segunda-feira, 28 de março de 2016

MERGULHO
Cansada de voos rasos
melhor o mundo profundo
qual lasca de abismos,
primata, profano...
superficial demais
dizem meus olhos,
arte sem pausa e final,
prega meu deus
enquanto isso, na alça
do tempo, o mundo
poeira, na queima do
dia total e moderna
é a idade do silêncio
que sem nós, me desata
:
a cova é livre,
e a vida é só de subidas
Carmen Silvia Presotto – Vidráguas!
SÍMBOLOS DE DESEJO
eu olhei a mão de Neruda,
escrever na areia um poema
para as ondas levarem aos peixes
a frágil passagem da vida
em palavras que desaparecem
eu bebi o licor de ameixa
o chá de gengibre de Picasso/
doente onde a alegria negra
era o insumo do fogo curando/
o corpo agarrado ao inferno de Dante...
eu senti o desespero de Hemingway/
ao disparar aquela bala em riste
com a solidão silenciosa das idades
fomos os primeiros à cumprir o tempo
na loucura distante/
das fugas sem fôlego dos poentes...
nós podemos ainda perscutar o sonho
de Woodstock/
voar com o vento nos cabelos
das luas ultrapassar todos os limites/
as constelações resvalando no capô
de nossas almas bólidos no abismo
de um poema com várias asas de Rimbaud...

Adilson Alchuiy.
das retinas
há uma flor de maio
de janeiro a dezembro
no outono daquele olhar
cláudia Gonçalves
Peço ao tempo,
tempo!
E o tempo...
sempre, sem tempo
não tem o tempo,
que o tempo quer!

Ana Andrade

Aos Pobres de Espírito

Aos Pobres de Espírito
só os tolos, meu
imaginam que um poeta
seja ateu
toda poesia é eterna e infinita
e ao menos em seus versos
o poeta acredita
como então este papo furado
sobre Vinicius de Moraes
que até ao esqueleto dele se irrita?
ateu confesso conversa mole
de quem não se inspira
com a fé do poeta não se bole
diz que é ateu por sarro de mentira:
"agradeço, Jesus, mas nem precisava
tamanho sacrifício, porque hoje é sábado"...
bastou saber que eu sabia que ia amar
e me lançar voando sobre este precipício
que é saber que vou amar e até viver depois de morrer
e vou sofrer até voltar a amar
Evoé, Vinícius, os tolos não sabem o que questionar
e do poeta ignoram a fé forte no Pai Criador deste ofício
que faz fé no amor e voa para além de existir somente o amor
como o que se deve ter e dar para conceber e conceder.
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abstrato é
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27/03/2016 - Edson Felizardo – SP

LIDAS DIÁRIAS NA CHÁCARA

(Lauro Volaco)

Num momento em que grandes discussões são entabuladas sobre o que os pais modernos podem ou não solicitar aos seus filhos, sem querer realizar um julgamento, pois não é este meu papel, quero contar para vocês o que nós fazíamos de útil em nossa infância. Vale ressaltar que tínhamos um caseiro e que uma grande gama de serviços do dia a dia, era feita por ele, mas acredito que por medida didática, nosso pai instituiu várias atividades para que nós as realizássemos. Eram medidas que ele estudou a viabilidade técnica, econômica e educativa, estabelecendo as rotinas, sem querer saber se eram do nosso gosto ou não. O argumento que desconhecíamos, mas ele não, deveria ser o seguinte: vocês quiseram ter esta área, que era uma dádiva para nós e nossos amigos, agora repartam os cuidados para manutenção comigo. Mas isto que acabei de falar é uma inferência minha, pois nunca nos foi dita.
Uma atividade diária e que era repetida no período da manhã e no final da tarde era recolher todos os ovos dos cinco galinheiros. Isto deveria ser feito com uma série de cuidados, para evitar atropelos e muita agitação das muitas galinhas e dos poucos galos. A quantidade de ovos era enorme e, dentre aquelas aves, as que paravam de botar eram as primeiras a encontrar o caminho da panela, pois a questão era produtividade, sem protecionismo.
Outra atividade, mais divertimento que obrigação, era irmos todos os dias, no início da manhã, ver nosso pai a ordenhar a vaca e nos dar o leite para bebermos, ainda quente e tirado na hora. Enquanto aquilo acontecia, íamos buscar o milho com palha e sabugo, para alimentar a vaca. O bezerro tinha hora certa para mamar: antes da ordenha para soltar o leite, e depois de tirada a quantidade suficiente para o nosso uso, pois o restante pertencia a ele.
Colher frutas quando amadureciam, com todo o cuidado para não bater umas contra as outras e levar para casa para serem comidas ou transformadas em doces caseiros, os quais eram armazenados em caixetas de madeira ou vidros de compota. Todo o trabalho de descascar, com a vigilância muito próxima de nossa mãe, era feita por nó, e todos os restos, dados para os porcos, o que possibilitava a perda zero e eliminação de resíduos. Em algumas frutas, esse trabalho era muito penoso, como os figos verdes, que soltavam uma espécie de leite ácido, tinham que ser descascados com lâmina de barbear, bem fininha para não ferir a fruta, que iria se transformar em belíssimas e gostosas compotas. As nossas mãos ficavam ardendo e dava a impressão que havia sido queimadas com aquele líquido, agressivo à nossa pele. Os excessos das frutas produzidas abundantemente em nosso pomar, depois de termos usado tudo o que queríamos, eram doados para os alunos da Escola Rural, a todos os vizinhos, a quem as pedisse, e ainda sobravam muitas, com as quais alimentávamos os porcos criados no mangueirão e nos chiqueiros de engorda. Havia épocas que até os porcos recusavam comer, principalmente peras, pois a quantidade era tão grande, que até eles enjoavam.
Certo dia, eu, metido como era, resolvi realizar um trabalho que não estava no planejamento de meu PA para que o fizesse. Vocês conhecem um tipo de foice pequena e em arco, usada para cortar grama/capim para dar aos animais? Nela havia um serrilhado para ajudar na hora do corte, que ficava do meio para a ponta da ferramenta, com a qual. Armado, juntei um maço de capim e passei o instrumento, esquecendo-me que o meu dedo mínimo estava na linha de corte. O sulco foi tão profundo que deu para ver o osso na hora em que foi lavado o ferimento. Mas o difícil mesmo foi ter que procurar os pais para tratar daquele corte e ainda dizer que estava desobedecendo a uma ordem recebida. Daquela vez, acredito que por dó da dor que senti, não fui castigado nem levei uma surra. Mas até hoje tenho uma redução da flexibilidade e força no dedo ferido na ocasião Dura forma de aprendizado, mas muito eficaz, pois nunca mais fiz isso ate hoje.


HISTÓRIAS DE UM PIRAIENSE.

TANQUE DA CHÁCARA


( Lauro Volaco)

A água sempre exerceu uma forte atração em mim. Assim, rios, riachos, mar, lagoas, piscina e outras tantas formas que a contém me fascinam. Acordar e ver uma névoa fina sobre a água me transporta a situações de muita paz e harmonia. Mas o que eu gosto mesmo é do contato físico com ela, que me envolva, me embrulhe, me toque, me acaricie. Pescar bem cedinho, num dia mais frio e com a água bem quente fazendo o contraste e formando aquele vapor, faz com que a vontade de pescar vire secundária, para dar lugar ao prazer daquela imagem.
Mas vamos falar de um filete de água que corre nos fundos de nossa chácara, com água absolutamente pura que nasce bem próxima de onde foi construído o nosso tanque, menos de trezentos metros do “olho de água”. No início da minha infância, nem íamos muito até este filete de água, pois não tinha a menor graça, não nos proporcionava nenhum tipo de entretenimento. Por outro lado, tinha o tanque do Fanchin, que era um lugar onde nós éramos atraídos mais que um imã num pedaço de ferro. Meu pai e meu tio Rubem, percebendo que ali havia um potencial de aproveitamento e divertimento, resolveram construir um pequeno tanque. Melhor dizendo: um pequeníssimo tanque. Não seria tão bom quanto ter uma piscina, mas seria muito melhor que nada. Além do mais, nos manteria em nosso território. O lugar escolhido foi estratégico, pois precisou fazer pouca remoção de terra praticamente sem descaracterizar o terreno, todo cheio de árvores, samambaias e arbustos. Além do mais, quando uma construção como estas é feita com pá, enxada, carrinho de mão e baldes para transportar os materiais removidos, a canseira e o trabalho são enormes. Outro fator levado em consideração é que no local escolhido não havia rochas, o que seria um complicador para a construção. Uma coisa que foi muito sábia, foi termos participado de todo o trabalho, pois ele passou a ter um valor inestimável para nós. Ficamos sabendo muito bem o que é construir alguma coisa, mesmo que pequena. Depois, cuidávamos daquele tanque, com o carinho de um pai com seu filho. Foi projetado para que a água pudesse sempre estar limpa, mesmo durante o uso enquanto nadávamos. Para isto foi feito uma barragem de contenção, que tinha na parte bem inferior e no meio do tanque, um furo com um tampão de madeira, para que ele pudesse ser esgotado e feito uma limpeza fina de folhas, galhos e mesmo barro. Na parte superior desta pequena barragem, ficava o vertedouro, para que a água não transbordasse de forma desuniforme e provocasse erosão. O fundo foi revestido com lajotas de pedra e também uma das laterais do tanque. A outra parede foi mantida naturalmente de terra, pois ela era muito compacta e foi deixada sem revestir visando reduzir custos (“fazer mais com menos”. De tempos em tempos, drenávamos toda a água e fazíamos uma limpeza geral, deixando aquele nosso tanque limpíssimo, para receber o novo volume de água, que não tinha custo algum. O que tinha de ruim é que demorava vários dias até que enchesse novamente, pois o volume de água era muito pequeno. A água era muito gelada, pois entre a nascente e o tanque, não recebia calor do sol, de tanta vegetação que recobria todo este trecho do filete de água.
Aquele pequenino tanque era para nós, uma fonte inesgotável de prazer, pois podíamos reunir nossos amigos para grandes brincadeiras. Era tão pequeno, que para que pudéssemos saltar do barranco, precisava que ninguém estivesse na linha de salto, para evitar embutir um pescoço no ombro da vítima. Pequeno espaço, grandes divertimentos para uma criançada que podia brincar na água sabendo de sua qualidade e com mínimo risco.

Grandes e boas lembranças que meu pai e meu tio nos proporcionaram de forma tão simples.
“Dame el ocaso en una copa!”
Velhas estradas bifurcadas
Lentas aparições de fantoches
Nas alamedas do nada
Bárbara Lia in A flor dentro da árvore
Prêmio com um poema denso - holocausto dos livres:
Holocausto dos Livres
Hitlers sonâmbulos jogam vôlei com a lua
Afugentam pássaros, queimam ciprestes
Enquanto pequeninas Franks registram -
No escuro - o belo impregnado de pólvora:
Açucenas atiradas no cais do amanhã
Árias flutuando no esperma dos anjos
A paz silvestre de um beija-flor avelã
A sugar a rosa divina em voo distraído
Franks esmagadas no ar do ódio inócuo
Enquanto mil Hitlers de oco cego ego
Brilham ácidos no altar da prepotência
As pequeninas meninas – Annes
Franks modernas vestidas de lilás -
Escrevem trancadas em armários
Meio a ratos e candelabros de fogo
Uma arca flutuando acima de suas auras
Um graal tecido entre as tranças loiras
Escrevem contra o tempo, suam crisântemos
A ampulheta do escárnio acelerando o fim
O mundo compactua - cego contumaz -
O holocausto da beleza em andamento
Hitlers sádicos a queimar os lírios da paz
A raptar a lua para iluminar seu bacanal

Bárbara Lia


Prêmio Cataratas de Contos e Poesias (2012) - 2º Lugar
Aquele momento em que
A Ia aparece aqui em casa e
São Paulo e Curitiba formam
Uma terceira cidade sem nome.
Ali onde brincamos de escrever nossos nomes
Nas árvores que acabaram de nascer:
Meu amor, somos os novos bregas dessa
Terra de ninguém.
Caímos de sono
No quintal das nossas risadas.
Dormimos decretando cores
À jovem população sem rosto.
Ah, qual cachorro irá lamber
Nossa cara quando o sol surgir
Vazio no horizonte?
A cidade sem nome
Só costuma receber você e vocês.
Todos nós gritamos "feliz ano novo"
Quando beijamos a boca da multidão
Olhando com os nossos olhos
Ouvindo com os nossos
Tímpanos
Pensando o que pensamos
Na semana que vem.

Alexandre França

No futuro do passado presente


Não sabia o quanto a amava, inventava desculpas para rejeita-la, ela se manisfestava, gritava! Ajudei a sufocar esse grito de liberdade, remorso. Eu era inocente, acreditava na justiça, na mídia e nas vozes das ruas, a decepção foi um golpe! Pensava que a ditadura imposta só vestia uniformes militares e não togas. Agora, silenciosa , adormece abraçada ao Estado de direito, nos becos, nos cantos escuros da sociedade. Reencontro-a em livros de historia, saudosa e amada democracia brasileira.
Curitiba, 15 de novembro de 2050. "Autor desconhecido"

JDamasio

sábado, 26 de março de 2016

Tocando Frente


E as marcas deixadas na areia nos seguem como os discípulos seguiam o mestre. Por ele recordamos o passado mas, depois dele, aprendemos, ao olhar para a cruz, a levantar a cabeça e seguir com o olhar voltado para a eternidade. 

Feliz páscoa amigos, amigas, família.

ANTIBUDISMO


Que me perdoem
os de bem com a vida
mas para fazer poesia
a dor é fundamental...
É fundamental
uma dor de corno,
uma ressaca brava,
uma angústia kierkegaardiana,
uma vontade súbita de se atirar no mar...
Só a dor transfigura
o asco, o travo, o amargo da boca
em pétala, em cântico, em salmodias...
Se tudo é dor,
e toda a dor vem do desejo,
eu quero todo o desejo que existir neste mundo.

Otto Leopoldo Winck

O ENTERRO DO LOBO BRANCO

"Era urgente sair de perto daquele corpo silenciado morto a cajadadas seus olhos não mais seguiam a órbita certa dos gozos intensos agora eu também era um cadáver e você uma carcaça verde atrás do véu eu podia ver os engenheiros do holocausto sabia que um dia as cores tomariam conta dos seus ossos mas eu ainda tento ainda vasculho o abismo dos seus orifícios sim eu nunca me contentei com a maciez das suas mucosas eu ia além gostava das pedras escondidas nos seus rins nas suas vesículas no seu baço gostava de me embrenhar no seu intestino delgado escutar o seu grito de desespero enquanto meus membros radiografavam a sua angústia e os seus dias cinzentos você escondia um hospício atrás dessa pele habitável" 

Márcia Barbieri

Um Homem Com uma Enxada na Mão e um Walkman no Ouvido



Um homem com uma enxada nos braços
É um herói sem medo de trabalho
Faz do esforço e da competência eternos laços
Em seu espírito forte como o carvalho!

Ele pega na grossa enxada de madeira
Para tirar o mato cruel e nocivo
Sua alma é uma luz verdadeira
Que matem o seu corpo vivo!

Ele escreve com a enxada poemas na paisagem
Que beijam a grama numa declaração de amor
Para ele, a vida não é apenas uma passagem
Porém, uma missão, repleta de esplendor

Ele tem um fone no seu ouvido direito
Que toca sua canção preferida com beleza
Porém, não tem nada no ouvido esquerdo
Pois, com ele, este homem ouve a natureza!

A natureza e sua banda preferida entram na mente
Deste jeito o homem trabalha com mais alegria
Com a sua enxada, ele é um poeta viril e inocente
Que consegue, na lavoura, a sua principal energia.

Luciana do Rocio Mallon
Otto Leopoldo Winck


Aos gritos de "bandido bom é bandido morto", Jesus, a quem seus seguidores chamam de Cristo, foi executado ontem. Para não haver tumultos, as autoridades montaram uma guarda em torno de sua sepultura.

VALSA DOS APAIXONADOS


A orquestra começou a valsa,
E os dois foram dançar.
Ela ainda meia sem graça,
Demorou um pouco pra se soltar.
E ele, vez em quando e outra,
Olhava fundo em seu lindo olhar.
Mas ela não abria a boca,
Mas sua vontade era de beijar.
E a valsa seguia em frente,
Deixando mais quente,
Os dois a flertar.
E eis que tudo de repente,
Os viram toda a gente,
Beijando sem parar.

Elciomoraes

QUE NASCEU PRA BRINCAR DE PENSAMENTOS"!

Mote e glosa:Assis Coimbra.(Engatinhante na arte da vida e do cordel)

Agressores no mundo que deixaram
Na inocência as marcas das agressões.
Peço aqui em meus versos soluções
Pra que paguem mazelas que deixaram.
E pra aquelas que os filhos espancaram
Punições por bater em seus rebentos.
E que mudem cruéis temperamentos,
Pra livrarem a infância da má sorte.
Pois criança na vida é só "pixote"
QUE NASCEU PRA BRINCAR DE PENSAMENTOS"!



Emails: assis.coimbra@gmail.com / assis_coimbra@yahoo.com

sexta-feira, 25 de março de 2016

As Bruxas de Bruxelas



No dia vinte e dois de março
Bruxelas sofreu um atentando
Que derreteu até o mais puro aço
Deixando um meigo anjo calado

As bruxas de Bruxelas
Foram soltas neste dia
Quebrando fortes janelas
E causando muita agonia

Bombas explodiram no aeroporto
E também, no metrô, cheio de gente
Sempre há uma mensagem num corpo morto
Para uma alma desesperada e carente!

As bruxas de Bruxelas
Viraram bombas de terror
Que ameaçaram ruelas
Causando dor e pavor!

As brabas bruxas de Bruxelas
Viraram homens-bombas terroristas
Deixando marcas tristes e amarelas
Nos sangues que caíram nas pistas.

Luciana do Rocio Mallon
Águas de maio de 68 nosso sangue
Barricadas e Bastilha nosso sangue
DNA de Guevara e Cohn-Bendict -
Nosso sangue - DNA de Graciliano,
Pagu, Oswald. Sangue Tupiniquim
Sangue dos meninos mortos pelo AI-5
Marcha ao ritmo de “Grândola Vila Morena”
Desliza ao som de “A las barricadas”
“Há de ser outro dia”
“Caminhando contra o vento,
sem lenço, sem documento”
E este vinagre nas mãos é tão inofensivo...
O sangue dentro - este é o estopim e o grito -
Este ninguém tira de nós, ninguém tira de mim...

Bárbara Lia
Vinagre: uma antologia de poetas neobarracos

Edições V de Vândalo, 2013

Golpe.
Quem nunca sofreu um...
As manobras traicoeiras.
A esperteza que você engole com a chuva.
Só no Brasil o golpe não passará.
Não passarão!
(golpe
gol.pe
sm (gr kólaphos, pelo lat vulg) 1 Ferimento ou pancada com instrumento cortante ou contundente. 2 Corte, incisão. 3 Desgraça, infortúnio. 4 Ímpeto, chofre. 5 Crise. 6 Disposição decisiva que se toma em qualquer negócio. 7 Lance. 8 Gole, trago. 9 Esperteza. 10 gír Manobra traiçoeira. etc.)



O Grito do Sangue Tupiniquim - Bárbara Lia

Lenda da Maria do Plástico Roxo de Curitiba


Nos anos 60 e 70, em Curitiba, havia uma senhora que se vestia enrolada em plásticos de quatro cores: roxo, branco, preto e cinza. Esta anciã vendia artesanato no Centro da cidade e sempre estava muito maquiada.
Naquela época, existia uma menina chamada Tereza que ficava admirando esta figura e prestava atenção em seus discursos moralistas como:
- O mal do mundo é o sexo. Pois a depravação trará uma doença que acabará com a humanidade.
- A sociedade me despreza porque eu tenho mais de 40 anos de idade e ainda sou donzela.
- Tem pessoas que nunca serão livres porque sempre serão escravas dos prazeres da carne.
Sempre quando Tereza fazia bagunça, sua madrasta fazia a seguinte ameaça:
- Se você não se comportar, levarei você para a Maria do Plástico Roxo!
Um certo dia, Tereza viu que esta moça do plástico colorido estava vendendo uma boneca artesanal muito bonita. Assim , a garota perdeu o medo, chegou perto e perguntou-lhe:
- Quanto custa esta boneca?
A moça respondeu:
- Vinte cruzeiros.
A menina disse:
- Vou comprar.
- Mas qual é o seu nome?
A vendedora respondeu:
- Chamo-me Maria Ivone, mas meu apelido é Maria do Plástico Roxo. Até hoje não entendo o porquê as pessoas me chamam com este apelido, sendo que também me visto com outras cores: branco, preto e cinza.
Após estas palavras, a garota levou o brinquedo para casa.
Um mês depois, assaltantes entraram atirando na casa de Tereza e alguns tiros pegaram seus parentes. Mas ela escapou porque, naquele momento ela estava dormindo agarrada com a boneca, e uma das balas entrou dentro daquele brinquedo.
Algum tempo depois, Tereza aproximou-se da Maria do Plástico Roxo e falou:
- A boneca que comprei de você salvou a minha vida.
Desta maneira, a vendedora comentou:
- Quem socorreu você foi o espírito que estava dentro do brinquedo. Eu sei porque converso com fantasmas todos os dias.
Esta misteriosa dama de plástico desapareceu nos anos 80. Algumas pessoas falaram que era voltou para sua cidade natal, que ficava no interior, para morar sozinha. Pois ela não tinha parentes e nem marido. Afinal ela não deixava que nenhuma pessoa tocasse seu corpo.
Por coincidência, hoje, as cores preferidas desta senhora formam a bandeira da assexualidade: roxo, branco, cinza e preto. Para quem não sabe, a assexualidade é a orientação das pessoas que não sentem atração sexual, assim, como a personagem principal deste texto.

Luciana do Rocio Mallon

A FIDELIDADE DE UM AMIGO.


Ser amigo não nos cobra taxa de carinho, não nos exige prestações de serviços, nem nos coloca selo de garantia, mas nos ensina a amar, a respeitar, a ser leal com aquele que nos confia seu coração, mesmo que os ventos soprem, mesmo que o tempo os distancie, mesmo que as ocupações diárias ou as divergências os façam se ausentar, amigo quando é amigo não é capaz de abandonar, trair ou machucar. É por isto que a palavra de Deus diz "há amigos mais chegados que um irmão" (pv 18) e esta é uma das verdades mais lindas que já conheci e que já vivi, há amigos que amamos mais, há amigos que queremos um bem tão grande, e as vezes nem sabem o tamanho valor que nos tem... Valorize aqueles que fazem de um tudo pra te ver bem..."

(Cecilia Sfalsin)

Círculo vicioso


Bailando no ar, gemia inquieto vaga-lume
- "Quem me dera que fosse aquela loura estrela,
Que arde no azul, como uma eterna vela!"
Masa estrela, fitando a luz, com ciúme:
- "Pudesse eu copiar o transparente lume,
Que, da grega coluna à gótica janela,
Contemplou, suspirosa, a fronte amada e bela!"
Mas a lua, fitando o sol, com azedume:
- "Mísera! Tivesse eu aquela enorme, aquela
Claridade imortal, que toda a luz resume!"
Mas o sol, inclinando a rútila capela:
- "Pesa-me esta brilhante auréola de nume...
Enfara-me esta luz e desmedida umbela...
Por que não nasci eu um simples vaga-lume?"

Machado de Assis

"esqueci"

esqueci da tua pele
a umidade
no árido desencanto
e a frágil memória
(mal dos tempos
embora em versos)
lhe esculpiu o epitáfio


(lota moncada)

Lenda do Acarajé


Era uma vez uma moça chamada Iansã, que era a deusa dos ventos e das tempestades. Esta jovem era casada com Xangô, o deus da justiça. Perto deste casal morava um Ifá, que era um tipo de vidente com poderes mágicos e que cozinhava bem. Porém, este místico morria de inveja de Iansã e seu marido.
Um certo dia, Iansã pediu para que o Ifá fizesse um alimento que deixasse Xangô forte. Então, este cozinheiro invejoso sabotou a própria receita e disse para a sua colega que o alimento só faria efeito se o seu marido falasse com o povo, logo depois que experimentasse a comida mágica.
Então, no meio do discurso, começou a sair labaredas de fogo da boca de Xangô. Deste jeito, Iansã desconfiada experimentou o alimento. De repente, começou a sair chamas da sua boca também.
Porém a população ficou encantada, aplaudiu o casal e começou a gritar a palavra acarajé, que significa bola de fogo de comer. Além, de saudar o casal,com expressões como:  deuses das chamas divinas e reis da bola de fogo.
Reza a lenda que comer acarajé antes de dar uma palestra, ou, falar em público traz coragem e sorte.

Luciana do Rocio Mallon

O SONHO COMANDA A VIDA


Cada vez que recomeço, me torno mais forte
porque vou tentando não perder o norte
e também ser feliz e verdadeiro
e quando um sonho se destruir e quebrar
tento seus pedaços colar e recomeçar
para que o sonho se realize por inteiro
Porque nada detém quem não deixa de sonhar
nem aquele que não tem receio de recomeçar
e no sonho as suas forças retemperar
porque o sonho sempre comandará a vida, afinal
como dizia António Gedeão, na sua Pedra Filosofal
e essa também deve ser a nossa maneira de pensar

Joaquim Vale Cruz – 2016 – 03 -25

REPASSE


Em minha vida
repassada
restou de mim
poemas em forma
de nuvens flutuadas
disfarce de gritos abafados
da dor aguda
e solitária
E no fundo
de tudo a confissão
de cada verso
é transpassar
de facada
Em cada morte
que se grita
eis minha vida
em versos
contada

- Bruno Junger Mafra -

Novo Desafio da Folha de Papel Sulfite


Amigos, vocês conhecem um absurdo chamado "Novo Desafio do Papel Sulfite" ?
Infelizmente é a nova moda, da Internet, onde jovens tiram fotos com uma folha de ofício em frente ao corpo, para mostrar que suas cinturas não ultrapassam a medida de oito polegadas.
Até uma semana atrás, eu nem sabia disto. Porém uma repórter me abordou na rua, me entregou uma folha de papel A4 e disse:
- Agora faça o desafio da folha em branco.
Então peguei uma caneta e escrevi um poema.
Deste jeito a jornalista me perguntou:
- Você não conhece o desafio da folha de papel sulfite?
Eu respondi:
- Não é para escrever um poema neste papel?
- Poxa, sou escritora e o único desafio da folha, em branco, que conheço é este que citei.
Assim a jornalista me explicou que se tratava de uma competição virtual de fotos para ver quem tinha cintura menor que uma folha de papel A4.
No mesmo instante, comentei que achava o tal desafio um absurdo porque estimula um certo padrão de beleza incompatível com a realidade e incentiva os transtornos alimentares. Poxa, na minha época de juventude, competição de folha em papel em branco era para ver quem desenhava ou escrevia melhor. Além disto, falei que seria mais interessante os adolescentes criarem um desafio da cartolina, onde as pessoas colocariam frases com mensagens poéticas, em cartazes grandes, em frente das suas barrigas. Afinal, a Poesia é o alimento para a alma, assim como a comida é o alimento para o corpo.
Não sei quando esta reportagem irá ao ar. Mas avisarei a todos os meus amigos quando isto acontecer.
Luciana do Rocio Mallon

PANTOCRATOR

apenas o absoluto
escuta a luz
emana a energia contagiante
o amanhecer que avança
sob o teto de todas as paisagens
que pintam o vazio & o silêncio
não é o movimento das máquinas
nem a natureza que conceitua
a fauna & flora adentro
dilucular investida quando a noite tenta/
vencer com a escuridão os mundos
divididos & complexos
um museu com cardos químicos
nas crostas do rosto divino
em tudo que foi expulso
faz retornar as coisas nascidas

do paraíso

Adilson Alchuiy‎ 
William Teca


faz umas três semanas que chegou a coisa preta - vulgo o gato - agora estamos aqui ouvindo led zeppelin que, ao lado de bach, é um dos sons prediletos do felino. ainda tenho dúvidas se ele gosta de mim ou se gosta mesmo dos agudos do robert plant. o que sei é que o meu pequeno mundo caseiro deu uma guinada. a vida é definitivamente melhor com um bicho. e quando tenho dúvidas, se cito o derrida, o gato responde: "nãããooo"; pois é, sigo a filosofia felina - assim caminha a tese, assim caminho eu.

TROVA DE SEXTA


Buenas,
você pode escolher o quarto verso da trova, ou
até fazer o seu.
Feliz Páscoa, josé marins

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Dormem os peixes no rio?
– quando guri, perguntei.
Nesses anos de porfio,
poucas respostas juntei.
Ou:

por quantos rios passei?

O Dia Em Que Tentaram Roubar um Ovo de Páscoa


No final dos anos noventa eu trabalhava numa loja de roupas. Mas perto da Páscoa, os donos resolveram vender alguns ovos de chocolate lá, também.
Uma vez, o segurança estava em seu horário de almoço, então entrou uma mulher com a aparência diferenciada: roupas coloridas sujas, olhos claros, cabelos e sobrancelhas loiros como se fosse albina e dentes da frente grandes. Desta maneira a moça colocou um ovo de Páscoa grande dentro da blusa. Mas, delicadamente, cheguei perto dela e falei, com uma cesta de compras nas mãos:
- A senhora colocou o ovo de Páscoa num lugar indevido.
- Gostaria de uma cestinha?
Naquele instante, o ovo caiu da barriga da freguesa que começou a gritar:
- Você está insinuando que eu roubei o chocolate?!
- Eu acabei de parir o ovo!
- Afinal se tem coelho e galinha que botam ovos. Eu como mulher, posso dar a luz a um ovo e bem colorido, ainda por cima!
- Olhe só a minha roupa estampada!
Ao perceber que a mulher tinha problemas neurológicos, eu disse:
- Então, por favor, me dê o ovo para que eu possa leva-lo à maternidade, que fica no estoque desta loja!
Desta maneira a cliente começou a gritar:
- Querem tirar o meu filho!
Naquele mesmo instante, avistei a kombi do Fundo de Amparo Social na esquina, sai da loja e expliquei o que estava acontecendo. Assim uma moça chegou perto da mulher perturbada e começaram a conversar. Como o meu horário de almoço tinha acabado de chegar, fui comer e quando cheguei ao meu local de trabalho, a cliente nervosa não estava mais lá.

Luciana do Rocio Mallon
Ontem, no extracéu, tomamos chá de anis
diante de um poente branco.
No extracéu não há noites e pássaros pousam
em nossa janela, enquanto tecemos mantos.
Você sorri, mais do que agora, e estrelas
fogem do céu-matéria para matarem a saudade
do teu belo riso italiano.
Vez ou outra congelamos uma estrela fugidia
e a colocamos na parede de nossa sala.
Bárbara Lia

in O sal das rosas (Lumme editor/2007)

poema publicado na revista coyote n° 10

segunda-feira, 21 de março de 2016

Há uma ilusão acerca da palavra amigo. Não temos amigos no mesmo sentido em que falamos dos livros da nossa biblioteca. Não os acessamos quando queremos. Às vezes, forçamos uma convivência com um outro que nos diminui. Que sutilmente nos bota um espelho distorcido na frente para ficar ali (ele, o outro - ou mesmo você), resguardado atrás da impressão horripilante acerca do que achamos da identidade que nos determina. E esse resguardo é a posição mais confortável e triste da nossa esburacada humanidade. Mas em outras vezes, insistimos naquilo que permanece vazio dentro da lacuna que nos separa e criamos uma espécie de máquina onde duas cabeças desenham sem querer um mundo novo. Ai não há mais espelho: é um cara à cara sem imagem, um beijo sem face, abraço de retinas - a narrativa, TODA narrativa, sem nenhum autor.

 Alexandre França

domingo, 20 de março de 2016

Epitáfio


Folha de plátano
baila ao sol

Acha crepitante
desaba no solo triste

Epitáfio da folha:

Não desapareço
feito espuma nas ondas

Regenero o solo
com ternura feroz

Para colorir azaleias,
gardênias e girassóis


Bárbara Lia

Al otro lado de la pared


Ambrose Bierce

Hace muchos años, cuando iba de Hong Kong a Nueva York pasé una semana en San Francisco. Hacía mucho tiempo que no había estado en esa ciudad y durante todo aquel periodo mis negocios en Oriente habían prosperado más de lo que esperaba. Como era rico, podía permitirme volver a mi país para restablecer la amistad con los compañeros de juventud que aún vivían y me recordaban con afecto. El más importante para mí era Mohum Dampier, un antiguo amigo del colegio con quien había mantenido correspondencia irregular hasta que dejamos de escribirnos, cosa muy normal entre hombres. Es fácil darse cuenta de que la escasa disposición a redactar una sencilla carta de tono social está en razón del cuadrado de la distancia entre el destinatario y el remitente. Se trata, simple y llanamente, de una ley.

Recordaba a Dampier como un compañero, fuerte y bien parecido, con gustos semejantes a los míos, que odiaba trabajar y mostraba una señalada indiferencia hacia muchas de las cuestiones que suelen preocupar a la gente; entre ellas la riqueza, de la que, sin embargo, disponía por herencia en cantidad suficiente como para no echar nada en falta. En su familia, una de las más aristocráticas y conocidas del país, se consideraba un orgullo que ninguno de sus miembros se hubiera dedicado al comercio o a la política, o hubiera recibido distinción alguna. Mohum era un poco sentimental y su carácter supersticioso lo hacía inclinarse al estudio de temas relacionados con el ocultismo. Afortunadamente gozaba de una buena salud mental que lo protegía contra creencias extravagantes y peligrosas. Sus incursiones en el campo de lo sobrenatural se mantenían dentro de la región conocida y considerada como certeza.

La noche que lo visité había tormenta. El invierno californiano estaba en su apogeo: una lluvia incesante regaba las calles desiertas y, al ser empujada por irregulares ráfagas de viento, se precipitaba contra las casas con una fuerza increíble. El cochero encontró el lugar, una zona residencial escasamente poblada cerca de la playa, con dificultad. La casa, bastante fea, se elevaba en el centro de un terreno en el que, según pude distinguir en la oscuridad, no había ni flores ni hierba. Tres o cuatro árboles, que se combaban y crujían a causa del temporal, parecían intentar huir de su tétrico entorno en busca de mejor fortuna, lejos, en el mar. La vivienda era una estructura de dos pisos, hecha de ladrillo, que tenía una torre en una esquina, un piso más arriba. Era la única zona iluminada. La apariencia del lugar me produjo cierto estremecimiento, sensación que se vio aumentada por el chorro de agua que sentía caer por la espalda mientras corría a buscar refugio en el portal.

Dampier, en respuesta a mi misiva informándole de mi deseo de visitarlo, había contestado: «No llames, abre la puerta y sube.» Así lo hice. La escalera estaba pobremente iluminada por una luz de gas que había al final del segundo tramo. Conseguí llegar al descansillo sin destrozar nada y atravesé una puerta que daba a la iluminada estancia cuadrada de la torre. Dampier, en bata y zapatillas, se acercó, tal y como yo esperaba, a saludarme, y aunque en un principio pensé que me podría haber recibido más adecuadamente en el vestíbulo, después de verlo, la idea de su posible inhospitalidad desapareció.

No parecía el mismo. A pesar de ser de mediana edad, tenía canas y andaba bastante encorvado. Lo encontré muy delgado; sus facciones eran angulosas, y su piel, arrugada y pálida como la muerte, no tenía un solo toque de color. Sus ojos, excepcionalmente grandes, centelleaban de un modo misterioso.

Me invitó a sentarme y, tras ofrecerme un cigarro, manifestó con sinceridad obvia y solemne que estaba encantado de verme. Después tuvimos una conversación trivial durante la cual me sentí dominado por una profunda tristeza al ver el gran cambio que había sufrido. Debió captar mis sentimientos porque inmediatamente dijo, con una gran sonrisa:

-Te he desilusionado: non sum qualis eram.

Aunque no sabía qué decir, al final señalé:

-No, que va, bueno, no sé: tu latín sigue igual que siempre.

Sonrió de nuevo.

-No -dijo-, al ser una lengua muerta, esta particularidad va aumentando. Pero, por favor, ten paciencia y espera: existe un lenguaje mejor en el lugar al que me dirijo. ¿Tendrías algún inconveniente en recibir un mensaje en dicha lengua?

Mientras hablaba su sonrisa iba desapareciendo, y cuando terminó, me miró a los ojos con una seriedad que me produjo angustia. Sin embargo no estaba dispuesto a dejarme llevar por su actitud ni a permitirle que descubriera lo profundamente afectado que me encontraba por su presagio de muerte.

-Supongo que pasará mucho tiempo antes de que el lenguaje humano deje de sernos útil -observé-, y para entonces su necesidad y utilidad habrán desaparecido.

Mi amigo no dijo nada y, como la conversación había tomado un giro desalentador y no sabía qué decir para darle un tono más agradable, también yo permanecí en silencio. De repente, en un momento en que la tormenta amainó y el silencio mortal contrastaba de un modo sobrecogedor con el estruendo anterior, oí un suave golpeteo que provenía del muro que tenía a mis espaldas. El sonido parecía haber sido producido por una mano, pero no como cuando se llama a una puerta para poder entrar, sino más bien como una señal acordada, como una prueba de la presencia de alguien en una habitación contigua; creo que la mayoría de nosotros ha tenido más experiencias de este tipo de comunicación de las que nos gustaría contar. Miré a Dampier. Si había algo divertido en mi mirada no debió captarlo. Parecía haberme olvidado y observaba la pared con una expresión que no soy capaz de definir, aunque la recuerdo como si la estuviera viendo. La situación era desconcertante. Me levanté con intención de marcharme; entonces reaccionó.

-Por favor, vuelve a sentarte -dijo-, no ocurre nada, no hay nadie ahí.

El golpeteo se repitió con la misma insistencia lenta y suave que la primera vez.

-Lo siento -dije-, es tarde. ¿Quieres que vuelva mañana?

Volvió a sonreír, esta vez un poco mecánicamente.

-Es muy gentil de tu parte, pero completamente innecesario. Te aseguro que ésta es la única habitación de la torre y no hay nadie ahí. Al menos...

Dejó la frase sin terminar, se levantó y abrió una ventana, única abertura que había en la pared de la que provenía el ruido.

-Mira.

Sin saber qué otra cosa podía hacer, lo seguí hasta la ventana y me asomé. La luz de una farola cercana permitía ver claramente, a través de la oscura cortina de agua que volvía a caer a raudales, que «no había nadie». Ciertamente, no había otra cosa que la pared totalmente desnuda de la torre.

Dampier cerró la ventana, señaló mi asiento y volvió a tomar posesión del suyo.

El incidente no resultaba en sí especialmente misterioso; había una docena de explicaciones posibles (ninguna de las cuales se me ha ocurrido todavía). Sin embargo me impresionó vivamente el hecho de que mi amigo se esforzara por tranquilizarme, pues ello daba al suceso una cierta importancia y significación. Había demostrado que no había nadie, pero precisamente eso era lo interesante. Y no lo había explicado todavía. Su silencio resultaba irritante y ofensivo.

-Querido amigo -dije, me temo que con cierta ironía-, no estoy dispuesto a poner en cuestión tu derecho a hospedar a todos los espectros que desees de acuerdo con tus ideas de compañerismo; no es de mi incumbencia. Pero como sólo soy un simple hombre de negocios, fundamentalmente terrenales, no tengo necesidad alguna de espectros para sentirme cómodo y tranquilo. Por ello, me marcho a mi hotel, donde los huéspedes aún son de carne y hueso.

No fue una alocución muy cortés, lo sé, pero mi amigo no manifestó ninguna reacción especial hacia ella.

-Te ruego que no te vayas -observó-. Agradezco mucho tu presencia. Admito haber escuchado un par de veces con anterioridad lo que tú acabas de oír esta noche. Ahora sé que no eran ilusiones mías y esto es verdaderamente importante para mí; más de lo que te imaginas. Enciende un buen cigarro y ármate de paciencia mientras te cuento toda la historia.

La lluvia volvía a arreciar, produciendo un rumor monótono, que era interrumpido de vez en cuando por el repentino azote de las ramas agitadas por el viento. Era bastante tarde, pero la compasión y la curiosidad me hicieron seguir con atención el monólogo de Dampier, a quien no interrumpí ni una sola vez desde que empezó a hablar.

-Hace diez años -comenzó-, estuve viviendo en un apartamento, en la planta baja de una de las casas adosadas que hay al otro lado de la ciudad, en Rincón Hill. Esa zona había sido una de las mejores de San Francisco, pero había caído en desgracia, en parte por el carácter primitivo de su arquitectura, no apropiada para el gusto de nuestros ricos ciudadanos, y en parte porque ciertas mejoras públicas la habían afeado. La hilera de casas, en una de las cuales yo habitaba, estaba un poco apartada de la calle; cada vivienda tenía un diminuto jardín, separado del de los vecinos por unas cercas de hierro y dividido con precisión matemática por un paseo de gravilla bordeado de bojes, que iba desde la verja a la puerta.

»Una mañana, cuando salía, vi a una chica joven entrar en el jardín de la casa izquierda. Era un caluroso día de junio y llevaba un ligero vestido blanco. Un ancho sombrero de paja decorado al estilo de la época, con flores y cintas, colgaba de sus hombros. Mi atención no estuvo mucho tiempo centrada en la exquisita sencillez de sus ropas, pues resultaba imposible mirarla a la cara sin advertir algo sobrenatural. Pero no, no temas; no voy a deslucir su imagen describiéndola. Era sumamente bella. Toda la hermosura que yo había visto o soñado con anterioridad encontraba su expresión en aquella inigualable imagen viviente, creada por la mano del Artista Divino. Me impresionó tan profundamente que, sin pensar en lo impropio del acto, descubrí mi cabeza, igual que haría un católico devoto o un protestante de buena familia ante la imagen de la Virgen. A la doncella no parecía disgustarle mi gesto; me dedicó una mirada con sus gloriosos ojos oscuros que me dejó sin aliento, y, sin más, entró en la casa. Permanecí inmóvil por un momento, con el sombrero en la mano, consciente de mi rudeza y tan dominado por la emoción que la visión de aquella belleza incomparable me inspiraba, que mi penitencia resultó menos dolorosa de lo que debería haber sido. Entonces reanudé mi camino, pero dejé el corazón en aquel lugar. Cualquier otro día habría permanecido fuera de casa hasta la caída de la noche, pero aquél, a eso de la media tarde, ya estaba de vuelta en el jardín, interesado por aquellas pocas flores sin importancia que nunca antes me había detenido a observar. Mi espera fue en vano; la chica no apareció.

»A aquella noche de inquietud le siguió un día de expectación y desilusión. Pero al día siguiente, mientras caminaba por el barrio sin rumbo, me la encontré. Desde luego no volví a hacer la tontería de descubrirme; ni siquiera me atreví a dedicarle una mirada demasiado larga para expresar mi interés. Sin embargo mi corazón latía aceleradamente. Tenía temblores y, cuando me dedicó con sus grandes ojos negros una mirada de evidente reconocimiento, totalmente desprovista de descaro o coquetería, me sonrojé.

»No te cansaré con más detalles; sólo añadiré que volví a encontrármela muchas veces, aunque nunca le dirigí la palabra ni intenté llamar su atención. Tampoco hice nada por conocerla. Tal vez mi autocontrol, que requería un sacrificio tan abnegado, no resulte claramente comprensible. Es cierto que estaba locamente enamorado, pero, ¿cómo puede uno cambiar su forma de pensar o transformar el propio carácter?

»Yo era lo que algunos estúpidos llaman, y otros más tontos aún gustan ser llamados, un aristócrata; y, a pesar de su belleza, de sus encantos y elegancia, aquella chica no pertenecía a mi clase. Me enteré de su nombre (no tiene sentido citarlo aquí) y supe algo acerca de su familia. Era huérfana y vivía en la casa de huéspedes de su tía, una gruesa señora de edad, inaguantable, de la que dependía. Mis ingresos eran escasos y no tenía talento suficiente como para casarme; debe de ser una cualidad que nunca he tenido. La unión con aquella familia habría significado llevar su forma de vida, alejarme de mis libros y estudios y, en el aspecto social, descender al nivel de la gente de la calle. Sé que este tipo de consideraciones son fácilmente censurables y no me encuentro preparado para defenderlas. Acepto que se me juzgue, pero, en estricta justicia, todos mis antepasados, a lo largo de generaciones, deberían ser mis codefensores y debería permitírseme invocar como atenuante el mandato imperioso de la sangre. Cada glóbulo de ella está en contra de un enlace de este tipo. En resumen, mis gustos, costumbres, instinto e incluso la sensatez que pueda quedarme después de haberme enamorado, se vuelven contra él. Además, como soy un romántico incorregible, encontraba un encanto exquisito en una relación impersonal y espiritual que el conocimiento podría convertir en vulgar, y el matrimonio con toda seguridad disiparía. Ninguna criatura, argüía yo, podría ser más encantadora que esta mujer. El amor es un sueño delicioso; entonces, ¿por qué razón iba yo a procurar mi propio despertar?

»El comportamiento que se deducía de toda esta apreciación y parecer era obvio. Mi honor, orgullo y prudencia, así como la conservación de mis ideales me ordenaban huir, pero me sentía demasiado débil para ello. Lo más que podía hacer -y con gran esfuerzo- era dejar de ver a la chica, y eso fue lo que hice. Evité incluso los encuentros fortuitos en el jardín. Abandonaba la casa sólo cuando sabía que ella ya se había marchado a sus clases de música, y volvía después de la caída de la noche. Sin embargo era como si estuviera en trance; daba rienda suelta a las imaginaciones más fascinantes y toda mi vida intelectual estaba relacionada con ellas. ¡Ah, querido amigo! Tus acciones tienen una relación tan clara con la razón que no puedes imaginarte el paraíso de locura en el que viví.

»Una tarde, el diablo me hizo ver que era un idiota redomado. A través de una conversación desordenada, y sin buscarlo, me enteré por la cotilla de mi casera que la habitación de la joven estaba al lado de la mía, separada por una pared medianera. Llevado por un impulso torpe y repentino, di unos golpecitos suaves en la pared. Evidentemente, no hubo respuesta, pero no tuve humor suficiente para aceptar un rechazo. Perdí la cordura y repetí esa tontería, esa infracción, que de nuevo resultó inútil, por lo que tuve el decoro de desistir.

»Una hora más tarde, mientras estaba concentrado en algunos de mis estudios sobre el infierno, oí, o al menos creí oír, que alguien contestaba mi llamada. Dejé caer los libros y de un salto me acerqué a la pared donde, con toda la firmeza que mi corazón me permitía, di tres golpes. La respuesta fue clara y contundente: uno, dos, tres, una exacta repetición de mis toques. Eso fue todo lo que pude conseguir, pero fue suficiente; demasiado, diría yo.

»Aquella locura continuó a la tarde siguiente, y en adelante durante muchas tardes, y siempre era yo quien tenía la última palabra. Durante todo aquel tiempo me sentí completamente feliz, pero, con la terquedad que me caracteriza, me mantuve en la decisión de no ver a la chica. Un día, tal y como era de esperar, sus contestaciones cesaron. «Está enfadada -me dije- porque cree que soy tímido y no me atrevo a llegar más lejos»; entonces decidí buscarla y conocerla y... Bueno, ni supe entonces ni sé ahora lo que podría haber resultado de todo aquello. Sólo sé que pasé días intentando encontrarme con ella, pero todo fue en vano. Resultaba imposible verla u oírla. Recorrí infructuosamente las calles en las que antes nos habíamos cruzado; vigilé el jardín de su casa desde mi ventana, pero no la vi entrar ni salir. Profundamente abatido, pensé que se había marchado; pero no intenté aclarar mi duda preguntándole a la casera, a la que tenía una tremenda ojeriza desde que me habló de la chica con menos respeto del que yo consideraba apropiado.

»Y llegó la noche fatídica. Rendido por la emoción, la indecisión y el desaliento, me acosté temprano y conseguí conciliar un poco el sueño. A media noche hubo algo, un poder maligno empeñado en acabar con mi paz para siempre, que me despertó y me hizo incorporarme para prestar atención a no sé muy bien qué. Me pareció oír unos ligeros golpes en la pared: el fantasma de una señal conocida. Un momento después se repitieron: uno, dos, tres, con la misma intensidad que la primera vez, pero ahora un sentido alerta y en tensión los recibía. Estaba a punto de contestar cuando el Enemigo de la Paz intervino de nuevo en mis asuntos con una pícara sugerencia de venganza. Como ella me había ignorado cruelmente durante mucho tiempo, yo le pagaría con la misma moneda. ¡Qué tontería! ¡Que Dios sepa perdonármela! Durante el resto de la noche permanecí despierto, escuchando y reforzando mi obstinación con cínicas justificaciones.

»A la mañana siguiente, tarde, al salir de casa me encontré con la casera, que entraba:

»-Buenos días, señor Dampier -dijo-; ¿se ha enterado usted de lo que ha pasado?

Le dije que no, de palabra, pero le di a entender con el gesto que me daba igual lo que fuera. No debió captarlo porque continuó:

-A la chica enferma de al lado. ¿Cómo? ¿No ha oído nada? Llevaba semanas enferma y ahora...

Casi salto sobre ella.

»-Y ahora... -grité-, y ahora ¿qué?

»-Está muerta.

»Pero aún hay algo más. A mitad de la noche, según supe más tarde, la chica se había despertado de un largo estupor, tras una semana de delirio, y había pedido -éste fue su último deseo- que llevaran su cama al extremo opuesto de la habitación. Los que la cuidaban consideraron la petición un desvarío más de su delirio, pero accedieron a ella. Y en ese lugar aquella pobre alma agonizante había realizado la débil aspiración de intentar restaurar una comunicación rota, un dorado hilo de sentimiento entre su inocencia y mi vil monstruosidad, que se empeñaba en profesar una lealtad brutal y ciega a la ley del Ego.

»¿Cómo podía reparar mi error? ¿Se pueden decir misas por el descanso de almas que, en noches como ésta, están lejos, «por espíritus que son llevados de acá para allá por vientos caprichosos», y que aparecen en la tormenta y la oscuridad con signos y presagios que sugieren recuerdos y augurios de condenación?

»Esta ha sido su tercera visita. La primera vez fui escéptico y verifiqué por métodos naturales el carácter del incidente; la segunda, respondí a los golpes, varias veces repetidos, pero sin resultado alguno. Esta noche se completa la «tríada fatal» de la que habla Parapelius Necromantius. Es todo lo que puedo decir.»

Cuando hubo terminado su relato no encontré nada importante que decir, y preguntar habría sido una impertinencia terrible. Me levanté y le di las buenas noches de tal forma que pudiera captar la compasión que sentía por él; en señal de agradecimiento me dio un silencioso apretón de manos. Aquella noche, en la soledad de su tristeza y remordimiento, entró en el reino de lo Desconocido.

FIN



Biblioteca Digital Ciudad Seva
Quando minha mãe morreu eu sonhava com ela de forma contínua, em cenários quase iguais. Ela era uma pessoa bem simples, e no sonho eu conversava com ela à hora do almoço, frente a frente, as mesas com vasos de flores, o tilintar dos copos, aquele burburinho de almoço de domingo. Lindas varandas de restaurantes em tons rosas. Ela morreu em novembro e passei meses a encontrá-la em sonhos, em conversas infindáveis, onde falávamos das coisas como se ela estivesse acompanhando a minha vida... Um dos últimos sonhos terminou quando ela disse: não esqueça que amanhã é aniversário do teu pai. Ele ainda estava vivo. Vinte e três anos depois da morte do pai, comecei a recordar o aniversário muitos dias antes... Dias e dias tecendo esta saudade que não acaba nunca. Cem anos. Há cem anos o pai nasceu para viver setenta e sete anos de uma vida singular... Antes de ir para a montanha das caçadas eternas encontrá-lo, quero contar sobre sua vida rara... Bem mais do que já fiz em alguns poemas e no livro - Paraísos de Pedra. Feliz aniversário Sr. Ladercio, onde quer que estejas... Sinto falta do teu beijo em minha testa... E da tua gargalhada... E de ouvir tuas histórias. Você foi o Google da minha infância... Ensinou tudo e o mais lindo, a amar a Poesia. Beijos e beijos da tua filha, meu velho centenário...
"Tem um homem ali, sentado, o jeito de sentar-se na cadeira de balanço é inquieto. Ele dobra as mangas das camisas até os cotovelos. Ele lê um livro em entrecortados espaços. Para, reflete, acende o cigarro de palha, olha pela janela, volta a ler. A cadeira range e ele não se desliga - nem da vida, nem do livro. A mão que segura o livro é morena e áspera. No dedo anular esquerdo um anel cobre a aliança de casamento. Ele pode passar a manhã inteira mergulhando seu olhar nas palavras. A cena lembra a sua maturidade, quase velhice. Ele nunca se tornaria um ancião curvado. Morreu de amor quando a sua amada imortal - minha mãe - morreu. Definhou, foi ao encontro dela na montanha das caçadas eternas – o paraíso indígena. Aquilo que lhe segredaram os meninos da tribo que foram seus vizinhos em São Jerônimo da Serra. Ele sempre me contava que os índios acreditavam que o paraíso era uma montanha onde se caçava eternamente."
Bárbara Lia
Paraísos de Pedra - Penalux (2013)


sábado, 19 de março de 2016

VESTES

Os panos nus.
Nenhuma imagem sangrando na pele
de tecidos prontos para o afago.
Recito essa nudez com um par de asas.
Um demônio agachado,
colando os lábios nos meus.
De onde me vês serei um córrego de ossos,
calcinado deleite de tuas almas,
umas poucas, as que não souberam
preservar o horror que as antecipa
e compreende.
Rostos engordurados em cerimônias…
E como te postas, demônio,
mordendo-me os seios, como te postas?
Um olhar a escolher ossos.
Carvões astutos e conhecedores da fábula.
Vê bem o que trago comigo,
este corpo minguado em débeis luas.
Preparas uma pele para mim?
Dá-me tuas facas, esporões, chifres,
a ponta imperfeita de teu falo.
Vês como me faço em mil coxas,
viscosas como iscas, e todas soletram
a queda que anuncias.
Os panos
sobre o vazio, nus.
Equilíbrio voltado para o chão,
rostos desfeitos de vítimas que não alcançam mais ofertório, o pé de um deus encontrado em escavações, por onde me sagras,
puto demônio,
por onde
me despedaças desejosa de tua saúde.
Meu corpo em lascas, santuário decrépito
de tua perversão,
cascos me arranhando o tecido da memória, sim,
uma mínima dor palmilha insuspeitas procedências,
e sabes o quanto me dói tua abundância,
o pote que indicas e ansiosa ponho-me a buscar ali a resposta para o aflito cultivo
de dores
por todo meu corpo.
Carrego comigo todas as formas
com que me atacas.
Quais máscaras perpetuamos, as minhas, as tuas?
Meus lábios te queimam a pele.
Óleos acesos enquanto nos desfazemos.
Os panos como papiros, inscrições invisíveis que ensinam a manter quente a cabeça de um deus morto.
Nus.
Com a medida do inferno de cada dobra
do tecido de que somos feitos.

-
***
-

VESTIMENTAS

Paños desnudos.
Ninguna imagen sangrando en la piel
de tejidos listos para la caricia.
Recito esa desnudez con un par de alas.
Un demonio agachado
pegando sus labios a los míos.
De donde tú me ves, yo sería un arroyo de huesos,
calcinado deleite de tus almas:
unas pocas, las que no supieron
preservar el horror que las anticipa
y comprende.
Rostros engordados en ceremonias...
¿Y cómo te ubicas, demonio,
mordiéndome los senos, cómo te ubicas?
Un mirar para escoger huesos.
Carbones astutos y conocedores de la fábula.
Mira bien lo que traigo conmigo:
este cuerpo menguado en débiles lunas.
¿Preparas una piel para mi?
Dame tus cuchillos, espolones, cuernos,
la punta imperfecta de tu falo.
Ves cómo me hago en mil muslos,
viscosos como cebos, y todos deletrean
la caída que anuncias.
Los paños
sobre el vacío, desnudos.
Equilibrio derrumbado hacia el suelo,
rostros deshechos de víctimas que ya no alcanzan el ofertorio, el pie de un dios hallado en excavaciones por donde me consagras,
puto demonio,
por donde
me despedazas deseosa de tu salud.
Mi cuerpo en astillas, santuario decrépito
de tu perversión,
cascos arañándome el tejido de la memoria, sí,
un mínimo dolor recorre procedencias insospechadas,
y sabes cuánto me dolía tu abundancia,
el pote que indicas y, ansiosa, me lanzo a buscar allí la respuesta para el afligido cultivo
de dolores
por todo mi cuerpo.
Cargo conmigo todas las formas
con que me atacas.
¿Qué máscaras perpetuamos: las mías, las tuyas?
Mis labios te queman la piel.
Aceites encendidos mientras nos deshacemos.
Paños como papiros, inscripciones invisibles que enseñan a mantener caliente la cabeza de un dios muerto.
Desnudos.
Con la medida del infierno en cada pliegue
del tejido de que estamos hechos.

-
***
-
Poema de Floriano Martins © 2004 ARC Edições
Fortaleza, Ceará

Tradução ao espanhol, por Jorge Ariel Madrazo

A Lenda dos Balões com Alianças


Depois da lenda do padre que voou
Com balões de aniversários coloridos,
O céu do Paraná, agora, se abalou
Com alianças em balões atrevidos!
Num dia ensolarado repleto de paz
Um romântico e sonhador rapaz
Queria surpreender sua namorada
Com uma surpresa inusitada e armada:
Colocou duas novas alianças
Nos balões cheios de esperanças
Os balões entrariam pela janela
Da sua amada doce, singela e bela
Mas os fios arrebentaram e os balões foram ao ar
Foi o cupido revoltado que soltou as bexigas ao luar
Porém o moço desesperado postou tudo num grupo virtual
Assim ele foi presenteado de uma forma especial
Uma joalheria ao ver a sua agonia
Deu novas alianças de prata
Repletas de emoção e poesia
Como uma eterna serenata
Os balões com as alianças foram parar no céu
Deste jeito ele chegou ao reino do Beleléu
Mas o Padre dos Balões com sentimento
Recolheu esta bexiga que estava ao vento
Agora o sonho dele é realizar este casamento.

Luciana do Rocio Mallon
Bárbara Lia


Uma libélula entrou ontem e passou a noite aqui. Levei um susto com o barulho dela no teto, quis ajudá-la a sair e abri a janela, mas as luzes da outra sala a levaram casa adentro. A libélula integra meu romance "As filhas de Manuela", ela sempre aparece em momentos cruciais de Manuela, pois a Libélula é símbolo de renovação. Sinal de bom tempo após tempestades... No Japão simboliza coragem, força e felicidade. Hoje eu a encontrei pousada na cortina, e a libertei para voar no azul da manhã...

Ser coxinha é uma escolha

Leandro Borgonha

Ser coxinha é uma escolha.
Eu sou classe média. Minha bunda foi tratada à talquinho. Estudei em escola particular e cara. Frequentei clubes burgueses na infância. Cresci lendo a Veja e assistindo a Globo.
Tenho casa, carro, a comida que quiser e roupa lavada, que hoje lavo eu mesmo por opção e não por condição.
Tenho uma lista imensa de privilégios.
Posso comprar livros, ir a cinemas, viajar.
Quando chove só fecho a janela, não tenho goteiras no teto e nem corro risco de inundação ou soterramento.
Da minha torneira sai água sempre.
Minha filha tem um iphone e estuda em escola particular.
É justamente por estar nesse lugar privilegiado que sempre me senti na obrigação de estudar e compreender a desigualdade social.
Educo minha filha para que entenda que nossa sorte nos obriga a sermos conscientes do sofrimento que nosso privilégio acarreta. E que por isso precisamos reverter nossa oportunidade de estudo em benefício de quem foi e é submetido a condições sub-humanas.
Nunca me permiti perder a indignação e revolta diante da desigualdade social. Talvez por isso tenha me tornado artista.
Ser coxinha, fascista, egoísta, são escolhas que fazemos todos os dias quando deixamos de defender quem está sendo oprimido, de todas as formas.
Tenho muito que melhorar até desconstruir toda a elitização em que fui criado e ainda vivo.
Mas não me permito ser feliz e ficar passivo enquanto não houver democracia de direitos e igualdade de condições.
Quem tem privilégios devia encabeçar a luta por aqueles que não tem, afinal a barriga está alimentada e a cabeça deveria estar esclarecida.
Ser coxinha é uma escolha. E eu decido, por princípios, comer mortadela.


(Adaptado por/para mim, a partir do texto original de Dani Nefussi)
antes procurava minha amada
chorava pelos cantos e campos
caminhava longos trechos
em busca de um pretexto
lia livros e buscava nos textos
um único significado
o amor...
agora caminho lado a lado
reparo nas pequeninas flores
suas belezas, seus aromas...
vejo encanto com todos
os cantos das aves
nos fins das tardes
deste findo verão.
Amaury Nogueira
Poeta Paranaense
toda palavra é um risco
ando espantada com a morte
em sua toga preta
a cara é do capeta
os olhos do cão curisco
toda palavra é um risco
toda palavra é cilada
o estrume com a mão armada
mata somente por vício

Federika Lispector

Lumieiro

Pela mata escura
Piscam, dançam lindas luzes
Vagam vaga- lumes

Angela Gomes

Fonte : bardo escritor

quinta-feira, 17 de março de 2016


O certo é louco tomar eletrochoque
andar com os pés descalços
em noites de tempestade
eu quero o choque
- na carne -
que acorde
espasmos nos músculos
devolva ritmo
ao coração
improviso, improviso
até o lábio
simularia um riso
eu quero o choque.
***

Eduardo Lacerda



indigNação


meu coração é par/tido
desde que incestaste o golpe
e não é de hoje
não me engano
que esse seu plano
urgido no calabouço
cassaram meus 20 anos
quando por baixo dos panos
botaste a grana no bolso
do puto que te bancou
Gigi Mocidade


A Lenda do Pi e Dona Pilar


Nos anos setenta existia uma menina chamada Pilar e seu apelido carinhoso, na escola, era Pi devido a primeira sílaba do seu nome. Um certo dia na aula de Matemática, a professora deu aula sobre o  π , o infinito número que começa com 3,14 e que se pronuncia “pi”. Então quando a professora deu esta explicação todos olharam para Pilar e exclamaram:
- 3,14...!
Assim a garota passou a sofrer este tipo de bullying , pois era chamada de 3,14... o tempo inteiro.  Sem falar que a menina fazia aniversário Dia 14 de Março que, por coincidência também é comemorado o dia do Pi, o eterno 3,14. Um certo dia, a direção convidou um cientista para dar uma palestra na Feira de Ciências da escola e Pilar ficou responsável por recepciona-lo. Deste jeito, a jovem pensou:
- Aposto que este pesquisador deve ser feio e chato.
Logo chegou a data do evento científico e Pilar ficou na porta para receber o palestrante. De repente um homem muito bonito, saiu de uma limusine, e falou para Pilar:
- Bom dia!
- Eu sou o cientista que fará uma apresentação na feira de Ciências.
Esta donzela ficou sem graça porque o moço era muito lindo. De repente, uma colega gritou:
- Pi !
- 3,14!
A garota respondeu:
- Desculpe, não posso conversar agora porque estou atendendo ao pesquisador que dará a palestra principal.
Naquele instante o cientista indagou com um olhar apaixonado:
- Por acaso, seu apelido é Pi e, também, 3,14?
A adolescente abaixou a cabeça e respondeu:
- Sim.
Logo o rapaz explicou:
- Eu sou apaixonado pelo Pi, o eterno número 3,14... Sempre sonhei e imaginei que ele fosse uma mulher que seria minha eterna namorada.
Seis meses depois, este cientista e Pilar se casaram.

Luciana do Rocio Mallon
É sempre bom ter um potinho de leite condensado para momentos de crises existenciais... Conheço um cara que um dia resolveu se matar. No entanto, antes ele pensou: que tal acabar com esse leite condensado aqui da geladeira? Depois de se melar todo, parou, refletiu um pouco e resolveu dar mais uma chance à vida. Afinal, se ainda eram possíveis prazeres simples como o de deleitar-se com leite condensado, ainda valia a pena viver... Por isso, quando eu for ao mercado vou me reabastecer de uma boa quantidade de leite condensado.

Otto Leopoldo Winck


SER POETA


Ser poeta
é não aceitar
que tudo passa
e que neste passar
passaremos também.
(Este instante, este sol, esta contração no teu rosto
– para onde vão? para onde foram?)
Por isso, obstinado,
gravo na casca do tempo
– que cairá também –
meu nome e o seu:
as sanhas desse momento
nas senhas deste poema.
Passaremos, meu bem.
Mas enquanto não passarmos
brilharemos
– alto, bem alto –
como o sol.
Otto Leopoldo Winck


Otto Leopoldo Winck


Lua. Uma é a lua que vejo, outra a lua que escrevo. E nenhuma delas tem relação com a lua real para além da visão e da escrita. O que isto quer dizer? Que a literatura não tem nada a ver com a vida? Não necessariamente. A literatura ora vampiriza a vida, ora a ilumina. Representação e transfiguração -- eis o efeito da literatura. O poeta é pintor e xamã. Testemunha e bruxo. Lua. Que lua é esta?
entre uma noite
e outra
um ligeiro fulgor:
esta é a vida
isto é tudo
que temos
e somos
por isso vamos dançar
ébrios da luz
dessa chama breve
que a vida
é este pouco
este quase nada
isto é tudo
e este tudo basta:
uma chama
um chamado
uma dança
de duas breves
borboletas
Otto Leopoldo Winck