o amor foi feito para
a imperfeição, para o silêncio
entojado de som e fúria
e gentilezas.
o amor foi feito para errar,
dar com os burros n´água,
perder a paz
e odiar de um ódio patético
e gago.
o amor é assim: uma bomba
de delicadeza e desejo
que arrebenta nossas manias,
nossas veias mais grossas,
nossos relógios e bibelôs,
nossas fotografias antigas,
estudos, trabalho,
o passatempo mesquinho,
a conversa fiada e o futebol
(na hora do gol,
você pensa nela e olha além,
através do alambrado, buscando
a improbabilidade
do jasmim).
as vacas, em sua mansuetude,
não amam.
mas os homens...
“um grave acontecimento
na vida de um sujeito ordinário
naquela tarde como qualquer outra.”
o amor nos emburrece,
nos embrutece (cavalos doentes,
anjos idiotas),
como se não tivéssemos nunca
amado
e desamado, amado
e desamado.
o amor remoça
e envelhece dramaticamente.
a mulher pode dormir virgem
e acordar na menopausa.
o homem pode acordar
analfabeto e se deitar um poeta,
esbofeteado por asas.
no meio do sono,
eqüidistância perfeita
entre sonho e realidade,
o homem, a mulher
trazem abaixo
com uma serra de sândalo
a árvore genealógica.
e há quem defeque estrelas,
estupidificado de infinito.
e há quem não consiga,
um trapezista interior,
levantar o garfo até a boca
ou amarrar os cadarços.
quase tudo o que se viveu,
todas as lições e sobrevirtudes
esfarrapadas, como se amadurecer
fosse a antevéspera do podre
e da semente.
o amor não se cura.
fica incubado
esperando a primavera,
a próxima (sempre prima)
MENTIRA
ah como eu minto
pra você pra mim, meu amor!
o amor
o amor,
a desaprendizagem.
o amor
sem o qual a vida
seria uma verdade (como a morte).
© Rodrigo Madeira
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