quinta-feira, 18 de junho de 2015

sim, o negativo é infinito.
por exemplo -
você está sem ideias para escrever uma peça?
comece pensando em uma empresa
qualquer empresa falando para seus
funcionários - "a (...) é uma grande família"
qual o macete?
é que esta frase já nasceu profanada,
ou seja, sabemos que trata-se de um
grande absurdo comparar uma empresa
com uma família de verdade
(reunião de pessoas que se relacionam por laços afetivos),
nosso sistema já naturalizou
a forma como ouvimos "a (...)
é uma grande família" -
os anticorpos da nossa memória
já não encaram mais a crítica a
essa estrutura como crítica -
não adoecemos por isso.
portanto, a questão não é mais dizer
"olhem que absurdo isso"
ou "que foda viver assim"
(este tipo de crítica já foi
absorvida pelo mesmo sistema
que vende camisetas, séries animadas
e cria memes na internet sobre -
o que pode ser muito divertido)
a questão é instalar um novo vírus
para devolver a família real
uma forma nova de sentir dor.
para que fique insuportável
ouvir a frase "a (...) é uma grande família"
para que a autonomia de reconfigurar
pelo menos o software da estrutura
"a (...) é uma grande família"
retorne ao sujeito
simplesmente.
isso se consegue desarmando estruturas com
outras.
isso NÃO se consegue reiterando as mesmas formas de
criticar.
embora a gente ame o Tom Jobim, por exemplo
sabemos que tocar bossa nova no boteco
só irá criar mais morosidade cultural,
(e os donos de bares temáticos, inclusive,
AMAM esse tipo de situação)
não estou falando em esquecer o legado
de um grande compositor
MAS
mostrar uma multiplicação de tons jobins,
melhor
um tom jobim gigante colonizando SP
com acordes de bossa nova, essa réplica
banhando a av. paulista de uísque
elevadores tocando "garota de ipanema"
em ritmo de luto, numa tonalidade menor
tudo dentro de uma estrutura crível, fora
do esquadro fantástico...
CARALHO!

(É disso que trata minhas duas últimas peças que pretendo encenar com a Amanda Mantovani e o Bruno Ribeiro)


Alexandre França 

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