eu, que conheço o enigma das linhas
que cresci vendo carreteis desenrolarem-se nas máquinas de
costura
vendo a paixão triste -
o sentimento de sombra que as mulheres cultivam pelo
inconsútil / em silêncio, em segredo
/ à intermitência dos ciclos de seus fios
de sangue /
eu, que sei que sou
como elas - as mulheres de ontem
-
e que venho ferida do enigma
das linhas
e que por vezes penso que qualquer palavra que designe fogo
pode ser uma versão
mais rudimentar do teu nome - eu, que digo teu nome assim,
suspenso
à linha do horizonte
ferido pela tênue incisão
do pássaro
-
"pampa, estou me dessangrando em teus poentes" -
assim escreve jorge luis borges
num poema que não me sai da cabeça há semanas
(...)
esta noite me deito contigo
e descubro com a ponta dos dedos
pelo tato
as linhas da palma da tua mão
sei que não tenho muito tempo
amanhã, à luz do dia, outra mulher te encontrará e lerá
nessas linhas todo teu futuro -
que leia
ao amanhã o amanhã
sei que é noite, amor / é noite, ainda
e, se me deito contigo, é porque aprendi a te amar assim, no
escuro - à sombra do teu primado
de lábios
do húmus
se me deito contigo, é para amar-te ao meu modo: um pouco
antes do início
do mundo
antes que deus separasse as duas águas com o arco
e as chamasse de céu e de mar
os teus olhos e os meus
Marceli Andresa Becker
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