sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

O dia que o trapezista caiu ( Fragmento)





-Por favor uma Brahma e uma dose de vodca - Pediu ao rapaz do balcão. -Ah sim, umas seis dessas salsichas cozidas – Finalizou apontando pra um desses pequenos balcões térmicos com portas de vidro onde se mantém aquecidos os bolinhos, quibes, coxinhas e outros tantos salgadinhos.


O rapaz olhou aquele homem de certa idade, talvez 61 ou 62 anos e que trazia no rosto as marcas da vida e os vincos do tempo, e a eles se juntam m par de óculos escuros e sua fisionomia lhe era tão familiar que foi inevitável deixar de compará-lo ao avô que falecera um ano antes. De imediato serviu-lhe as salsichas num prato de louça ao supor que eram para o seu consumo, mas não, o senhor apenas pegou a louça e a levou ao animal que o aguardava junto à porta o do bar. Ao vê-lo com o prato na mão o glutão abanou o rabo e remexeu o corpo, ansioso.

- Bruce, vamos ver se consegue dar cabo dessas salsichas - O dono disse num tom carinhoso enquanto acomodava o prato ao chão.

Sim, talvez achem engraçado, mas o nome do cão era Bruce Lee, animal educado e obediente e que sempre permanecia nos locais determinados por seu dono, e de lá só arredava as patas sob a sua autorização.
Portanto o submisso Bruce cheirou as salsichas com satisfação, lambeu-as e depois iniciou o processo de devorá-las. Voltando da porta o senhor adentrou ao bar caminhando na simplicidade dum estreito corredor que abrigava meia dúzia de desconfortáveis banquetas concretadas ao piso e rente ao balcão. Endireitando o corpo enfiou uma das pernas no vão e sentou-se numa delas e repousou os óculos negros no tampo no mesmo instante que o rapaz trazia as suas bebidas.
Como de hábito tombou parcialmente a vodca do copo na parte baixa do balcão, já que não deixava sua santa de devoção sem o agrado de sempre. Com Rita de Cassia servida emborcou o que restara e retornou o olhar para o Bruce que, pego de surpresa protegia suas salsichas dum outro cão que surgiu do nada com a clara intenção de lhe surrupiar a refeição.

Situação inesperada, Bruce não esboçou qualquer reação, salvo a de apenas olhar para o prato e para o invasor que se se aproximava sem cautela. Quem visse a cena e observando a reação de Bruce não duvidaria que as coisas não acabariam bem para ele, principalmente levando em conta o seu grau de subserviência e docilidade
Submissão, doçura? Pois bem...Sempre houvera esse questionamento com relação ao temperamento de Bruce - Geralmente quem o olhasse numa primeira vez e naquele seu jeito amistoso e brincalhão logo o imaginaria um cão bunda-mole, desses que amarelam sob o risco. Mas saibam, Bruce, apesar das aparências não era nada disso, pois se mantinha vivo na memória do seu dono o dia que, ainda jovem e de rua surrou um oponente de maior porte e estatura com golpes inusitados e mirabolantes em se tratando de um cão. Após a briga e impressionado com a performance do vencedor que mais lhe lembrou o famoso astro das artes marciais, estalou os dedos para o animal que, aninhando-se ao seu lado ofereceu a cabeça para carícias. Foi dali que nasceu o nome Bruce Lee e uma casinha de madeira nos fundos da sua residência. E talvez fosse o mesmo que o forasteiro espertalhão supôs ao ter maior porte e estatura que Bruce. Porém ao ficar à centímetros do prato de salsichas percebeu que estava diante dum animal que não se intimidava facilmente, e só foram necessários poucos rosnares de Bruce e a exposição de dentes ameaçadores duma mandíbula poderosa para que o bicão caísse na real e percebesse que as coisas ficariam ruins para o seu lado, logo, enfiou o rabo entre as pernas e bateu em retirada.
E assim que o gatuno sumiu o senhor sorriu e Bruce voltou para as salsichas sobreviventes.....
Véio China

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