segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

O RÁDIO E AS XÍCARAS


Eu e o fogo das constelações extintas há milênios
andamos entre o rádio e as xícaras do dia findo.
Dentro de mim, depois de tantas mortes,
o rádio adormece sob as águas do aquário.
Enquanto o fogo das constelações extintas há milênios
escuta bolero no rádio,
eu, para que a lâmina da morte me esqueça,
sorvo água de sereno das xícaras.
Dentro de mim, com a simplicidade silenciosa do wabi,
escuto, não o som, mas a imagem que tenho do som:
escuto, não a pedra, mas o nome mental da pedra.
Não há nada de rádio no som da palavra rádio,
não há nada de águas no som da palavra águas
não há nada de aquário no som da palavra aquário:
o rádio acorda sob as águas do aquário.


Texto de Fernando José Karl

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