Dentro de mim corre um rio
sem início e sem desfecho.
Se rle é largo ou se é fio,
não o sei, pois o desconheço.
Dentro de mim corre um rio.
Se ele aí sempre correu
ou se jamais existiu,
nunca o percebera eu.
Só sei que dentro de mim
serpeia este rio submerso,
não contido por confim,
que vem à tona em meu verso.
Rio de luas, rio de lendas,
de amazonas e sereias;
são oníricas as prendas
que me trazem suas cheias.
Meu passado e seus presentes,
meu tormento (na tormenta),
se me assomam nas correntes
que o seu dorso me apresenta.
Dorso negro aonde a lua
fincou esporas de prata
e qual linda índia nua
cavalga no seio da mata .
Rio de botos, jacarés
medos, mortos, anacondas,
que inunda os igarapés
engolindo-os com sua ondas.
Rio de iaras e de loucos,
de piranhas e de antas,
que me sorve, mas aos poucos,
por suas múltiplas gargantas.
Rio de grotas, pororocas,
banzos, sanhas, fêmeas prenhas,
que entre coxas, xotas, bocas,
me ensina em cifras e em senhas.
Quisera eu estancá-lo,
mesmo secá-lo.Não posso.
pois ao tentar aplacá-lo,
seu leito torna-se um fosso
no meio do qual me afundo,
em pânio me revolvo,
arrastado para o fundo
onde aos poucos me dissolvo.
Eu agora sou o rio:
baldo rio (longe o oceano)
e que tem por desafio
um jorrar não mais humano.
Rio escuro, tuvo rio,
de onde vens, para onde vais?
quando choro,quano rio,
para onde vão rios e ais?
Rio sem fonte , rio sem foz,
sem margens ou horizontes,
quando cessa, onde a voz,
se sobre o vão não há pontes?
Rio oculto, onde me levas?
se eu sou tu, se tu sou eu,
por que não sei (em tuas trevas
foi que outrora aconteceu
meu tortuoso despertar),
no âmago desse breu
de teu curso milenar,
qual meu nome, quem sou eu?
Otto Leopoldo Winck
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