domingo, 12 de fevereiro de 2017

ADUMBRA

"Mas como nós falássemos a mesma coisa
as mesmas coisas mesma língua & dialeto
parecia possível retratar as margens

de cada termo contratar o nosso acerto
nas mãos do mundo & apertarmo-nos as mãos
entre toques & dedos & a carícia calcinada

dos dias numa nova ordenação do cosmo
então num gesto fácil nomear o mundo
flores de toda espécie com seus gostos cores

seus caules folhas frutos formas invisíveis
ou que nunca aprendemos por nunca querermos
por só preguiça de androceu & gineceu

seus novos nomes poderiam ser mais nossos
ao inventarmos juntos palavra a palavra
toda a sintaxe enquanto descemos a senda

encravada de asfalto nos veios da serra
neste carro qualquer os pés esvanecidos
por baixo do painel as mãos ainda pensas

ainda que sentados o olho sobre o vidro
anuncia a tormenta cinza sobre a mata
compostos de amarelo & púrpura & carmim

preenchem o que resta no pouco de céu
que ainda se desnubla neste fim de dia
enquanto desbotoamo-nos nalgum sorriso"

Trecho do  ADUMBRA | de Guilherme Gontijo Flores

[ edição da Contravento Editorial]


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