domingo, 24 de fevereiro de 2013

Dois Poemas de Frio e de Dor



Assis de Mello
Poemas do meu livro "Na Borda da Ilha"
 (sem a formatação original )
 

1.
Remexo a gema
da noite
antes do tédio
da clara manhã

: têmpera fosca
de antimônio e caulim

–quantos fantasmas
reviram nos caleidoscópios
e se desmontam
pra depois se recoserem
numa falange de proteus?!

Hora de hulha
povoada de folhas
e sarridos

Hora de unha
motinação
e esgarçadura

Explode a laca
pra fora de mim

e é assim
que me aplaino:

cochonilha atada à raiz da geada

2
Marés de sizígia
chumbo de águas-vivas
e de polvos
Chumbo de tentáculos

A caravela portuguesa
não se presta à poesia
–é eminência de ardume –

Quisera estrondar-me
como a jubarte
que se atreve no ar

esgueirar-me
–anguila –
nas fendas do coral

arrancar-me
feito um raio
de peixe prata

E não ensimesmar-me
como um gastrópodo
na concha
sem o mar

O teredo da morte está na madeira do leito, está na quilha do navio. Mas o amor golpeia mais forte nos lambris do sonho. E eu ouço a noite rasgar-se no talha-mar de uma proa*

* Parágrafo da parte 5.2 da Seção IX (Estreitos São os Barcos) do livro “Estrofe”, de Saint-John Perse. In: Amers - Marcas Marinhas, tradução de Bruno Palma, Ateliê Editorial, Cotia - SP (2003)

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