A vida não cabe no poema.
A vida é conta, desencontro, correria.
O poema, ora,
o poema são palavras no papel.
É verdade que palavras e papel
também são vida, ou melhor, fazem parte do que chamamos
vida, como pão, boleto, escola e menino de rua.
Que seria da escola sem o papel?
O boleto vem impresso aonde?
E o menino vai catar o quê para comprar o pão?
(Pão que, aliás, se compra com papel-moeda.)
Isso sem falar das palavras.
Com elas
posso pedir a conta
do bar
ou do lugar aonde trabalho.
Com elas
posso dizer te amo,
escrever teu nome,
ou te xingar filho-da-puta.
Mas apesar de tudo isso
– ou por causa exatamente disso –
a vida,
ah, a vida,
não cabe no poema.
A vida raramente rima,
quase nunca tem metro,
e amiúde desborda de qualquer papel.
O poema,
ao contrário,
é muito pequeno,
muito limitado é o poema,
ainda que epopeia.
Mas é com ele,
o poema
– este pobre artefato de palavras – ,
que eu intento reter a vida
ou
o que me resta dela depois que eu a perco.
Otto Leopoldo Winck
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