quarta-feira, 4 de novembro de 2015

Os caprichos de Severino


Severino Arruda era muito apegado as datas e suas respectivas superstições.
No dia de Natal, assistia à Missa do Galo e depois, vestido de Papai Noel, saía pelas ruas distribuindo brinquedos para as crianças pobres. Seu traje guardava em cima do guarda-roupa, junto com a máscara de coelho que usava na Páscoa, que também o levava à rua distribuindo balas e doces para a criançada.
Festas de São João e de Santo Antônio, Severino se caracterizava de caipira, vestia uma velha e remendada camisa xadrez avermelhada, um chapéu de palha carcomido na aba e fazia uma bela fogueira no quintal. Assava batata doce na brasa. Convidava os vizinhos para o arrasta-pé.
Ele era uma figura, um verdadeiro aficionado por datas. Além de guardar todas de cabeça, acreditava nas crendices e respeitava os folclores de todas elas.
No seu aniversário sempre tinha um bolo, por mais simples que fosse sempre soprava as velinhas, mesmo quando se encontrava sozinho.
Nunca deixou de levar uma rosa, sempre acompanhada de um belo cartão de amor e eterna gratidão, para sua mãe no Dia das Mães mesmo depois de falecida.
No Dia dos Namorados, quando lhe faltava uma, não se esquecia de sua ex esposa, levava-lhe uma lembrança, sempre com total discrição, para que o novo marido não sentisse ciúmes.
Dia dos Pais, presenteava o seu com um chinelo de pano, era do mesmo modelo que seu pai usava quando era ainda criança. Nunca esquecera, porque seu pai lhe batia com ele com delicadeza.
Numa tarde, soube que um conhecido havia morrido e já estava terminando seu velório. Severino, saiu às pressas, fazia questão de carregar o morto, segurar em uma das alças, mas, pela pressa esqueceu dos cuidados básicos que um homem como ele deveria tomar, logo numa sexta-feira 13. Quando se deu conta, já era tarde, havia passado debaixo de uma escada que um pintor utilizava para pintar um letreiro de loja. Não teve dúvida que algo de trágico aconteceria em sua vida naquele dia. A poucos metros do incidente com a escada, viu um gato preto atravessando a rua, que seria abatido por um carro em alta velocidade, se o motorista, não tivesse desviado o carro, poupou o gato, mas acertou o Severino na calçada.
Severino, ficou em coma por meses. O destino assim como o Severino era caprichoso, morreu dia primeiro de novembro, foi enterrado no dia 2, dia de finados!

J Damasio , Contos d gaveta , 1997 .

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