segunda-feira, 29 de novembro de 2010
sexta-feira, 26 de novembro de 2010
quarta-feira, 24 de novembro de 2010
POEMA DO DUPLO VINCO ( UM EM CADA PERNA DA CALÇA) ESCOLAR
Se pensas que Andy
andou apenas nas ruas
por onde suas pernas carregavam
sua calça
convém saber
que nada morre
e ele anda
ao seu lado
na rua, no automóvel
na nave que corre o espaço
carregando os dez mais da Forbes
Tchau Andy
E Guimarães?
Pelo sertão,
pelo certo da diplomacia,
no avião,
no casamento,
no quarto,
nos quartos de um cavalo?
Olha que pode estar aí agora
vendo diante dos seus olhos
uma vitrine
Sua nota é sua para você
procure isto e isto
vá adiante
Quanto ao seu compromisso,
os resultados de seu exercício,
a aprovação de resultados:
procure o ponto aberto.
Maria José de Menezes
andou apenas nas ruas
por onde suas pernas carregavam
sua calça
convém saber
que nada morre
e ele anda
ao seu lado
na rua, no automóvel
na nave que corre o espaço
carregando os dez mais da Forbes
Tchau Andy
E Guimarães?
Pelo sertão,
pelo certo da diplomacia,
no avião,
no casamento,
no quarto,
nos quartos de um cavalo?
Olha que pode estar aí agora
vendo diante dos seus olhos
uma vitrine
Sua nota é sua para você
procure isto e isto
vá adiante
Quanto ao seu compromisso,
os resultados de seu exercício,
a aprovação de resultados:
procure o ponto aberto.
Maria José de Menezes
Fratura
O frio me fez desistir de entrar na fila para o show da cantora em queda triunfante."Pra onde vou?", reclamava sozinho .Vivia uma tormenta de ansiedade, queria chegar ao depois o tempo todo, o que se dava no ato me interessava cada dia assustadoramente menos. Então fui, pus-me a correr no parque glacial. E tanto que quebrei a perna . sentado numa súbita cadeira de rodas, observo o plantonista que me engessou limpando as mãos, óculos pendentes. Ali , invejei sua morna retidão. Uma fosforescência vazava do teto, baixava pela sala. Ninguém mais parecia perceber. O banho azulado me fazia esquecer...Até ele falar bem perto que eu já podia ir..."Hein?", respondi estremecendo, lançando sem querer um sumo de saliva em sua lente imaculada...
João Gilberto Noll. in Relâmpagos
terça-feira, 23 de novembro de 2010
A lei e a luz
A fé islâmica tem ensinamentos úteis.Cilene olhou para o marido."Sabia que lá não pode beber?Você já estaria preso, Wilsinho."O rapaz reagiu."E lá mulher fica de bico calado ."Cotidiano de atritos.Wilsinho ficava bebendo e fumando até de madrugada.Cilene mostrava a conta de luz."Culpa sua,de ficar acordado até tão tarde."Wilsinho comprou uma luminária a gás.Estava adormecendo quando viu uma fumacinha sair do primitivo artefato .Um gênio da lâmpada apareceu."Jihad,Wiltsinha.Derrotar a inimiga."Wilsinho se interessou."Bin Laden? És tu ?" Não teve resposta.Uma brasa do cigarro encostou no bico do gás.A explosão foi fatal .Cilene acha tudo merecido.Onde falta luz elétrica, o retrocesso é inevitável.
Voltaire de souza.in Vida Bandida
Pedido
Você vai pedir.Vai pedir peito, vai pedir prato, vai pedir emprego.Vai pedir arrego.Vai pedir beijo, um abraço, um aperto.Pedir que parem.Pedir que continuem.Pedir na frente.Pedir por trás.Vai pedir demais.Vai pedir de dia,vai pedir de tarde, vai pedir de noite.Vai ajoelhar por cima dos cacos da tua empáfia.Vai pedir pra a polícia.Vai pedir pra máfia.Pedir o que perde.Pedir o que ganha.Quando está quase pronto.Quando não faz diferença.Uma floresta de desejos pendurados no pescoço.Infinitas impossibilidades.Onde quer que se vá, você vai. Vai pedir . Uma depois da outra. Por dentro e por fora. E continuar pedindo.Vai pedir muito . Vai até pedir pra ser amado.Apesar de você.Vai pedir até morrer.
Fernando Bonassi.in Da Rua
domingo, 21 de novembro de 2010
sexta-feira, 19 de novembro de 2010
Capitu
Capitu
Nunca mais
olhos de ressaca
desejos, inconstâncias
nem sonhos pueris
em mim, esta lagoa rasa
afoga memórias
cuja profundidade
fazia valer o perigo.
que se guarde sempre:
para continuar vivendo -
viver!
Lúcia Gönczy
Nunca mais
olhos de ressaca
desejos, inconstâncias
nem sonhos pueris
em mim, esta lagoa rasa
afoga memórias
cuja profundidade
fazia valer o perigo.
que se guarde sempre:
para continuar vivendo -
viver!
Lúcia Gönczy
"Eu triste sou calada
Eu brava sou estúpida
Eu lúcida sou chata
Eu gata sou esperta
Eu cega sou vidente
Eu carente sou insana
Eu malandra sou fresca
Eu seca sou vazia
Eu fria sou distante
Eu quente sou oleosa
Eu prosa sou tantas
Eu santa sou gelada
Eu salgada sou crua
Eu pura sou tentada
Eu sentada sou alta
Eu jovem sou donzela
Eu bela sou fútil
Eu útil sou boa
Eu à toa sou tua".
Martha Medeiros
Eu brava sou estúpida
Eu lúcida sou chata
Eu gata sou esperta
Eu cega sou vidente
Eu carente sou insana
Eu malandra sou fresca
Eu seca sou vazia
Eu fria sou distante
Eu quente sou oleosa
Eu prosa sou tantas
Eu santa sou gelada
Eu salgada sou crua
Eu pura sou tentada
Eu sentada sou alta
Eu jovem sou donzela
Eu bela sou fútil
Eu útil sou boa
Eu à toa sou tua".
Martha Medeiros
[In] Confissão
Continuo escrevendo pra você...
certo que, bem menos.
menos tempo
menos entusiasmo
menos amor
mais cansaço.
Entretanto, conservo-o
vivo e quente na memória
da pele, do cheiro, do tato.
Certo...
Cada vez menos reticências,
carências e síndromes de abstinências-
que ratificam a espera impugnada;
os laços em nós, desatados.
Não sinto mais ausência nem
dor;
Só apuro os fatos, e ...sem querer,
novamente me delato:
Sim, eu ainda te amo!
Lúcia Gönczy
certo que, bem menos.
menos tempo
menos entusiasmo
menos amor
mais cansaço.
Entretanto, conservo-o
vivo e quente na memória
da pele, do cheiro, do tato.
Certo...
Cada vez menos reticências,
carências e síndromes de abstinências-
que ratificam a espera impugnada;
os laços em nós, desatados.
Não sinto mais ausência nem
dor;
Só apuro os fatos, e ...sem querer,
novamente me delato:
Sim, eu ainda te amo!
Lúcia Gönczy
segunda-feira, 15 de novembro de 2010
O Buda do café
Quer dizer que, se você consegue dormir, acaba sonhando com parentes e cachorros mortos, e que , por mais que você trabalhe, nunca se sente recompensado, e o que você anda botando pra dentro nem faz mais "aquele puta efeito ", que as mulheres não andam lá essas coisas, e que os jornais vão se apinhando intocados, que você gasta dinheiro sem querer ,seu carro vive ficando sem gasolina, e você não pode doar sangue porque desmaia, e que isso é rídiculo nalguém como você...que você tropeça com facilidade, encosta em porta suja de graxa, e amizade também não é mais o que era na vida das pessoas, e que o próprio deus "tira o chão" quando você ajoelha pra rezar? Eu me contentaria com um café bem feito.
Fernando Bonassi. in Da Rua
Miragens
Ele me seguia.Não era um perseguidor dos desocupados.Não, não se tratava desses que vão no encalço dos que costumam sair por aí tirando uma força do descaso , outra das artérias...Ele me seguia para farejar na moita a "andreja rotina " do meu ofício encoberto".Precisava ilustrar o que as rodas de excedentes identificavam como "verve furtiva da vadiagem".Escrevia "Arcos de Ascese", livro sobre "surdas dissidências, em apenas sete curtas rondas ".No parque Farroupilha, vi sua mancha entre ramagens.Deitei na grama."A estátua que me escondia/por pouco não se vertia/ por seu cântaro quebrado."Ouvia no radinho:"Vencer as horas/ e com tal melancolia/ é façanha de arenosa sudorese". Quem cantava já não lembro.Lembro de uns olhos fixos, calados...
João Gilberto Noll.in Relâmpagos
Máscara de barro
Ressucitei quantas genealogias,
tive já quantos nomes,
quantas alturas, quantas infâncias ?
Fui já algo como máscara de barro
já ouvi a água e sentia terra,
escutei as vozes se misturarem.
Estive presente quando àtua morte
e velamos teus restos,
queimamos teus ossos,
comemos teupó que em mim estará.
Hoje, quando me deito,
quando me deixo, e fico, e digo:
CONSUMI-ME !
homens com carne nos dentes,
homens com almas nos olhos ,
homens com enfeites de pena,
homens com palha e palhoça.
Consumi-me que haverei de consumi-los
em outras bocas,
em outros pratos,
em outra festa,
na mesma lua antes da chuva.
Seremos corpos em corpos,
estaremos únicos.
Fausto Rogério Amadigi
O Grito.n4.1999.
tive já quantos nomes,
quantas alturas, quantas infâncias ?
Fui já algo como máscara de barro
já ouvi a água e sentia terra,
escutei as vozes se misturarem.
Estive presente quando àtua morte
e velamos teus restos,
queimamos teus ossos,
comemos teupó que em mim estará.
Hoje, quando me deito,
quando me deixo, e fico, e digo:
CONSUMI-ME !
homens com carne nos dentes,
homens com almas nos olhos ,
homens com enfeites de pena,
homens com palha e palhoça.
Consumi-me que haverei de consumi-los
em outras bocas,
em outros pratos,
em outra festa,
na mesma lua antes da chuva.
Seremos corpos em corpos,
estaremos únicos.
Fausto Rogério Amadigi
O Grito.n4.1999.
Elogio do prazer (fr. 1 W)
O que é a vida? O que é o prazer, sem a dourada Afrodite?
Que eu morra, quando estas coisas já não me interessarem:
o amor secreto, as suaves ofertas e a cama,
que são flores da juventude sedutoras
para homens e mulheres. Mas quando chega a dolorosa
velhice, que faz até do homem belo um homem repulsivo,
tristes preocupações sempre lhe moem os pensamentos
e já não sente prazer em contemplar a luz do sol,
mas é odiado pelos rapazes e desonrado pelas mulheres.
Assim áspera foi a velhice que o deus impôs.
Mimnermo. Poesia Grega de Álcman a Teócrito. Organização, tradução e notas Frederico Lourenço,Livros Cotovia, Lisboa, 2006 p.31
O que é a vida? O que é o prazer, sem a dourada Afrodite?
Que eu morra, quando estas coisas já não me interessarem:
o amor secreto, as suaves ofertas e a cama,
que são flores da juventude sedutoras
para homens e mulheres. Mas quando chega a dolorosa
velhice, que faz até do homem belo um homem repulsivo,
tristes preocupações sempre lhe moem os pensamentos
e já não sente prazer em contemplar a luz do sol,
mas é odiado pelos rapazes e desonrado pelas mulheres.
Assim áspera foi a velhice que o deus impôs.
Mimnermo. Poesia Grega de Álcman a Teócrito. Organização, tradução e notas Frederico Lourenço,Livros Cotovia, Lisboa, 2006 p.31
domingo, 14 de novembro de 2010
O passo de prata
Apoiou-se no cabo do guarda chuva para se firmar melhor. Esperava o ônibus...Já sentado, apertou a perna direita. Desceu, o guarda- chuva feito bengala. Seguia uma linha imaginária para não cair na rua vazia. Sob o subúrbio descia uma noite precoce,um prenúncio de tormenta no meio da tarde. Entrou no terreno baldio. ao longe, uma voz cantava bêbada.Sorriu,disfarçando a tentação de desistir do que fora fazer ali. Mas reagiu, arregaçou a calça e olhou a perna sem pudor, pela primeira vez a céu aberto : a engrenagem de aço, da coxa ao pé, no tom carregado do céu, logo recebeu os pingos que começavam a se alastrar.era o primeiro passeio da perna mecânica. Abriu os braços com instinto jovial. E deixou-se ficar na tempestade, convalescendo mais e mais...
João Gilberto Noll. in Relâmpagos
Paisagem noturna
Sábado à noite a cidade pròspera luzindo ao fundo, como pequenas fogueiras (não esqueçamos: o inferno é aqui).Todos os bares escusos são perigosos. Escuro pra se divertir enforcando um gato, estourando uma luz de mercúrio. Fugindo dos camburões que brincam de tiro ao alvo. Cada um se segura num emprego, descola alguma coisa pra vender : fichas telefônicas ,roupas dando sopa nos varais,Opalas 79.Algo pra fumar,pra beber até cair de qualquer altura.Dando voltas no próprio rabo.segunda- feira ainda é apenas fumaça.Ninguém pensa que vai morrer.Ninguém pensa que vai sobrar.
Fernando Bonassi.in Da Rua.
sábado, 13 de novembro de 2010
Voltar a cantar
voltar a cantar o que é claro
com um verso muito claro.
Voltar a falar do que é simples
como quem se sabe simples.
Voltar a rimar a palavra
consoante outra palavra.
Voltar a medir uma estima
com o metro de outra estima.
Voltar a dizer com a boca
o que quer a tua boca.
Voltar a saber de ouvido
o que soa em todo ouvido.
Voltar a sentir o de sempre
porque nada é para sempre.
Voltar a viver o que vive
porque belo é quanto vive.
marcelo Sandmann
com um verso muito claro.
Voltar a falar do que é simples
como quem se sabe simples.
Voltar a rimar a palavra
consoante outra palavra.
Voltar a medir uma estima
com o metro de outra estima.
Voltar a dizer com a boca
o que quer a tua boca.
Voltar a saber de ouvido
o que soa em todo ouvido.
Voltar a sentir o de sempre
porque nada é para sempre.
Voltar a viver o que vive
porque belo é quanto vive.
marcelo Sandmann
"Ouça o povo a cantar
dentro da noite o seu refrão
Eis a canção de todo um povo
Que atravessa a escuridão
Como a chama que acendeu
E que jamais vai se apagar
Sombras da noite vão sumir
Quando o sol raiar
Vão viver em liberdade
Pelos pátios do Senhor
Caminhar por entre as flores
Sem as facas do terror
Correntes quebradas
E todos terão seu valor . "
Trecho de canção sem-título de Claude Michel Schönberg em "Les Misérables ",versão de Cláudio Botelho
dentro da noite o seu refrão
Eis a canção de todo um povo
Que atravessa a escuridão
Como a chama que acendeu
E que jamais vai se apagar
Sombras da noite vão sumir
Quando o sol raiar
Vão viver em liberdade
Pelos pátios do Senhor
Caminhar por entre as flores
Sem as facas do terror
Correntes quebradas
E todos terão seu valor . "
Trecho de canção sem-título de Claude Michel Schönberg em "Les Misérables ",versão de Cláudio Botelho
Rima louca
Ah! rima louca
de estrada com amor
de nada com bobagem
de figura com saudade
de amargura com mel
Ah!rima louca
de eco com coração
de afeto com prazer
de estória em movimento
de trajetória em vida.
Márcia de Assis Cardoso
de estrada com amor
de nada com bobagem
de figura com saudade
de amargura com mel
Ah!rima louca
de eco com coração
de afeto com prazer
de estória em movimento
de trajetória em vida.
Márcia de Assis Cardoso
Quem entrega o corpo
Quem entrega o corpo à sorte
sabe sorver a inquietude,
sabe que nada é muito forte,
favo de vício ou virtude.
Quem entrega o corpo à arte
sabe o sabor de um martírio,
sabe que a alma nunca parte,
sempre aqui o seu retiro.
Quem entrega o corpo à vida
sabe beber da beleza,
sabe a reza comovida
nun rosário de incerteza.
Quem entrega o corpo à morte
sabe seguir o seu signo,
sabe que nada impede o corte,
último único desígnio.
Marcelo Sandmann
sabe sorver a inquietude,
sabe que nada é muito forte,
favo de vício ou virtude.
Quem entrega o corpo à arte
sabe o sabor de um martírio,
sabe que a alma nunca parte,
sempre aqui o seu retiro.
Quem entrega o corpo à vida
sabe beber da beleza,
sabe a reza comovida
nun rosário de incerteza.
Quem entrega o corpo à morte
sabe seguir o seu signo,
sabe que nada impede o corte,
último único desígnio.
Marcelo Sandmann
terça-feira, 9 de novembro de 2010
Os bêbados
Pra dizer a verdade, mais era ela...gostava da tontura!Nunca ligou pra enjôo.Tomava naqueles cálices com um dedinho apontando pra mim.Dezenas deles.Coisa bonita aquele dedinho.Tinha esmalte marrom.Tinha carne rosinha .Nisso eu tomava também.Tomava de copo.Um dia o cálice quebrou e lá foi ela direto na garrafa .A gente nunca parava.Quando via já se estava acordando com um peso na cabeça.Até que um dia ela não acordou mais...e fim.Dali pouco mudou.Tudo que se traz pra casa ainda é de beber.Salários saindo no xixi.Qualquer hora dessas eu também me quebro.Corpo é troço que se estraga.Por isso, na minha hora,quero é estar bem tomado.Pra ser leve.Não tenho mais saco pra dor.
Fernando Bonassi.in Da Rua
Fugindo do calor
Verão forte na cidade .ari vendia coisa no farol.Tirou a camisa.Mostrou um torso de atleta.Dentro do Monza, a bela morena Nádia reparou."Hummm...gostei."Convidou Ari para entrar."vem dar um passeio."Foram parar num motel da Raposo.Ari se interessou."tem piscina?"Deu um mergulho .Nádia ficou esperando."E aí ,não vem me amar?"Ari fez que não."No calor prefiro uma piscininha."Na raiva,Nádia cortou-lhe o pescoço com um canivete."Vai para o IML.Que lá tem ar condicionado."Do interesse mesquinho dificilmente nasce um grande amor.
Voltaire de Souza.in Vida Bandida
Beijo na seda
Ela estava ali,à procura de uma cadeira para comprar, rondando como sempre meio tonta em busca do utensílio que a pudesse remediar a tempo, mesmo que não soubesse exatamente o que significava ser remediada a tempo-aliás, as palavras iam perdendo pouco a pouco a transparência que seu pai recomendava :"A frase deve assoprar a névoa que confunde para que possa haver verdadeiro alívio à noite: a cabeça enfim no travesseiro,já quase divorciada do verbo ,até que a claridade traga mais uma vez as sílabas,essas operárias das idéias,transações, freios."Num súbito,ela se sentou.De surpresa,beijou o forro adamascado do espaldar como se ela fosse um instinto sem a capa da epiderme,pura flora de nervos,voraz .Uma criança a observa com tenacidade.Feliz...
João Gilberto Noll.in Relâmpagos
Fôlegos
Antes que escurecesse, era preciso dar a caminhada.Desceu as escadas com uma gana maior do que seu corpo permitia.Parou.Se impulsionou de novo.Entre árvores do parque,vultos se procuravam afoitos, se contorciam.Ele se impôs maior velocidade, definiu o ritmo com mais precisão.Marchava incólume como um verdadeiro atleta.Notou uma mulher, já de certa idade, abraçada a um tronco.Parecia querer captar uma pulsação ilegível.Ele parou.Escolheu uma árvore .Abraçou-a.Viu que a mulher mexia os lábios.Fez o mesmo.Olhavam-se .A poucos passos um do outro.
João Gilberto Noll.in Relâmpagos
segunda-feira, 8 de novembro de 2010
A nossa casa
ascender as luzes, eu acendo.Todas. Ligar a TV, é assim que entro.Deixo até CD tocando no aparelho.Sem volume.Mais pra ver as luzes escorregando no ritmo. Todas roxinhas...já vitamina eu faço mesmo é no liquidificador.Às vezes boto gelo.Um escândalo.E eu nem falei do despertador, da impressora, da gaita que você meu deu em 83, da panela de pressão...Mas o que acaba comigo de verdade são essas violetas mortas que não jogo fora.e a poeira que aveluda as coisas. E a gordura que as faz brilhar. e as teias de aranha...Tudo isso que fizemos da nossa casa.
Fernando Bonassi.in Da Rua
A verdade
A mãe de Deonilson recebeu uma carta dele dois dias depois de um telegrama informando "seu falecimento ".No ano em que Deonilson sumiu, disse que iria arranjar a vida de uma vez e prometeu voltar quando tivesse a chave de um sobradinho pra família.Logo depois a mãe só podia visitá-lo uma vez por semana , com uma mesa atravessada entre os dois .Na carta, ele pedia para não ser esquecido nunca e que , por mais que "falassem dele ", pedia que ela acreditasse somente nas suas palavras.Mesmo assim, a mãe de Deonilson chorou por cima do telegrama.Então, claro,rnasceu com a carta.Por força dessas coisas, até a próxima visita, ela vai ficar assim: querendo saber a verdade da boca do próprio filho.
Fernando Bonassi.in Da Rua
Brasa dormida
A tecnologia avança.Mas devemos respeitar os valores do passado.Fred tinha uma coleção de discos de vinil.Curtia a jovem guarda.Noite de sexta.A vitrola no máximo."Quero que você me aqueça neste invé-ée-rno..."Do apartamento de cima, a reclamação.O sr. Barreto queria dormir.A resposta de Fred não foi de paz.Com um sopapo no aposentado, garantiu sua liberdade de expressão.depois, o sono.A visão estranha. O presidente Costa e Silva descia de um disco voador. Usava uma roupa prateada."Chega dessa baderna." No sonho, Fred reagia com uma pistola laser.Tentava torrar o marechal.Acordou com o apê em chamas.O cobertor elétrico entrara em curto.O vinil derretia, como os sonhos.Aconteça o que acontecer, estamos sempre indo para a frente.
Voltaire de Souza.in Vida Bandida
A conquista
Ah,era tanto, e Zé em tão pouco.se começasse cedo, antes do sol, talvez pudesse dar conta de um mínimo até o fim da tarde.Mas não , até que acordasse, conseguisse se levantar, abrir o chuveiro e se levantar , abrir o chuveiro e se dispor a conquistar a urgência da manhã...Queria, sim, o que o vizinho de corredor acolhia a cada despertar feito um ultimato sabe-se lá de onde , até voltar à noite ao seu apartamento ao lado, com a carne moída para os gatos, todos em volta dele ,rabo em pé,miando como no final dos tempos.Ah, era tanto, e Zé em tão pouco. sentou-se na cama um pouco excitado, como se tivesse toda duração do mundo para se distrair com sexo.Mas agora decidiu, desceu correndo as escadas. E diante do porteiro perguntou,perguntou o quê? ,ah ,"Que dia é,hein ? ".
João Gilberto Noll. in Relâmpagos.
domingo, 7 de novembro de 2010
No camarim
O mundo fashion volta a ferver.Mas a modelo Juju Santoro sentia frio no camarim."Não dá para ligar um aquecedor elétrico?"O promoter Tuko de Abreu olhou-a com desprezo."Ainda não caiu na real Juju?"Tuko foi professoral."Ra-cio-na-men-to."Juju se esfregava."me dá um chocolate então."Tuko moveu o indicador."Na-na-não.Muita caloria.Sua flácida."A música do desfile era animada.Juju ia ficando azul.O contra regra Lourival se aproximou."Quer o meu casaco?"Juju quis mais."Tua roupa toda."O sexo rolou numa boa.Na hora do desfile,Juju se vestiu as pressas.Usando o macacão de Lourival.Hoje o rapaz é um respeitado estilista.E Juju vive cem graus de paixão.Não se raciona afeto nem carinho.
Voltaire de Sousa.in Vida Bandida
Qualquer um
Irineu nasceu de cinco meses e nunca engatinhou.Andar, só depois dos três anos .Um dia,de repente .Gaguejou até os doze e , mesmo nessa época, ainda mamava.Em pé,diante dos peitos escancarados da mãe orgulhosa.Na escola quebrou braços e pernas.Soltava pum durante o Hino Nacional,derrubava merenda no uniforme e não entendia as vantagens de beijar de língua.Todos fugiam dele:marcava gol contra, tinha mau hálito e não decorava quem descobriu o Brasil.Ninguém dava um tostão por Irineu.No entanto, nada de esquisito aconteceu com ele .Provavelmente porque não entendia o que era "aquele lugar "onde, vira e mexe , o mandavam tomar.No fim, chegou até aqui, como qualquer um de nós.
Fernando Bonassi.in Da Rua
sábado, 6 de novembro de 2010
quinta-feira, 4 de novembro de 2010
Helena em londres
Há sempre alguém na redondeza batendo com o martelo.Um conserto,uma reforma?Sei que o som de descabelada utilidade conturba minha espera.
De um telefonema de uma filha.Está em Londres, conhecendo o homem com quem se casará em maio.Maio, sempre maio, enquanto eu aqui noto que o sol consome o tapete e que minha saia se esfarinha com o injusto martelar.Quando Elena liga, contando que tem um tarado a perseguiondo no parque de "Blow Up",sou eu que me desmancho atropelada pelos fatos.Passo meu resto na memória da pele...da gengiva.
João Gilberto Noll. in Relâmpagos
De um telefonema de uma filha.Está em Londres, conhecendo o homem com quem se casará em maio.Maio, sempre maio, enquanto eu aqui noto que o sol consome o tapete e que minha saia se esfarinha com o injusto martelar.Quando Elena liga, contando que tem um tarado a perseguiondo no parque de "Blow Up",sou eu que me desmancho atropelada pelos fatos.Passo meu resto na memória da pele...da gengiva.
João Gilberto Noll. in Relâmpagos
Aviso do além
A vida conjugal exige respeito e compreensão.Eliano andava muito irritado.Sua mulher se chamava Irís e começou a ter mania de espiritismo.Às quartas- feiras ,reunia um grupo e recebia mensagens do Além."Cretinice ".Irís reagia mal às críticas."Cretino é voce Eliano.Materialista .E gordão."Naquela noite ,Irís ouviu claramente de um espírito a previsão."seu marido vai morrer.Gordura no sangue."Íris avisou Eliano.Ele riu."Que venha a morte!Que eu morro já! "O ódio fez Íris pegar uma faca engordurada na cozinha.Matou o marido no coração. Na dúvida é melhor acreditar.
Voltaire de Souza.in Vida Bandida
Voltaire de Souza.in Vida Bandida
terça-feira, 2 de novembro de 2010
Nascidos
Filhos sem pais,
filhos do acaso,
filhos do mundo...
Seres humanos famintos
de arroz, feijão,de afeto,
de afago, de alguém que lhes d~e carinho.
Olhos brilhantes de águas
paradas no tempo que se foi,
outrora eram mais felizes ?
Ninguém sabe quem são esses
andarilhos, crianças descalças,
vozinhas solitárias,mãos trêmulas
pedindo esmolas.
Filhos,apenas filhos de Deus,
que procuram algo que lhes motivem a viver...
Esperança , sonhos, vontade,
coragem de enfrentar um novo amanhecer.
Filhos sem pais,
Filhos do acaso,
Filhos do mundo...
Apenas filhos, filhos de Deus.
Adriane M. de Assis
filhos do acaso,
filhos do mundo...
Seres humanos famintos
de arroz, feijão,de afeto,
de afago, de alguém que lhes d~e carinho.
Olhos brilhantes de águas
paradas no tempo que se foi,
outrora eram mais felizes ?
Ninguém sabe quem são esses
andarilhos, crianças descalças,
vozinhas solitárias,mãos trêmulas
pedindo esmolas.
Filhos,apenas filhos de Deus,
que procuram algo que lhes motivem a viver...
Esperança , sonhos, vontade,
coragem de enfrentar um novo amanhecer.
Filhos sem pais,
Filhos do acaso,
Filhos do mundo...
Apenas filhos, filhos de Deus.
Adriane M. de Assis
Cidade Mãe
Eu sei, já estamos separadas a alguns anos
Mas não consigo deixar de pensar em ti.
Sou como um bebê ao nascer
Quando em prantos é separado
do corpo da mãe.
Arrancaram-me do teu ventre
Roubaram-me o teu chão,
Privaram-me das tuas belezas,
Das tuas gentes.
Que saudade sinto dessa gente amiga !
Ontem, eu era sua criança
que passeava descalça nas ruas,
que balançava nas suas praças,
que contemplava teu céu.
E certo é, ninguém tem esse céu !
Ontem, eu era sua menina-moça
Buscava olhares cobiçosos na XV.
Sentia o vento cortante das manhãs de outono
E me encontrava com outras no muro do Normal.
Abro os olhos hoje, não sou mais menina
Forço o olhar e não estou mais aí
Então, fecho novamente os olhos...
É inútil !
Continuo aqui...Longe de ti
Cassiana Helena Guillen Cavarsan
Mas não consigo deixar de pensar em ti.
Sou como um bebê ao nascer
Quando em prantos é separado
do corpo da mãe.
Arrancaram-me do teu ventre
Roubaram-me o teu chão,
Privaram-me das tuas belezas,
Das tuas gentes.
Que saudade sinto dessa gente amiga !
Ontem, eu era sua criança
que passeava descalça nas ruas,
que balançava nas suas praças,
que contemplava teu céu.
E certo é, ninguém tem esse céu !
Ontem, eu era sua menina-moça
Buscava olhares cobiçosos na XV.
Sentia o vento cortante das manhãs de outono
E me encontrava com outras no muro do Normal.
Abro os olhos hoje, não sou mais menina
Forço o olhar e não estou mais aí
Então, fecho novamente os olhos...
É inútil !
Continuo aqui...Longe de ti
Cassiana Helena Guillen Cavarsan
Morto
Morto !
Estou morto!
E isto trás para perto
O desespero, o medo,
E a curiosidade dos que me velam.
Faço uma festa triste.
Deixo saudades,
Fico com a saudade,
E promovo encontros raros.
Mostro crença a ateus,
E dúvida a cristãos.
Para uns sou algo podre,
Para outros a redenção,
Agora enterrado,
Não vejo mais a luz.
Não sinto mais a luz.
Faço parte do passado.
Sou atacado por vermes.
Estou morto.
Sou fruto decompondo
Na terra, a qual fecundo.
Inexorável transformação
Do que outrora um dia fui.
Sou ser orgânico,
Puxado com a seiva,
Misturado ao adubo.
atravesso as castas deste mundo.
Mais do que isso, indubitavelmente,
volto a ver a luz
Através de meus olhos
Fotossintéticos.
Livre,
Salto pelo ar
Em átomos
Múltiplos.
Não sou mais um,
sou vário,
Misturado aos outros átomos.
Disperso,
Flutuo,
Dissolvo.
Vivo em tudo,
Vivo em todos,
Vivo em você.
Lindomar de Oliveira
Estou morto!
E isto trás para perto
O desespero, o medo,
E a curiosidade dos que me velam.
Faço uma festa triste.
Deixo saudades,
Fico com a saudade,
E promovo encontros raros.
Mostro crença a ateus,
E dúvida a cristãos.
Para uns sou algo podre,
Para outros a redenção,
Agora enterrado,
Não vejo mais a luz.
Não sinto mais a luz.
Faço parte do passado.
Sou atacado por vermes.
Estou morto.
Sou fruto decompondo
Na terra, a qual fecundo.
Inexorável transformação
Do que outrora um dia fui.
Sou ser orgânico,
Puxado com a seiva,
Misturado ao adubo.
atravesso as castas deste mundo.
Mais do que isso, indubitavelmente,
volto a ver a luz
Através de meus olhos
Fotossintéticos.
Livre,
Salto pelo ar
Em átomos
Múltiplos.
Não sou mais um,
sou vário,
Misturado aos outros átomos.
Disperso,
Flutuo,
Dissolvo.
Vivo em tudo,
Vivo em todos,
Vivo em você.
Lindomar de Oliveira
Esse tal meu coração,
tem alvura das paredes
a dureza das paredes
e é oco feito as tais.
Numas lisas fiz furinho,
ao pregar as minhas horas
vi seu sangue cor de tijolo,
tão sequinho esparramar.
Brocas fazem vis buracos,
e é tanta parede sofrendo...
...a viver de tic tacs.
Tempo, dizem : - tudo cura.
Mas não ,
na tapa as paredes.
Juliano Augusto Alves Furtado
tem alvura das paredes
a dureza das paredes
e é oco feito as tais.
Numas lisas fiz furinho,
ao pregar as minhas horas
vi seu sangue cor de tijolo,
tão sequinho esparramar.
Brocas fazem vis buracos,
e é tanta parede sofrendo...
...a viver de tic tacs.
Tempo, dizem : - tudo cura.
Mas não ,
na tapa as paredes.
Juliano Augusto Alves Furtado
Assinar:
Postagens (Atom)