segunda-feira, 28 de março de 2016

LIDAS DIÁRIAS NA CHÁCARA

(Lauro Volaco)

Num momento em que grandes discussões são entabuladas sobre o que os pais modernos podem ou não solicitar aos seus filhos, sem querer realizar um julgamento, pois não é este meu papel, quero contar para vocês o que nós fazíamos de útil em nossa infância. Vale ressaltar que tínhamos um caseiro e que uma grande gama de serviços do dia a dia, era feita por ele, mas acredito que por medida didática, nosso pai instituiu várias atividades para que nós as realizássemos. Eram medidas que ele estudou a viabilidade técnica, econômica e educativa, estabelecendo as rotinas, sem querer saber se eram do nosso gosto ou não. O argumento que desconhecíamos, mas ele não, deveria ser o seguinte: vocês quiseram ter esta área, que era uma dádiva para nós e nossos amigos, agora repartam os cuidados para manutenção comigo. Mas isto que acabei de falar é uma inferência minha, pois nunca nos foi dita.
Uma atividade diária e que era repetida no período da manhã e no final da tarde era recolher todos os ovos dos cinco galinheiros. Isto deveria ser feito com uma série de cuidados, para evitar atropelos e muita agitação das muitas galinhas e dos poucos galos. A quantidade de ovos era enorme e, dentre aquelas aves, as que paravam de botar eram as primeiras a encontrar o caminho da panela, pois a questão era produtividade, sem protecionismo.
Outra atividade, mais divertimento que obrigação, era irmos todos os dias, no início da manhã, ver nosso pai a ordenhar a vaca e nos dar o leite para bebermos, ainda quente e tirado na hora. Enquanto aquilo acontecia, íamos buscar o milho com palha e sabugo, para alimentar a vaca. O bezerro tinha hora certa para mamar: antes da ordenha para soltar o leite, e depois de tirada a quantidade suficiente para o nosso uso, pois o restante pertencia a ele.
Colher frutas quando amadureciam, com todo o cuidado para não bater umas contra as outras e levar para casa para serem comidas ou transformadas em doces caseiros, os quais eram armazenados em caixetas de madeira ou vidros de compota. Todo o trabalho de descascar, com a vigilância muito próxima de nossa mãe, era feita por nó, e todos os restos, dados para os porcos, o que possibilitava a perda zero e eliminação de resíduos. Em algumas frutas, esse trabalho era muito penoso, como os figos verdes, que soltavam uma espécie de leite ácido, tinham que ser descascados com lâmina de barbear, bem fininha para não ferir a fruta, que iria se transformar em belíssimas e gostosas compotas. As nossas mãos ficavam ardendo e dava a impressão que havia sido queimadas com aquele líquido, agressivo à nossa pele. Os excessos das frutas produzidas abundantemente em nosso pomar, depois de termos usado tudo o que queríamos, eram doados para os alunos da Escola Rural, a todos os vizinhos, a quem as pedisse, e ainda sobravam muitas, com as quais alimentávamos os porcos criados no mangueirão e nos chiqueiros de engorda. Havia épocas que até os porcos recusavam comer, principalmente peras, pois a quantidade era tão grande, que até eles enjoavam.
Certo dia, eu, metido como era, resolvi realizar um trabalho que não estava no planejamento de meu PA para que o fizesse. Vocês conhecem um tipo de foice pequena e em arco, usada para cortar grama/capim para dar aos animais? Nela havia um serrilhado para ajudar na hora do corte, que ficava do meio para a ponta da ferramenta, com a qual. Armado, juntei um maço de capim e passei o instrumento, esquecendo-me que o meu dedo mínimo estava na linha de corte. O sulco foi tão profundo que deu para ver o osso na hora em que foi lavado o ferimento. Mas o difícil mesmo foi ter que procurar os pais para tratar daquele corte e ainda dizer que estava desobedecendo a uma ordem recebida. Daquela vez, acredito que por dó da dor que senti, não fui castigado nem levei uma surra. Mas até hoje tenho uma redução da flexibilidade e força no dedo ferido na ocasião Dura forma de aprendizado, mas muito eficaz, pois nunca mais fiz isso ate hoje.


HISTÓRIAS DE UM PIRAIENSE.

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