Cipreste é uma árvore que impressiona. Penso nos ciprestes
das pinturas de Van Gogh. Ciprestes e velas. Os cabelos em fogo do pintor
holandês. Girassois. Ciprestes plantados em cemitérios. Um atrás de outros,
ciprestes surgem na larga avenida, quase humanos. Apenas uma das árvores foi
entortada pelo vento. Vi e ouvi tanta coisa em uma semana e só olho o cipreste
torto. Nesta vinda a São Paulo não fui nem uma vez a uma exposição de arte. Por
acaso, fui à Avenida Paulista e fiquei feliz por estar zanzando na hora do
rush. Estava indo para Belém do Pará e todos estavam voltando, como cantava um
monstrinho da Vila Sésamo, quando eu era criança. Há uma multidão voltando pra
casa depois de cumprir as obrigações sociais. Há outros que pararam em cafés ou
em bares. Entrei na livraria para buscar um livro e me senti em ambiente
familiar.
Em Vinhedo, olhando para o cipreste entortado pelo vento
pensei em coisas difíceis. Soube que a cidade abriga condomínios de luxo. Vi
que há um mosteiro beneditino, mas não tive tempo de visitar. Vim para um
evento literário, conheci grandes escritores e o cipreste torto é o que mais me
impressiona. Por causa do cipreste torto, percebi que não tenho vocação
literária. Há tantas coisas que não sei fazer. Sou mais leitora que escritora.
Há os que falam tão bem. Alguém fala comigo de vez em quando, perguntando sobre
pessoas que conheceu de passagem. Não sinto desconforto em estar aqui, não
quero voltar correndo pra casa. Penso que não consigo ter uma carreira de
escritora porque fico a maior parte do tempo lendo, em vez de escrever. E
quando estou num evento, em vez de conversar com outros escritores, trocar
figurinhas, apresentar meus livros, fico calada ou me distraio com um cipreste
torto e os rabiscos de uma criança. Vou embora levando um montão de livros -
sempre juro que não vou levar nada, os meus não consegui vender - e uma ideia
vaga de que a vida literária não combina comigo.
MK
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