Bárbara Lia
Pensei em Dora, que atirou-se nos trilhos de trem da estação
de metrô Charlottenburg, em Berlim Ocidental. Banida, exilada, e pensei na
verve literária, os revolucionários, manifestantes, os "terroristas"
eram mentes pensantes, e por um sonho utópico, morreram, incinerados em suas
almas, contra todas as possibilidades, Dora escreveu - “Foram intermináveis
dias de Sodoma. Me pisaram, cuspiram, me despedaçaram em mil cacos. Me
violentaram nos meus cantos mais íntimos. Foi um tempo sem sorrisos. Um tempo
de esgares, de gritos sufocados, um grito no escuro”.
Pensei nas - Moças de Minas - que me fizeram chorar noites a
fio quando li o livro de Luiz Manfredini. Os alicates torcendo seus mamilos, as
baratas colocadas em suas vaginas, os estupros, a aniquilação, o grito.
Pensei em Iara, bela Iara, Iara amada de Lamarca, que puxou
o fio para um país mais justo e foi aniquilada friamente, em um lugar tão longe
das horas resolutas, longe de São Paulo, enfurnada no labirinto. O homem
pisando na lua, e ela no espelho quebrado, onde tantos foram abandonados,
acossados, fuzilados.
Pensei em Sonia que era a amada e na mãe que era guerreira,
pensei em Angels, de Stuart, o corpo ralado no pátio, e a fumaça tóxica na
boca.
Eram tantas mulheres e eu penso nelas, e nem preciso evocar
a DIlma, e nem precisa. A Vera paralisada por eletrochoques, as mães no
corredor polonês, e crianças ultrajadas, sim...
Bateu uma tristeza do tamanho da Pátria... Bateu tão fundo,
e esta coisa vai corroendo, e vai minando qualquer esperança, e todo sentido
vai desabando... A ignorância diz que deviam ter matado todos em 1964. Por
Deus, os anos foram todos de extermínio. Esta coisa tão patética e incoerente,
de quem pensa a ditadura como um dia, um mês, um ano em 1964 e nem sabe de Tito
e sua dor em Fleur, de quando lhe doía saber que na França, flor lembrava
Fleury. Todos os ossos da alma quebrados... E então, enforcar Herzog não
bastou, insulto grotesco a quem foi jornalista como se deve ser. Insulto,
escárnio.
Eu estou triste, e até poderia perdoar tanta ignorância
sobre a própria Pátria, mas, é só o estandarte do bloco do fascismo. Era só a
estampa do pensamento de tantos, então, eu estou triste e me permito ficar
triste, e vou continuar um tempo ainda, imensamente triste.
e só falei de algumas mulheres, é pouco mais de quatrocentas
vidas?
este ultraje não devia passar em branco, no entanto, fica
assim, nada acontece, além desta tristeza que persiste...
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Quando eu estudei - sim - era tudo calado, e
criaram matérias como OSPB e aquelas tentativas de imprimir uma moral cívica,
enquanto escondiam o que acontecia...
Dei aula de História, e é tema nos últimos anos
do Ensino Fundamental e Ensino Média. Quem Estuda o Século XX passa por todas
estas revoluções... As Guerras Mundiais, a Revolução Cubana e nosso governo
ditatorial...
Bárbara Lia