sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Sábado à noite



Sábado à noite. Uma gripe, uma tarde de oficina e uma mudança interminável. No centro, entro numa lan house (acho que sou o último moicano a frequentar lan houses), dou um rolê nas notícias, vejo que o mundo não mudou e que a ignorância e a intolerância grassam por aí. Penso no Álvares de Azevedo, nosso Byron tropical, sobre quem dei aula ontem ao ar livre e deve ser o culpado por esta minha gripe. O cara morreu com vinte anos e deixou uma puta obra. Já tenho mais que o dobro da idade dele e cadê minha obra? Ah, não deu pra ser Rimbaud, como eu sonhei aos 17, e agora nem Baudelaire... Sim, perdi minhas melhores horas com literatura e em discussões inúteis... A lua está cheia, eu vi, minha cabeça estoura de dor, meus pés estão exaustos dentro do tênis que calcei de manhã e ainda não tirei. Me arrastarei até o ponto para ir ao meu novo apartamento, onde não caberão nem metade dos livros que acumulei nos últimos vinte anos. Penso que tenho acumulado coisas inúteis ao longo da minha vida: livros, lembranças, versos... Uns acumulam bens, capital e recomendações. Eu acumulo trastes. E trastes tristes. O maior deles é esta saudade inominável. Ah, meu Deus, como gostaria de arrancar a lua do céu e colocá-la no alto do teu quarto para que não duvides nunca que há um poeta que sonha escrever a última epopeia do mundo na alvura frágil de teu corpo insone...

Otto Leopoldo Winck


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