domingo, 31 de março de 2013

PANCRÁCIO



De Otavio Linhares

PANCRÁCIO, meu primeiro livro.
revisando-o pela última vez me vejo de frente para este capítulo. ele me dá mais medo hoje do que quando foi escrito.

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33

grandes convenções escorrem pelos lábios. postulações frases enigmas. pústulas. de onde estou parecem micróbios com pernas muito pequenas que fazem cócegas ao caminharem pela minha orelha. vêm da superfície da garganta. da parte mais rasa da alma. entre o nariz e o cérebro. e você ri. e você ainda ri. são muitos. um exército desordenado capotando. reproduzem-se por capotamento. movimento caótico o ar se ejacula das narinas em bufadas. faz-se a mistura na frente dos olhos. vento oxidado nos pulmões retorcido na base da cabeça e bichos com perninhas. esses são seus filhos. damos as boas vindas todos juntos. somos todos felizes porque sim. as mãos se tocam. as veias fervem. vemos os sangues esquentarem o clima. é o fim da tempestade. sim é o fim da tempestade. pelo beiral do meu cativeiro meu muro minha morada sim amo este lugar vejo escultores em massa regurgitando a seiva da origem em recipientes de alumínio e o cheiro da morte que eu ainda não conheci e da vida que se esvai todos os dias amém se descola da coisa que fermenta e somos todos de volta muito gratos e muito felizes e alguns do exército pedem mais e vibram e têm a certeza. a convenção é maior e tem mais poder. me afundo na minha trincheira e começo a orar e a minha oração é fraca porque meu deus não existe e peço perdão e do fundo do corredor os convencionistas me enviam mensagens de amor e o cheiro chega até mim. é hora de se alimentar. não viro o rosto. abra os olhos. eles me alimentam. não agradeça. não faço isso. respiro e a mistura se faz na base da cabeça e a superfície da garganta se veda. volto novamente e de novo mais várias vezes e não tenho mais fome. e não tenho mais medo. não tenho mais nada.

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