terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Tem horas que a gente simplesmente pensa em mudar tudo. Recomeçar a vida do nada. Esquecer os livros que já leu, as mulheres que passaram pela vida, os amigos que nos ampararam, os barulhos que nos incomodaram na noite. Só não penso em esquecer os textos que escrevi. E quando releio os textos, lembro dos livros, das mulheres, dos amigos e de todos os barulhos noturnos. Eles continuam lá como fantasmas que mexem em nossos chinelos em cima da poltrona. E é isso que me impede. Os negócios que escrevi ao longo desses anos. A escrita me aprisiona. A escrita me aproxima e me afasta de Deus. A escrita me desperta e me nocauteia. Tenho tido várias decepções na vida, mas a escrita é a única que não me decepciona nunca. Ela sempre esteve a serviço de minhas explosões de alegria, de minhas obsessões, de minha submersão na tristeza mais profunda, nos meus rompantes de renascimento. A escrita é minha mais fiel amiga, namorada, companheira e minha inimiga mais leal. Posso perder tudo, mas não posso perder a capacidade de me emocionar e de escrever. O resto é essa vontade de olhar os carros passando pela estrada, um rock do Lynyrd Skynyrd na cabeça e a possibilidade de um novo poema. E me parece mais do que o suficiente.

(Mário Bortolotto)

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