quinta-feira, 1 de outubro de 2015

ÚLTIMO SONETO


Não quero o encanto do canto que encanta,
não mais a melodia do acalanto,
os vulgos sortilégios do quebranto,
no engano de quem canta o mal espanta.
Eu quero o desencanto do anticanto,
o gemido de quem já não mais canta,
o pão embolorado como janta
e a dor inútil de um inútil pranto.
Silêncio: eis que chega a noite escura.
Não há mais poesia na cidade.
O poeta recolhe-se ao seu gueto,
sua torre de alfarrábios, sua clausura,
e, silenciosamente, sem piedade,
elabora o seu último soneto.

Otto Leopoldo Winck

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