quarta-feira, 20 de novembro de 2013

volto para o dia de ontem, em que abro a porta e entro. fim de tarde, não bate sol, o apartamento é um freezer. acendo a luz. largo o saco de pães na mesa de toalha florida. dispo-me da japona. passo a mão no excesso de água da cabeça. enxugo na calça. a xícara. abro a garrafa térmica e me sirvo. arranco um pedaço do papel toalha. assôo o nariz, estou gripado. o corredor e o escuro quarto. olho a foto no porta-retrato: três anos de idade, bermudinha preta, coxas grossas, joelhos engruvinhados, meias brancas, sapatos tipo botinha ortopédica, camiseta azul escura por baixo do casaquinho de fio. noutro, o meu aniversário de nove anos. todos nós sujos e suados de correr pela chácara, terreno protegido por pinheiros. finais de tarde úmidos de sereno, a pândega de quero-queros tristes dentro do rigoroso inverno. e as lavagens dos porcos que a gente fazia com os restos que sobravam dos restaurantes do bairro. nauseavam-me. gostava de olhar a geada pela manhã. eu não chorava. nada no mundo era uma resposta, muito menos uma pergunta.

Luiz Felipe Leprevost

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