"Tive uma bicicleta azul. Sem freios. Na
descida, enfiava o pé direito no pneu traseiro. A magrela relinchava sob o
atrito da sola do bamba, kichute ou chinelo de dedos. Amansava a fúria na
marra. Bem cedo, a neblina na cara, despencava pela ladeira em direção à
fábrica de móveis de bambu. A marmita sacolejava na mochila às costas, à espera
da fome que sempre chegava. O freio quebrara na caixa do pedal — quase impossível
consertar. A herança me chegou estropiada. Antes um trajeto desgovernado pelas
encostas da infância que alguns quilômetros a pé."
- Rogério Pereira, na crônica "A bicicleta
azul" - Vida Breve
fonte ; Jornal Rascunho
Nenhum comentário:
Postar um comentário