praia.
Do lixo da esquina partiu
o último vôo da varejeira
contra um século convulsivo
Carlito Azevedo
Viciados em gerundismo
Você pode estar falando assim sem se dar conta que pode
estar se viciando e estar passando adiante essa praga terrível.
Você pode estar se comunicando modernamente sem usar o
gerundismo.
Os adictos podem estar parando de estar passando por fax,
estar enviando por email, ou estar enviando pelo correio. Eles podem estar se
curando e estar deixando de ser usuários de excesso de gerúndio.
Enfim, o que quero estar dizendo é que é desagradável ter
que estar ouvindo palavras desse jeito.
Isso pode estar vindo, ou estar surgindo, ou estar se
propagando pelas traduções de texto do inglês para o português. Não estou
garantindo.
Gentem... vou estar continuando a conversar amanhã... ou
depois.
Vou estar mandando beijos a vocês todos!!!!
Deisi Perin.
sexta-feira, 23 de outubro de 2015
Via Cruzes: à Machado
“Toda cidade que dorme: merece seus pesadelos”
O desgosto enche copos
E esvazia garrafas
A dor desce logo
Arranhando as vidraças
Não fica pedra sobre pedra
Na calçada
A rua deserta flerta
Com meia dúzia de corpos
Talvez alguns poetas
Ou vampiros assustados
Não fica pedra sobre pedra
Na calçada
Brincar com os amigos
Termina em um ouvido atordoado
Nem todos que se abraçam
estão já perdoados
Não fica pedra sobre pedra
Na calçada
Amanheço no centro de triagem
Do inferno:
Dois olhos famintos
No álcool mergulhados
Não fica pedra sobre pedra
Na calçada
Saio dessa vida, não mais volto
Querem brincar de morrer: morram
Pareço mais preso do que solto
Os que ainda puderem me socorram.
Julio Urrutiaga Almada do livro Poemas Mal_Ditos
Instantâneo Enlace
Esperança
Que mundo de sombras este,
Onde a penumbra
Nos cobra favores.
Onde o anônimo
Nos traz dissabores.
Onde quem cala,
Nos fere com a alma,
Não comprometida.
E que depois de tanto, porém,
Sempre há o modo certo
De calar as cicatrizes.
(1999) Instantâneo Enlace
Julio Urrutiaga Almada
Ex - tratos fera
O frio que me congela,
não é o inverno.
Inverno aqui, verão,
Em outras terras.
A Terra que me preservam,
Não dá colheitas.
Colheitas são
dos que prosperam.
(1999)
Julio Urrutiaga Almada
Como somos
Infecundo nó, ou será fecundo, nas entranhas,
Da terra fascinante, presa a nós?
Corrente medula e somos sós,
Milhões de sóis pequenos esfriando.
A praia que farol longínquo
De asas arenosas, erguidas.
Verdes, são os olhos, que busco,
Nesse mar de asas arenosas.
A praia que lua transposta
Fonte de surpresas inacessíveis.
Águas ,crateras inexistentes, dos risos,
Na distância, de suspiros intransponíveis.
A praia que verso carrasco.
Areias emigram, assim quero
O mar , que deposite, os secretos
Mistérios, nos olhos que trago.
(1987)
Julio Urrutiaga Almada do Livro Instantâneo Enlace
quarta-feira, 21 de outubro de 2015
Reunião
Recolher o lixo, tarefas
Psiques, sonatas, deuses
Odes, palavras, semióticas
Adeuses
Tudo amo
Amor no plano
Deus e eu
Não o substituo
Crio quando amo
A ciência e seu próprio clichê
Cientistas escrevem mal, então
Amar não se pode compreender
O coração!
Mais que a intelecção
Ou explicação
Do ser ou não ser.
Caminhos são caminhos
Ao amanhecer
Automatismos muitos:
Amigos que vou ver.
Letrados, explicados, racionalizados.
Utilizados
Ou escravizados pelo poder!
Tenho uma "missão-clichê"
Tenho
Tento
Ter tanto
Tudo tal talo tem telas todas
Talvez
Telêmaco
Tarefa prolixa, - linguístico exercício
Escrever...
Pego ondas lindas em inconscientes próprios
Aos quais meu orgulho teima em ceder.
Sei que tudo pode ser destruido...
A métrica, o sentido,
- menos a "sanidade mental".
O mínimo
O máximo
O limite que crio,
História do frio e solidão
Então me esconderei
Em um parágrafo frágil
Ao preço da comida
A ida
E a volta
Ao centro da misericórdia
Calhorda
De Lúcifer e seus seguidores
Instruídos espiam
Sinto
Sonho
Vivo
Redivivo caráter da moral
Que nem em meu quintal
Encontrei por abstrair valor.
Senhor Deus!
Amigos meus em solidão
Esconderijos de páginas de livros
Palavras se pronunciarão
Em alto som
Nas margens dos rios de Sião
A bela composição
Dos anjos esquivos desta terra
Que amam o transcendente
e o ardente.
Indiscriminadamente,
Sentem
Como eu.
Estou corrigindo minhas odes aos ateus.
Não sabia para onde ia.
Até as pernas torcerem
Na queda ao chão da vaidade intelectual.
Agora letras acompanham o inconsciente.
Sonho com mares mais profundos que os mares-clichês
Ortografias muitas que não vou atiçar!
Levem o que querem daqui.
Para seu mestre, Lúcifer.
Ele costurará as vestes de vaidade inventada.
A tornar-se anjo de novo
E não serpente ignorada.
Javé enigma judeu
Meu povo plebeu
Minha mesa farta
Somos senhores filósofos aéreos
No cultivo da palavra
Nossas asas não são de aço
Nosso
espaço, que eu faço
Construo e não poluo
Desfaço
Mudo
Tudo
Quanto queira.
Já não tenho eira nem beira
Na carteira
importada.
segunda-feira, 19 de outubro de 2015
Não adiei nada. Passei alguns dias olhando os canteiros de
amores-perfeitos roxos nas floreiras da Rua XV e viajei
com a ideia de voltar com uma máquina e registrar as
flores...
Todas as pétalas roxas ao balé do vento, uma luz estranha
que captava o olhar...
E ontem elas não mais estavam.
Não esperaram minha volta, foram substituídas e
eu me senti como quem entra em uma casa antiga, morta de
vontade de abraçar um amigo e ele já partiu, lá para o outro
lado
do mundo... Não adie o desejo. Não deixe para - o depois.
Não
espere. As flores são pássaros que duram menos que uma
primavera, voam, e levam a luz comovida. Aquela luz que me
abduzia a cada vez que meus olhos bebiam o roxo violento dos
amores-perfeitos da Rua XV.
(Em Umuarama eu vi esta floreira no pátio abaixo da entrada
do SESC,
lembrei "meus" amores-perfeitos e fotografei.
Senti saudades das flores
da Rua XV lá longe, mas ainda vou lembrar sempre o roxo
esfuziante
que me sugava ,dia
desses encontrei uma fotografia e publiquei, mas, eu as queria perto, de perto,
como as via)Bárbara Lia
Domingo
Acordo e vejo que é domingo
Os pássaros cantam uma música diferente
Pego meu caderno
Escrevo um poema
Deito novamente
É domingo
Domingo tem outro cheiro
Penso nos meus pecados
Na minha culpa
E tenho certezaque não terei salvação
Paulo Monteiro
de Sanatório literário
A SAGA SÍRIA
A Menina Amina
Refugiada Síria
Sinto Falta
Da Vida
Sinto Falta
Dos Amigos
Sinto Falta
Dos Parentes
Sinto Falta
Do Marido
De Todo Mundo
Da Vida na Síria
Do Ar da Síria Do Ar na Síria
Da Respiração na Síria
Meu Coração Está na Síria
I Love Allah..Rodrigo d'Ávila Freitas
História de um grande amor
Ela chamava-se Geni, ele José. Ela, membro de tradicional
família piraiense, morava num sobrado na avenida principal da cidade; ele,
membro de uma família de imigrantes poloneses era morador na Colônia do
Bonsucesso.
Em meados do século passado, conheceram-se, identificaram-se
e se apaixonaram. Só que a família da moça não viu com bons olhos aquele namoro
e ela, criada nos mais rígidos princípios e obediente aos pais, fez José ver
que o seu amor era impossível. E ele, entendendo os seus motivos, afastou-se.
Passaram-se os anos: José casou-se com outra moça, teve
filhos e vivia em harmonia com a sua família. Geni continuou solteira e às
vezes, da janela do seu sobrado, via-o passar na rua defronte.
Um dia, no fim do século, José enviuvou, depois de um longo
tempo de feliz matrimônio. Então, quis o destino que ele e Geni se
reencontrassem e que a chama daquele amor antigo se reacendesse.
Depois de algum tempo de colóquio, resolveram se casar,
embora os dois já estivessem com média idade. Viveriam os seus últimos anos com
a felicidade que lhes fora negada outrora. Casaram-se e passaram a desfrutar de
uma convivência madura e feliz.
Mas, como muitas vezes ocorre, a sorte lhes pregou uma peça:
pouco, bem pouco tempo depois de casados, José estava retornando de sua chácara
em uma bicicleta. Numa rua de terra e bem acidentada, com um valo em uma das
suas laterais, o veículo derrapou e caiu com José dentro dele. Por
infelicidade, José bateu com a cabeça em uma pedra, vindo a falecer.
E Geni, privada mais uma vez daquela doce ventura, continuou
lá, nos seu sobrado.
George Abrão
A COR DO RIO
Decapitava a noite
seu frio mármore
estremecido de gozo
livre esvaía-me
na torrente do ego
que desdobrava
seu retorno em
palavras amarelas
de suas recordações.
Justifique-se a lua
de suas ordens....
recebi a aquarela
- não soube pintá-la
ou imitá-la –
já não percebia, em meu
sangue, o facínora que
habitou, a contragosto,
a força do ventre.
Com meu jogo de punhais
entardeci na tarde
a apontar as pontas sortidas
verdes azuis brancas
aonde fáceis e formas
espirravam-se ao redor
de projetos – outra etapa.
A liberdade, dizia-me,
desliza e não avisa
ergue-se a qualquer momento
vaidosa e ímpia e sozinha
impura na saga e na sede.
És feita. Assim como
se decora toda cartilha
toda mansa mal aceita
envergada inesperada
embrulhada e semente.
Os quadrantes são diversos
e light. Light? Sombra e Universo
Samba e Sândalo
torneio os espasmos
enviados ao além
Dispara
o sabre é a pistola
e prata e prata
verga ao destino
a vontade –
todavia indômita
por sobre o cálice.
Cisma a cínica das tuas farpas.
Os floreios do jardim
não são um porto,
nem é a voz o começo
do trajeto.
É só a ribanceira
aqui danada de insegura
na cor do rio a rudeza
de nossos desatinos.
Jandira Zanchi (Gume de Gueixa, Patuá, 2013)
quinta-feira, 15 de outubro de 2015
Poetas
poetas são magos
sonhadores soluçadores
transfiguram olhares em altares
subvertem flores em clamores serafins
de seus poemas são fiéis desenhadores
são corajosos amantes aviadores
nas asas do pensamento voam alto
não têm medo de altura
e muito menos
do asfalto
na alma
levam
o cosmo
em conjuntura
com sua leve loucura
desenham tudo em palavra
dos sentimentos cores lavram
e as derramam em léxica pintura
de seus versos são alfaiates
com a linha fina
da
emoção
doce e impuramente
ziguezagueiam
a costura
entre
razão
e
coração
tingem
o tecido opaco
de sua própria melancolia
no tom escarlate
de sua lírica
porém pobre
nobreza
poetas
servis sedutores
transformam o passado
e quaisquer futuras dores
em letras de beleza
e toda a infiel incerteza
no mais plausível
amor
Samantha B. S.
Resistência
o que me sustenta
sobre a carne e osso
é não ter aprendido a desistir
viver é voar
até sumir
(Livro Arbítrio, Lau Siqueira, Casa Verde, 2015)
Sacrificamos o sagrado que somos para que não percamos o
direito de tocar no bezerro de ouro que reflete nosso rosto distorcido pelo
fogo que consumo que consomes, o bezerro que fascina e disciplina, que seduz em
sua errônea luz.
Narcisos refletidos nos tornamos com alguns aplicativos de
mão dupla estarrecidos com a vertigem dos sentidos estabelecidos pela máquina
do estado distraído, sacrificamos o bom senso e os pássaros que gorjeiam suas
falas perecerão igual às cigarras devoradas pelas vozes no deserto.
Ricardo Pozzo
55
{Que imagem linda sempre foi imaginar o amor chegando,
imaginar como você seria, o que faria quando nós nos víssemos pela primeira
vez...}
Foi pela manhã. Foi uma manhã como qualquer outra dentro de
um ambiente interno; algumas janelas não abriram, outras não fecharam... Então
o ar era pleno, enchia pulmões, olhos e todo o ambiente em volta de sonhos
oxigenados. As cortinas, mal desenhadas para as suas devidas janelas, não
cobriam a realidade, a claridade do sol, quero dizer. Aquele sol que sempre
esteve lá desde que nascemos... Acho que devia ser mais ou menos umas nove
horas da manhã, talvez as horas fossem um pouco mais cedo ou bem mais tarde,
não sei dizer exatamente; só sei dizer que eram 55 minutos passados de alguma
hora entre o nascer do sol e a meia noite daquele mesmo instante.
{O sonho de amar é belo, a realidade de amar não; o amor
rasga a existência em um milhão de pedaços até você se perder de si mesmo em
tantos fragmentos.}
O eu olhou para o outro, o outro olhou para o eu. Eles se
viram sem querer. O tempo parou. O tempo brilhou de repente, assim como um
flash acontece pra uma fotografia. Então fiquei olhando, só olhando. O que mais
eu poderia fazer enquanto sentia aquilo? Acho que até perdi a memória e acabei
esquecendo meu nome... Na verdade acho que até me desencontrei de quem eu tinha
sido. Até o meu pensamento parou. É como se a única coisa que eu ouvisse fosse
silêncio. Não, não, acho que estava conseguindo ouvir as nossas almas
sussurrando segredos inimagináveis...
{O amor nunca foi belo; quando ele chega, devasta tudo, vem
se mostrando com toda a sua violência.}
E você ficou olhando e ouvindo meus silêncios. Seu olhar
pode ter durado anos, ou talvez precisamente 55 segundos daquela manhã, com
aquelas cortinas imprecisas, com aquelas janelas sem dono. E minha alma calada
sorriu pra você.
{O amor é um dolo; não, o amor é um tolo que precisa de
outro pra existir...}
E sua alma chorou de volta pra mim. E nós gargalhamos em
vibrações de baixa frequência; ninguém pode ler os nossos silêncios em voz alta
além de nós mesmos. Então conversamos em silêncio por quase meio século em uma
pequena fração de tempo, 55 segundos.
{O amor é inseguro, ele chega chorando e pedindo colo e
consolo com medo de morrer em um segundo...}
Então os segundos acabaram, as cortinas mal feitas foram
abertas, as janelas foram quebradas. A conversa acabou. Sobraram o oxigênio do
ar, a claridade daquele sol que sempre esteve lá desde que nascemos e nós; sim,
você e eu sobramos. Sobreviventes da indecência silenciosa.
{O amor chega a ser quase o mundo. O amor se finge de
morto...}
Se sobrar algum tempo depois do tempo, lembre-se de nós.
{O amor é mudo.}
Samantha B. S.
DIVINO É O PERDÃO
Divino é o perdão,
Gesto de amor bonito,
Nascido no coração,
Prece que ao céu emito.
Fruto de compaixão,
Se no Pai acredito.
Divino é o perdão,
Gesto de amor bonito.
Conferido sem distinção,
Rompendo o limite restrito
De um viver rente ao chão.
Se perdoo, a dor evito!
Divino é o perdão!
José Luiz de Sousa Santos, o JL Semeador de Poesias,
em agosto de 2008 -
Mais que perfeito...
Quisera vislumbrar o teu sorriso
qual quem um dia vira o Sol nascente
quando ilumina o mundo e a toda a gente
e é, sim, um brilho forte e assaz preciso...
Quisera por de lado todo o siso
que faz um bem enorme e diferente,
pois torna um só segundo, de repente,
em um milênio cheio e, enfim, conciso!
Mas foras tu embora muito cedo;
deixando uma saudade que avassala
e um grito de tristeza que me cala...
Pudera eu me livrar desse degredo
por perda que me assusta, oh! me da medo,
e ouvir de novo a tua doce fala...
Ronaldo Rhusso
segunda-feira, 12 de outubro de 2015
"Achei que ali seria construído um shopping!",
diz. "Colocar moradia popular vai facilitar a entrada de criminosos. A
mistura [de classes] aumenta a inveja."
Madame diz que a raça não melhora
Que a vida piora por causa do samba,
Madame diz o que samba tem pecado
Que o samba é coitado e devia acabar,
Madame diz que o samba tem cachaça, mistura de raça mistura
de cor,
Madame diz que o samba democrata, é música barata sem nenhum
valor,
Vamos acabar com o samba, madame não gosta que ninguém sambe
Vive dizendo que samba é vexame
Pra que discutir com madame.
Tiago Ferro
Jeferson Bandeira
A verdadeira literatura paranaense não esta na mídia, na
moda, na media, nas livrarias. A verdadeira literatura paranaense ocupa as
gavetas, quiça um dia apareça. A verdadeira literatura paranaense ocupa as
entrelinhas da verve daltoniana. A verdadeira literatura paranaense e
vampiriana. O que escapa disso não passa de arremedo. Essa pseudo-literatura
paranaense causa medo.
Lugar perfeito
Me arranque do mundo da lua!
Leve-me para qualquer parte...
Comer poeira em Marte?
Não respirar em Vênus?
Flutuar em Júpiter ou Netuno?
Me perder em Urano?
Congelar em Plutão?
Enlouquecer em Saturno?
Carbonizar-me de Sol em Mercúrio?
Não!!!
Que tal criar raízes na Terra?
(Angela Gomes)
Quantos cantos têm a mesa redonda?
E, com quantas gotas o mar forma uma onda?
O silêncio faz a noite adormecer?
E, quantos raios de sol são necessários
Para o dia amanhecer?
As respostas estão escondidas
Aonde o Gato não perdeu as botas
E o vento não fez a curva.
A rota é meio torta...
Mas, cai como uma luva!
Seguindo a imaginação,
Mesmo que por ruas estreitas,
Chega-se a qualquer resposta,
Até para as perguntas que
Ainda não foram feitas.
(Angela Gomes)
Borboletas
Não existe o esquecimento total: as pegadas impressas na
alma são indestrutíveis.
(Thomas De Quincey)
Após a convulsão de corpos, feitos estrelas e redemoinhos,
muito se perdeu: ou melhor: muito se deu por perdido: Um par de brincos não
localizado na escuridão e nem depois do acender de todas as possíveis luzes:
Perdidos ou escondendo-se. Imbuídos do desejo de poder decidir sobre seu
destino: Permanecer entre os lençóis, viciados de carícias e lascívia, tornados
portos de incineração da angústia. Borboletas: Pensei... As flores que voam
sempre povoam nossa imaginação. Pensei havê-las visto: estilizadas nas
femininas orelhas da mulher que amei. Ontem: Sexta-feira: Sepulcro da semana:
os encontrei: Um par de brincos: borboletas? Não: laçarotes com pedras
incrustadas. Adorno de um presente: o corpo dela amealhado a falta do meu.
Julio Urrutiaga Almada
do livro Caderno de Ontem
sábado, 10 de outubro de 2015
TEM
Vejo uma
tabela de
cores e
efêmera
no céu
inquieto
do meu
pensamento
e também
vejo no
céu de céu
a furtiva
exposição
quase Parkinson
quase tensa
quase tremida
pois o que é
veloz ultrapassa
o presente
quando apresenta
um não ao agora
e sim ao infinito.
Tem cor de pedra
e de terra as cores
se misturam em
matizes distintos
uma chama ametista
a outra atende
por ameixa
tem o púrpura
o quantum
e a orquídea.
Tem cor e céu
para toda a vida.
Marlos Degani
Fonte : Vidráguas
ONZE E POUCO
Onze e dezessete
e quase morma
quase silenciosa
a manhã se despede
um adeus para cada
nuvem cada tom
um adeus ao que
foi quase agora
o feixe luminoso
que rompeu a aurora.
Onze e vinte e dois.
Toda despedida
eu deixo pra depois.
Quero voltar a semear sol com chuva para colher arco-íris.
Rosa Pena
Anseio pela volta, mais ainda, volta e meia dos girassóis.
Juro que ainda vou ver o volver da Terra boa e rever o giro da flor que
paralisou de espanto diante de tantos sentimentos vis. Oceanos com ondas de
depressão jorravam dos olhos da Maysa quando cantava que seu mundo caiu. O meu
fica caidinho quando vejo fotos de crianças com fome e frio por conta das
coroas diabólicas dos reis de araque e babel, majestades da insensatez, da
arrogância, dos argumentos "estou certo", mas nenhum monarca de
sentimentos que queira dar chances às abelhas de produzirem mais mel para
adoçar esse mundo onde o lobo vale mais que a Chapeuzinho. A explosão de bombas
de fósforo provoca cegueira até no zangão, logo adeus aos favos e as ilusões.
Busco a romã fruta de início de ano que invoca os três reis magos que não eram
três, muito menos reis, apenas astrônomos que viram uma estrela que indicava
onde estava o menino que cada qual tem o direito de achar ou não que é o filho
de Deus, mas que não justifica essa vontade-carcará de pegar e matar.
Volto aos antigos magos que representavam as raças do mundo.
Branca, negra e amarela. Que mundo? O imundo. E as raças? Separadas pelas
crenças. As diferenças se curam com cápsula de Césio ou com cela solitária?
Amor e respeito é balela. Quando e onde foi o penúltimo parágrafo pontilhado de
sangue inocente? Quando será aquele que terá a honra de levar o ponto final?
Retorno às coroas feitas do argumento "tenho razão em
matar colônias de formigas". Elas não produzem ouro. E as abelhas? Apenas
mel. E o girassol? Apenas uma flor. E a romã? Apenas uma fruta. E o arco-íris?
Apenas um fenômeno ótico. E a estrela? Mais uma no céu. E o menino? Qualquer
criança sem esperança. E o carcará? Agora só falta “o come”. E a poesia? Não
falta nada. Some!
Rosa Pena
Fonte : ZUNÁI, REVISTA DE POESIA & DEBATES
LAVA JATO
Favos de mel rodeados de um mosquedo
Que cava e cava tal volume vivo
Nas costas do gigântico arvoredo:
De folha em folha vai abrindo um livro...
Sátiros, me esclareçam: é comédia
De um pré-texto em espera na coxia,
Ou é um ato pudente da tragédia
Que quase nos matou? E mataria!
Ó justa multidão que enruga a testa,
Cabe a alguém perguntar sobre a autoria,
Pois os favos sumiram da floresta!
Não temam, Donas Moscas, sai barato.
Já estão prontas as cartas de alforria.
Comecem a falar... Este é o trato!
Canoas,
outubro de 2015
Eliane Triska
EU... RIO!
Valham-me versos sinceros
Vem mostrar que a vida é um rio
Que nos leva a navegar
Porquê tudo o que eu quero
É vencer o desafio
De remar, remar, remar...
Venho das grotas das serras
Quebrei pedras, abri montes
Rasguei meu corpo no chão
Carrego o cheiro da terra
Procuro o meu horizonte
Sou ave de arribação
Quem quer matar sua sede
Procura seguir seu rumo
Sabendo onde quer chegar
Porquê nada lhe impede
De andar sempre no prumo
E assim, saber se guardar
Valham-me versos sinceros
Mostrem-me a trilha correta
De eu encontrar o meu mar
Porque o mar que eu quero
Não há fragata ou corveta
É o mar do verbo amar.
Geraldo Aguiar
As lembranças são como ventos de outono, levam as folhas que
caem.
As saudades prometemos mundos que já não existem,prometem um
tempo que está morrendo.
Ao te encontrar, me desfiz de tudo isso, desse tempo
monótono e lento e faço com que meus dias não se arrastem e nem se disformem
dos dedos do mundo, e não tenho lembranças do que não foi bom e nem as deixei
ocultas na minha alma.
Não tenho mais a face nublada, nem sorrisos ambíguos, nem
pedaços de sonhos esquecidos, e os vencido? Partiram todos rumo ao porvir de
uma antiga existência à procura do que nunca existiu.
E encontraram saída no regresso do que foi, o passado,amparado
pelos resquícios da memória...
Hoje, com teu amor, tenho os sonhos livres e realizados, os
braços abertos para a vida e a felicidade e na minha face, existe o sorriso das
pessoas felizes e devo a ti.
Dinorá Rosa Machado
Ser Poeta
Ser Poeta
Eu quero tudo,
A luz do Sol,
O brilho da lua,
E o manto das estrelas,
À noite, no seu lugar
A cintilar;
Eu quero tudo,
O verde viçoso das ervas,
As árvores despidas
E as folhas mortas,
Libertas, no ar
A esvoaçar.
Eu quero tudo,
A jovialidade dos anos,
Sem idade, o seu poder
Mais ao saber e à paz,
Dentro de mim,
A dominar.
Eu quero tudo,
Eu quero mesmo tudo,
Eu quero que a vida seja só,
Uma imensa Primavera, a passar
Porque esse é o querer do poeta,
Querer,
Querer só,
Apenas querer,
Querer, que em tudo
Haja agora só Primavera,
Uma Primavera, que se dá na vida
Com tudo sempre, apenas só, a desabrochar.
Miguel Almeida, “O Lugar das Coisas”, Esfera do Caos, 2012.
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