A Cascais, uma vez e nunca mais
Luciano André Santos Seabra nasceu em Lisboa no
primeiro dia de setembro de 1997. Quem vir o calendário confirmará que foi
segunda-feira. Ele era o segundo filho na sua família e o seu irmão-mor,
Agnaldo, já tinha 11 anos.
Crescendo Luciano, os pais dele pediam Agnaldo que ele
ajudasse Luciano na creche, depois, nos deveres da escola. Como, apesar da
ajuda, Luciano não tinha sucessos marcantes nos estudos, ao contrário do seu
irmão-mor, este ficava chateado cada dia mais e, explicando milhares de vezes
as coisas simples ao seu irmão menor sem resultado, repetia: “Morre”.
Durante tanto tempo, Luciano era um aluno “mediano” da
turma. Nas tabelas da qualidade do desempenho dos alunos, ele ocupava
exatamente o lugar “equatorial”, décimo quinto entre os trinta alunos e assim
durava até o ano letivo 2011-2012, em que ele de repente “subiu”, sentindo
vontade de estudar, de conhecer, de aprender, de averiguar. Passadas as provas
finais do nono ano, os pais dele resolveram ir a Cascais, passar lá na praia
umas duas semanas e levaram-no consigo, o que antes nunca fizeram.
E tudo lá começou bem, eles passavam ótimos dias,
tomando banho do Oceano Atlântico e das piscinas do hotel em que ficavam e
passariam assim ambas as semanas da estada, mas...
Javid Arezani nasceu aos 28 de junho de 1980 na cidade
de Bandar-e Anzali, no norte do Irã. As janelas da casa, em que morava a
família dele, davam para o Mar Cáspio, um dos poucos “mares” que não são.
Terminada a escola, entrou no curso de medicina num dos institutos médicos da
Rússia, mas foi expulso, não tendo passado as provas de segundo ano.
Expulso, entrou no curso de medicina numa universidade
privada italiana, cujo nome não merece ser mencionado em qualquer publicação.
Concluso o curso, já tendo a cidadania italiana, pôs-se a trabalhar num dos
hospitais de Cascais.
Foi ali que trouxeram Luciano que tinha dor na parte
inferior da sua barriga. Sendo-lhe feita a pergunta sobre o que causara aquela
dor, ele não respondeu, mas disse que comera umas uvas com caroços, pensando
que não os tinha dentro. Os métodos da detecção diferencial de doenças fizeram
com que o conselho médico inferisse que a doença que causara a dor foi
apendicite. Quem foi mandado fazer operação foi Javid.
A operação correu com êxito e, feita ela, foram
costuradas as partes da pele e Luciano já ia para casa, mas, já se sentando no
carro, sentiu uma dor fortíssima na mesma parte do corpo e, dando um ai, de
repente ficou pálido e, trazido de novo para hospital, tombou morto.
A causa da morte foi a hemorragia interna, cujo porquê
vou explicar. Depois da operação e antes de costurar a pele, o médico
italiano-iraniano esqueceu-se de levar do corpo algumas ferramentas, usadas
durante a operação, inclusive uma pinça miúda. Esta causou pressão ao
intestino, rompendo-o e as veias circunvizinhas. O sangue saiu destas,
misturou-se com o conteúdo, saliente do intestino, causando assim a morte.
Luciano foi enterrado aos 3 de julho de 2012, num dos
cemitérios de Lisboa. Ele morreu, mas se realizou o desejo que Agnaldo
expressava muitas vezes, confirmando-se assim a expressão “tenha medo dos seus
desejos, pois eles podem tornar-se realidade”. Outra expressão a realizar-se
foi ligada com a cidade de Cascais, aonde usualmente se ia uma vez por vida
inteira. E assim Luciano foi a Cascais, para a viagem dele acontecer exatamente
como dizemos, “uma vez e nunca mais”.
Trem Azul
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