Volto a um velho tema, a uma velha obsessão. A volta pra
casa. A volta pro lar. Depois de uma longa jornada. Depois de uma longa guerra.
Aí está Ulisses diante do lar. O portão está derruído. A velha casa em ruínas.
O mato cresce por toda parte. Nenhum sinal de Penélope. Nem Ulisses é o mesmo:
seus traços estão cansados, suas melenas longas e brancas. Não há quase nada do
velho guerreiro.
Assim é a vida: não há um porto seguro pra retornar. Tu
nunca voltarás à infância. O passado está enterrado. Os ponteiros do relógio só
andam pra frente. A areia da ampulheta não retornará nunca. E ainda que tu te
banhes no rio da memória, tu já não és o mesmo. E assim como o passado, que não
existe mais, o futuro também não existe -- não existe ainda ou não existirá
nunca. Um dia deixarei de atualizar esta página -- ou porque terei enchido o
saco desta rede social ou porque estarei morto. Sim, morrerei um dia. E este
dia pode ser amanhã. Basta atravessar a rua sem reparar no expresso que vem ou
contrair uma versão agressiva do covid... Tu também morrerás um dia, hipócrita
leitor (para parafrasear Baudelaire). E então o que temos? Temos só o agora, o
instante que corre -- e às vezes isso é suficiente para tornar uma vida
gloriosa. Ulisses, não olhes pra casa que foi. Construa uma casa de luz no dia
de hoje. Fomos feitos para este dia. E é glorioso estar vivo.
Otto Leopoldo Winck
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