quinta-feira, 27 de abril de 2017

Lágrimas de aço



Arte, enfarto
Tanto fato
Destarte parte
De mim

Uno ao isopor
Que como, com
Colheres de dedos

Neoliberais desejos
Paradoxais individuais
De ser feliz

Não sou surreal
Não sou
Sou mal, sou verbal

Tal como o mel
Tal como teu

Suaves espinhos
Crivam destinos, pergaminhos
Civilizações inférteis
Ao som da areia mais fina

Teus óculos caem ao chão
Do papel
Minhas teclas dançam ciranda
Saltando ondas
Tortas, não tortas
Aortas nas portas em quais
Andas
A bater.

Sonho com a árvore
Calejo a alma
Envergo o universo
Para te colher, - fruto
Tão livre

Mãos minhas, meus
Segundos de zelo
Forma estética senão
Apelo
Apenas
A pé
Ao passo do aço crasso
Em lágrimas

Do teu adeus

Anderson Carlos Daniel

domingo, 23 de abril de 2017

MENTIRA


-Eu amo você, poderia ter floreado ou colocado mil figuras de linguagens, mas é exatamente isso que eu quero te dizer.
-E o que eu faço agora? Respondeu ela tentando mostrar certa surpresa Para uma coisa que ela já sabia.
-Agora seria uma bom momento pra te segurar em meus braços e te beijar com o por do sol como pano de fundo, mas isso aqui não é um daqueles romances de bolso que eu costumava escrever só pra poder pagar minhas contas.
-O fato é que eu nunca sei quando você está mentindo ou falando a verdade. Você é um escritor, um contador de histórias, um cara que ganha a vida fazendo as pessoas acreditarem no que você diz.
-isso é um elogio ou uma crítica?
Cronicas de Noites Mal Dormidas

Joe Alvez

sábado, 22 de abril de 2017

OS ABANDONADOS


Certo dia,
a mão do destino,
talvez por descuido,
abandonou-o
nas mãos de uma mulher
abandonada pela sorte.
Em frente a um castelo abandonado,
ela abandonou seu filho
e depois a vida.
Passou de mãos em mãos
e deram-lhe o nome de Jorge,
nome de santo, abandonado.
Estudou em colégio interno,
de meninos abandonados.
Cresceu, sorriu, brincou,
porém seus melhores amigos
abandonaram-no.
Amou, amou, amou feito bobo
e foi abandonado pela mulher.
Hoje, no entanto,
quando a mão do destino
veio para buscá-lo,
não estava sozinho.
Havia três corpos
num terreno baldio,
abandonado,
abandonados.

Luiz Medina
sinto, marília, dizer
que no teu olho apagado
acabo de anoitecer
num mundo vitrificado
na morte mais indizível
de que alguém quer morrer."

RR

Quando uma Amizade Colorida Vira um Casamento Branco



Uma linda amizade colorida...
Sempre chega de um jeito franco,
De maneira leve e atrevida...
Com um fogo nada brando!

Os dois passeiam de mãos dadas,
Pelos parques, praças e jardins!
Como dois anjos de asas aladas...
Sem compromissos fixos e ruins!

Eles se beijam sem saudade...
Eles se abraçam sem dor...
Pois tudo isto é uma amizade...
Sem a depressão do puro amor!

Ela é mais do que a menina do olhar...
Porque é a musa da mais doce íris...
Ela toma banho de cachoeira ao luar!
Porque seu amado é o real arco-íris!

Mas, quando isto acaba em casamento...
Tudo na alma do casal fica branco!
Pois a monotonia é o tormento...
Do arco-íris mais franco!

O branco é a mistura de todas as cores...
Do arco-íris nas amizades com amores!

Quando uma amizade colorida,
Alegre, maravilhosa e divertida...
Transforma-se num casamento branco...
Na praça passa a existir um vazio banco.

Luciana do Rocio Mallon

sexta-feira, 21 de abril de 2017

exercício secreto

Marilia Kubota


para que o céu se move
sem que ninguém perceba
nossos olhos astrônomos
pálpebras coladas
em paisagens de papel e vidro.
para que cuidar de jardins
jamais vistos como os onde
as flores vibram e morrem ?
para que a vida existe e passa :
e só aqui vive
depois tudo passa
e cessa?

(selva de sentidos, 2008)

não consigo ficar livre
do gosto dos outros
o meu e o teu rosto,
superpostos são um ? sol impostor
ou vestígio de algum sentido
pedaços indefinidos
do todo invisível

Marilia Kubota

(selva de sentidos, 2008)



Marilia Kubota


minha palavra não ilumina o mundo. de vez em quando me destranca.

Assim falava Zaratustra



vá até a janela
há dois carros
duas rosas
umas senhoras

algum silêncio
que respira
entre as coisas

Todo dia o poema deixa o sol
para ir ao ocaso.

Adri Aleixo



Anti-terrorismo
o ar está parado
atravessemos a rua
em frente à galeria olido
faz horas que o trânsito também está parado
e disseram que está assim em toda a cidade
há muitos pedestres nas ruas
as narinas que respiram o ar parado
ameaçam se converter em pequenas olarias
os tijolos podem servir de armas
na mão desses desordeiros
o terrorismo sãosos braços abertos
de trinta e nove secundarista
ah se fosse meu filho..!
o terrorismo é essa gente
ainda querer ter direito a férias
imagina se a moda pega?!
dizem que hoje
todos foram liberados mais cedo do trabalho
imagina se a moda pega?!
a copa e as olimpíadas já passaram
mas o risco de atentado continua



 A poesia de Marcus Groza, em mallarmargens:



Bacamarte



Tribuna aberta:
Tumba setembro, tumba setembra
sofre flautos faróis cantares
de pássaros doentes em suas cores.
Metais.
Já passou a hora de brincar.
Já passou a hora de ir embora.
-“Levem os falconetes daqui”-
Sacia suas coisas em cálice afastado
ao afaste de vã felicidade e calça jogada.
“Meu corpo já repousa na sombra do sol.
Eu poderia estar morto.”
Aqui vivo mais que o silencio.
Minha cavernosa membrana
se formam cordas estalagmites
apontados para uma pupila,
com sua espessura
de tato tártaro lago bafo.
Esse trem sentado.
A terra pinta suas ruínas
pelo ventre vento inerte
ao brilho frio de calor de ouro
calor de soja, calor de gola.
A aragem carruagem passa
cigarro largado lagarto
em rochosa pele de combustão
ao gatilho de lábios úmidos.
E das palmeiras se jogam
mosqueteiros vértices nos trópicos.
Uma fria aranha reina colônias ásperas
em secas teias dentro da cabeça.


 O mineiro Lucas Alvim:

eu's



narciso mergulha n’umbigo
e insiste
:
espelho espelho deus
existe alguém no mundo?


* líria porto

RENASCIMENTOS


Tenho, em mim, uma roseira de frutos doces e amaciados
de manhãs inertes - celebrados sem artifícios ou colorações –
poderiam ser encontrados em dias de pouca luz
daqueles esquecidos nos poentes de mármores vazios
quase ao desalento, ricos de madeixas escuras e perfumes de cristal,
tão idôneos em sua ligeireza que entre eles se descobre a água
como um metal de cheiro e calor em seu leito de alvorada.
Foram renascimentos e escutas de uma eternidade vazia
quase opaca na retidão de suas fronteiras, muita saída a sal
e nuvens, circunspecta no eixo maciço da navegação em terra
fria – mesuras e ciência do cotidiano – pássaros e sombras,
fusos e rocas de sabedoria
quase vergando
da alma
a sombra de sua pedra angular - finitude.
Foram nesses estremecimentos de ventos e voltas que estendi
cem contas de fadas e foram uns discursos de meio tempo
regados ao líquido e à nata por ali estremecidos dos corredores
estrelas e parcimônia das vantagens do esplendor da vida
a luta da subsistência
estiagem verde e marinha em beijos salinas
versos que se criam monásticos elásticos
prenhes do desejo branco da liberdade
quando ainda não havia o tempo, o fio e o medo
só essa valente sina de semáforos e luzes
aspirando o anjo em seu pouso branco
outono dedilha sua ventura na laje e no apego.


Jandira Zanchi (A Janela dos Ventos)

imensidão

Marilia Kubota


escalar montanhas
que só o silêncio influencia
reencontrar nas primeiras cavernas
vestígios de eternidades antigas
descobrir novos sentido e limite
além de sombras conhecidas
buscar sonhos que foram
mais que vento um dia:
alimento que a boca queria


(selva de sentidos, 2008)

CELLO


é infinitesimal o segundo do décimo de tempo
em que me rendo à paisagem tardia desses olhos fixos
auréolas escuras de vigésimo de instantes
- antítese no som de cello de Bach e adjacências -
nem todas as reminiscências são castanhas em dó ou Sol
antes, enviesadas, cortam um céu de vadios
e vacilantes arquejos sonados
das suítes ressonadas
pautas embriagadas de fé e fúria
- antes do amor é a fuga -
a esperança única de horizonte inteiro e virgem
adormecida nos cristais perfumados da vigília oriente.

Jandira Zanchi (Área de Corte, Patuá)

Cotidiano XI

Leopoldo Comitti


Não choveu. Apenas
nuvens cobriram o azul
de mestre Ataíde, deixando
sombrias as faces dos anjos.
Não choveu entre os feixes
esparsos de sol. Um desbotado
tom recobre a tela,
como se os adros antigos
impusessem a pátina das pedras
à natureza também barroca.
Guirlandas de flores foscas
aguardam luz, ou o breve brilho
de uma só gota.

Não mais do que uma.

VENENO


por entre as fronhas fortuitas dos anos
-como um bezerro -
bebi o lácteo veneno da dor.

Jandira Zanchi (Área de Corte, Patuá)

pegadas invisíveis

Marilia Kubota

pegadas invisíveis
chuva de outono
de trás da grade do parque
o musgo nos troncos
evoca o grasnar
de patos selvagens
a iogue caminha
pisando folhas secas
entre pingos
o lago revolve
espirais

.
Marilia Kubota

hoje, em vez de usar uber, voltei a usar ônibus e caminhar a pé. e constatei que há ruas (só de condomínios) em que não passa ninguém andando a pé em Curitiba. as movimentadas, em que passam carros, são onde existe vários tipos de comércio.

nas praças não há quase ninguém. e pensa que está todo mundo dentro do shopping ? fui a três, muitas lojas estavam de portas fechadas. não havia tanta gente assim. creio que todo mundo está em casa digitando.

previsão de mim

Sérgio Villa Matta



não alegre, nem triste: nublado
chove a cântaros a oeste de minha alma
mas, molho o rosto e escorro-me como
um passarinho de asas azuis e pequenas fagulhas incandescentes.
o dia é nítido como uma borrasca austral
e o silêncio é névoa benfazeja do relógio tic tac

da sala interior de mim.
Marilia Kubota



 Vou almoçar num restaurante desconhecido e não gosto do lugar. procuro um lugar conhecido para tomar café e vejo que o café mudou. na volta, vou ver as capivaras no passeio público. continuam as mesmas ? não, mudam dia-a-dia. só eu é que não vejo.

AFIAÇÕES DA LÂMINA

Leandro Rodrigues



I

É rápido o golpe
O fracasso
A simetria fria
da dor
O novelo desfeito
O relógio que ousa
girar seus ponteiros
ao contrário
A nuvem que paira
cinza cor de chumbo
e encobre a paisagem
bucólica - anônima

É solitária a agonia
a chuva, a ausência da palavra
[ precisa
a intraduzível morbidez
do todo
um jardim e seus canteiros
em cores vivas.


II

É solitário o golpe
a imprecisão
da dor fria
cinza - do todo
O relógio desfeito
O novelo que ousa
desfiar-se ao contrário
- intraduzível morbidez
[ que paira


palavra de chumbo,
paisagem precisa
que encobre um jardim
anônimo – bucólico


É rápido o fracasso
em cores vivas,
a ausência da simetria
fria - chuva e agonia
como a girar
seus ponteiros
de nuvem.

(L. R.)


de: Aprendizagem Cinza, págs. 60 e 61. Ed. Patuá, 2016.
Marilia Kubota

uma mulher super maquiada como um fantasma aparece no jornal. ela é especialista em algo importante, mas ver a maquiagem fantasmagórica a desautoriza imediatamente para mim. sua artificialidade é revelada de chofre, e também seu trabalho fútil, super valorizado por uma sociedade cujo núcleo é a criação de aquisição contínua de inutilidades

PAISAGEM


A nuvem
é a caligrafia da água,
o chão
é o palimpsesto do tempo,
os olhos alinhavam
os desencontros,
o coração
costura os retalhos.
Nalgum lugar
desloca-se
a paisagem para muito além
de si mesma:
o mundo reverbera
mas nunca se alcança.

 Cleber Pacheco
Se você faz de você uma bolha é uma coisa
Mas saiba que tem gente morrendo no apartamento ao lado
Talvez agora mesmo eles estejam fazendo "aquele" telefonema
Sobre como providenciar tudo e como deve ser a cerimônia
Uma prima já reservou passagem pra o próximo fim de semana
A filha mais nova não se conforma com isso, mesmo quando disseram que depois o quarto ficaria pra ela
E você aí deitada lendo Raymond Queneau como se nada
E uma outra coisa muito pior, sabe o que é?
Se você faz de uma outra pessoa sua própria bolha porque daí não tem mapa de navegação que segure essa onda

Assionara Souza






Deus não é Deus,
ele dizia com os olhos perdidos em mistérios
Se Deus não é Deus quem é Deus?
Quis eu então saber,
Porque um Deus há
Endeusado, enraizado em mim.
"Deus não é como Deus deve ser."
E como deve ser Deus?
Quem é esse Deus que não é como Deus deve ser?
Quis eu novamente saber, porque realmente não sei
Como Deus deve ser, já que Ele vem se metamorfoseando em mim
o tempo todo.
Já foi barbudo, imenso, maior que o coqueiro que era maior que a casa.
Também foi sisudo, de pouca conversa, e ficava o dia todo na praça enlevando os pombos.
Uma vez virou mar, ficou bíblico,pairava nas águas e eu, na praia, extasiada,sem me mexer.
Da última vez, chegou em asas, bateu à minha janela, quando abri, Adentrou a casa e por dois dias inteiros morou na plástica rosa azul ao lado da imagem de Nossa Senhora do Carmo.
"Deus não é Deus'.
"Deus não é como Deus deve ser."
Aquilo retumbando em mim, a igreja lotada, olhares, olhares, olhares.
Criei coragem:
Deus é como Deus é.
Veio o silêncio.
Também era Deus.

*

Lázara Papandrea

Estamos exaustos
de regar plantas
e dores
e de amores
exaustos
de esperar cartas
e livros
e dias melhores
exaustos
de apertar botões
de elevadores,
pôr gasolina
nos carros
de trabalho dinheiro
trabalho
exaustos
de planos
e de metas
e de promessas
exaustos
de verões
e de invernos
e de outonos
e primaveras
exaustos
da procura pelo verso
inconteste
o verbo inconteste
exaustos
de feiuras
e de belezas
e espelhos
exaustos
do exercício
casto da ordem
e da desordem

exaustos.

Katia Borges

MEIA FURADA


Se a meia furou, remenda!
Vai sair melhor do que a encomenda...
Se a vida azedou, insiste!
Passarinho voou, fica sem alpiste...
Eu devo confessar que nos dias de hoje estou meio louco,
corro de lá pra cá, o trabalho é demais, e o salário, pouco...
Minhas coisas do amor, eu devo confessar, ando sobre o fogo:
casamento acabou, e todo dolorido já entro em outro...
Se a meia furou, remenda!
Vai sair melhor do que a encomenda...
Se a vida azedou, insiste!
Passarinho voou, fica sem alpiste...
Quando pego estrada, o meu carro quebra, e o pneu fura...
De noite, na festa, eu tiro o chope sem a levedura.
Depois do descanso eu já vou trabalhar, que a vida é dura,
se é só vadiar bebendo num bar, já não tem mais cura.
Se a meia furou, remenda!
Vai sair melhor do que a encomenda...
Se a vida azedou, insiste!
Passarinho voou, fica sem alpiste...
Desde anteontem meu computador já quase não computa...
Internet caiu, o monitor queimou, só ficou a lata.
O programa travou, o teclado pifou e desistiu da luta,
Computando tudo, parece que ele tá bom pra sucata.
Se a meia furou, remenda!
Vai sair melhor do que a encomenda...
Se a vida azedou, insiste!
Passarinho voou, fica sem alpiste...
Quando o poste caiu, energia faltou, e eu fiquei no escuro,
fiquei sem novela, sem vela, sem tela, nem noticiário.
Quando voltar a luz eu sacudo a poeira e saio do muro,
prometo a mim mesmo contar como foi no querido diário...
Se a meia furou, remenda!
Vai sair melhor do que a encomenda...
Se a vida azedou, insiste!
Passarinho voou, fica sem alpiste...


Letra e música: Bento Ferraz

ASCENSÃO E QUEDA


fragmentos de noites a emergir do silêncio,
ascensão e queda de um ídolo.
o que é a vida senão ascensão e queda?
.
a palavra escrita no muro,
a geografia triste de uma história.
a dor ferina a doer com força,
com a força maior que a de mil tigres.
.
os iconoclastas venceram a masmorra.
Sodoma e Gomorra a parir o feto morto,
o afeto a despir a minha própria ausência.
.
criança me vi onde ninguém mais me via,
por via de fato cresci onde você me esquecia.
transtornado pela tristeza
o arfar do peito com a última gota de sangue.
.
fere o peito marcado com a cicatriz
sombria da crepuscular solidão
a angústia desesperada da minha última dor.
a liberdade tem a cor do amor!
.
o grasnar atroz de um corvo solitário
com o peito devastado de distâncias
encerra na atmosfera soturna do poeta perdido
a dor lancinante do último poema desfeito.
.

Abril- 2017- Evanilson S. de Almeida
"Não quero um fragmento
ou uma citação que cause impacto
quero um poema inteiro
mesmo que seja ácido
Não quero uma esmola
quero o nada que dá impulso
o nada que move a força
a força que move tudo
Não quero uma cópia
quero o original
quero uma trova,
mas que não haja igual
Não quero ser mesquinha
conformada com quase tudo
Sacuda meu corpo com a simplicidade,
mas que seja inteiro.
Então dá-me uma música!
Quero a intensidade
O suspiro profundo
Sair desse mundo
Quero uma palavra
não abreviada
que seja inteira
distinta ou camuflada
Que me faça rir
que me surpreenda
que me faça refletir
que me compreenda
que me faça amante
que me encante
que seja inteira."

- Madalena Daltro

Membro Efetivo da ALLARTE
Ocupa a Cadeira Nº 21

Seu Patrono é Lima Barreto.

A TORCIDA


O goleiro perdia um dedo a cada petardo que agarrava. Mas teve um momento em que não deu mais para jogar porque estava sem todos os dedos das mãos. E a torcida, com sua fome de tortura, não se conteve nas vaias.

[Rinaldo de Fernandes]


[De “O Livro dos 1001 Microcontos”]

quinta-feira, 20 de abril de 2017

Corpo vencido


Costuro enredos
alinhavados pelas distâncias,
que ditam a saudade
e passam a mão
- tatuada de segredos -
nas areias tingidas de corais
e de medusas,
que se esfregam no regaço
das marés meigas
na esperança de serenar,
as tardes caiadas
de palavras rasuradas,
assimetrias perversas
que ignoram a angústia
de uma gaivota
sem mar para vagar...
Manchada de silêncios
ilude-se a pele
grávida de memórias
e breve de instantes...
na espuma que se desfaz,
sou um corpo vencido
até um desejo imperceptível,
amaciar o pó das areias
que chove nos desertos,
tricotados de ausências.

Ana Andrade

Sobre isso do suicídio e a série 13RW




Sobre isso do suicídio e a série 13RW. Acho que os limites abertos do que o corpo pode sentir empurram pra sensação de querer um copo mais cheio. Os jovens estão tendo pouca atenção hoje? E quando foi que os jovens tiveram alguma atenção? A questão toda acho que é a falência dos afetos. Esse querer que não se basta. Esse querer insuficiente. Distúrbios psíquicos gerados por ferramentas que aceleram a ansiedade num grau alucinado; efeitos colaterais de drogas que foram perscritas na infância para embotar a energia criativa das crianças e obrigá-las a suportar horas a fio em fileiras, dentro de um quadrado burro chamado sala de aula, empurrando conteúdos medíocres sem validade à vida prática, e as mãos sempre embaixo das carteiras com celular plugado a redes sociais e mídias que deturpam imagens e transtornam identidades. Ninguém cultua a curiosidade por mais de 5min. Ela é descortinada e novamente se entra num outro looping de ansiedade a ser saciada. Essa é a geração addicted. O próprio vício de assistir uma série no netflix compulsivamente e comentar, isso acelera a velocidade da mente. Os corpos não estão quase nunca no mesmo lugar em que a mente está. Por que não eliminar o corpo se ele é algo duro, quase imóvel, enquanto a mente viaja em páginas virtuais elaborando desejos no limite do impossível de serem saciados. O livro que mais impulsionou uma onda de suicídio no XIX foi Werther. E quem era esse garoto? Alguém que tinha tudo e sofria de um tédio inacreditável. O tédio acaba quando ele encontra alguma coisa que embora esteja a sua disposição ele não pode ter. Mas o não poder ter o enlouquece quando essa coisa/objeto/consumo/charlote passa às mãos de um outro e evidencia werther como insuficiente pra ele mesmo. A melhor frase que me vem agora é a do nelson rodrigues: jovens, envelheçam. Envelhecer é se aproximar do corpo. O que também não dá pra descartar é se essa alta taxa de suicídio (jovens entre 15 e 29, depois de acidentes de transito, morrem mais de suicídio), é um sintoma da alta onda de consumo fácil em que tudo, até o próprio sujeito, torna-se descartável. É preciso aprender a não ter. Lidar com a falta. E o suicídio, ah, Ismália... A romantização do suicídio é o fim dos belos suicidas. Sim, mas tem também isso de os adultos foderem com a infancia e a adolescencia e juventude e etc.

Assionara Souza
o tempo passou
e chamou a tarde
e lá se foram...
sem perder a hora
chega a noitinha!
Lá no firmamento
uma e outra estrela
já tomam seu lugar
com a promessa de brilhar...
Mais, nem tanto igual a você!

Amaury Nogueira

Poeta Paranaense


17/09/1985

ALCANCE


Preciso mais
uma chance
uma dança
um lance
pra que o nada
escape
pra que o tempo
esvoace
um verso, onde
o poema escoe
e teu amor
me trame...

Carmen Silvia Presotto 
 Vidráguas!

terça-feira, 18 de abril de 2017

Kadish por Carli


Oh Señor!
¡Qué putada!
Que necesitás ahora,
en esta hora
de este Hombre a Tu lado.
Por ser sabedor de su Tikún Olám:
buscar la Justicia en este Mundo,
que no es la ley de los hombres.

Él que ha luchado contra el Mal que tiene nombre:
Amalek o Videla, Amán o Pinochet, el mismo Franco.

Ahora,
en esta hora
la labor continúa.
Que no levanten la copa los tiranos,
que al Juicio,
Carlos aportará las pruebas
y Tú, la condena.

Perdona mis palabras si suenan profanas,
pero Tú me conoces.
Soy hombre, soy débil, tengo bronca
y por ello se me encoje el corazón
y amargas son mis lágrimas
y desgarro mi prenda.
    Baruj Ata, Adonai,
    Eloheinu, Melej Haolam,
    Dayán Emet.

Tené en cuenta mi plegaria por su alma,
sabés que nunca pido por mí,
sí por los míos
y Carli es de los nuestros.

¡Oh Señor!
¡Qué putada!
¿Seguirá habiendo diez hombres justos?


Juan Zapato© Israel, 18 de abril de 2017.

domingo, 16 de abril de 2017

entre lesbos e troia ?por q não


● resta somente essa luz crua ●
● como posta de carne quase aberta ●
● no centro de tudo e de todos ●
● esse silencio entre camadas ●
● argila q se desfaz entre labios ●
● no centro de tudo e de todos ●
● nem mais os dedos nem o sexo ●
● a lingua dura so essa luz crua posta ●
● no centro de tudo e de todos ●
● nenhuma dor so olhos azuis ●
● a terra q se perde entre vazios ●
● no centro de tudo e de todos ●
● alem nem carne nem os ossos ●
● agora nosso desejo esse oceano ●
● no centro de tudo e de todos ●
● basta tocar e vem e gira ●
● depois so o sol a sombra sob o mar ●
● no centro de tudo e de todos ●
*

Alberto Lins Caldas

entre roma e cartago ?porq sim


● de tanto viver so o trabalho a vida ●
● entorpeceu e a nada mais se agarra ●
● somente tristeza e dor nessa esfera ●
● sem sombra inflexivel o vassalo ●
● jogado em labirintos se apequena ●
● girando mercadorias pra nada ●
● a grande força é logo rasgada ●
● tudo suga tudo sangra e devora ●
● o corpo a voz o sonho amortece ●
● nisso os longos dias so se repetem ●
● sempre sem gozo vigor ou alegria ●
● coisa escrava rude e sem ironia ●
*

Alberto Lins Caldas

jornada


● essa é a jornada dos sem pernas ●
● q adernam aos poucos na lama ●
● eles cantam enquanto afundam ●
● não se debatem porq as mãos ●
● foram onde ficaram as pernas ●
● miolos orelhas e narizes ●
● eles cantam todos felizes ●
● nessa jornada ate antes da noite ●
● porq irão dormir sem dormir ●
*

Alberto Lins Caldas

minha pessoa em movimento


● minha pessoa é capaz ●
● de sentir o horror da carne queimada ●
● mas não é capaz de impedir as chamas ●
● nem as tempestades de fuligem ●
● nem isso q desaba e atrofia o corpo ●
● nem o tanto de distancia q se constroi ●
● minha pessoa se desespera ●
● sem saber porq todos não se desesperam ●
● mesmo q todos não sejam minha pessoa ●
● assim como sabe q nem todos gostam ●
● de cebolas cruas mordidas a tarde ●
● antes q o sol violento se esconda ●
● minha pessoa anda depressa ●
● talvez porisso sinta o mundo paralisado ●
● todos como marionetes desmontadas ●
● tudo numa vagueza de lesma ●
● o remoer da grama em vacas e mansos ●
● como num imenso pasto sem cercas ●
● nem mariola nem marinheiro minha ●
● pessoa ve antes porq tudo ja passou ●
● não q saiba o q foi ou o q sera ●
● viaja na loucura da linha de sombra ●
● violento sem violar o peito as costas ●
● apenas os lados quando pode ●

Alberto Lins Caldas

A Escritora Marilia Kubota


meu bordel em dortmund


● q maravilhoso bordel eu tive ●
● em dortmund com candelabros de cristal ●
● com sofas de couro de elefante e leões ●
● q maravilhoso era meu bordel ●
● so bebiamos cognac caramelado e o vinho ●
● q gauleses tão perversos criam perfeitos ●
● q maravilhoso era o bordel ●
● com carnes rubras olhos bocas e xoxotas ●
● as mais belas e a maquina jamais cessava ●
● q maravilhoso era o bordel em dortmund ●
● com aquelas camas cobertas de cetim ●
● camas cheias de algodão e petalas ●
● q maravilhoso bordel eu tive ●
● desde jovem quando dei ao chefe ●
● o inaceitavel lucrando em troca a certeza ●
● q maravilhoso era o bordel em dortmund ●
● onde o dinheiro corria como cavalos ●
● enrabados por idiotas e palhaços ●
● q maravilhoso era o bordel ●
● q devorava dinheiro desejo e todo poder ●
● mercado é o q faz vibrar nossas fendas ●
● q maravilhoso era meu bordel ●
● colorido e aberto a todos os senhores ●
● nem viamos a treva o frio q não larga ●
● q maravilhoso bordel eu tive ●
● em dortmund com atelier pros uniformes ●
● rasgados togas batinas e ternos ●
● q maravilhoso era meu bordel ●
● com um belo cemiterio pros anjinhos ●
● se soubessemos a treva o frio q não larga ●
● q maravilhoso era o bordel ●
● pro condutor pros soberanos e patrões ●
● so recebia quem mandava trabalhar e morrer ●
● q maravilhoso era o bordel em dortmund ●
● ali arrastei suor e sangue o corpo sem gozar ●
● q é deles sempre aquele gozo indiferente ●
● q maravilhoso bordel eu tive ●
● em dortmund era la q batiam pra matar ●
● era la q enterravam chorando como teatro ●
● q maravilhoso era o bordel em dortmund ●
● era la q eles comiam a carne o peixe ●
● a mãe o pai o irmão a irmã e o tigre ●
● q maravilhoso era o bordel ●
● era la q se vestiam de dama e dançavam ●
● era la q surgiam de princesa e caiam de 4 ●
● q maravilhoso era meu bordel ●
● ali arrastei suor e sangue o corpo sem gozar ●
● se soubessemos a treva o frio q não larga ●
*

Alberto Lins Caldas

Sábado de aleluia


Não, não tem noite que mais me ampare.
Eu adiantarei a pedra,
removerei seu conteúdo,
o peso que livrará o sepulcro
dos intensos deuses tardios,
as deusas tomarão o espaço
como pássaros pintados
nas paredes do adro
e a solidão ocultará
a modernidade,
as inovações tecnológicas,
a ousadia afetada dos poemas.
Tudo que se consome
some na angústia do momento
e a fome das estrelas
em continuar a vida distante
dos atos mais humanos
me comove.
Minha mão feminina
ampara na lembrança
o lençol que minha avó
me deu quando fui
moço
de Itapetininga.
Ela usou a costura
pra me dizer adeus.
Ela se escondeu nalgum
canto da saudade
e na hora grave em que expio
minha culpa,
minha tão grande culpa,
debruço sobre o jardim do ressuscitado
e o vazio do latifúndio,
recordo a maciez que me abrigou
enquanto eu dormia.
As flores que carrego no meu nome
são todas estampas do pano
tão simples, tão árabe,
qualquer ponto luminoso
entre o minarete e a lua.
Fiori Esaú Ferrari


nestes dias chatos! chuviscos chatos! em que o mundo vira um chato no saco da galáxia.
aproveito o dia vinte e cinco de julho do presente ano e lembrar-vos -eis a máxima das máximas universais.
''O REAL É UM SÓ''

--- Ricardo Pozzo
temporal terrível
assisto às gotas rolando

pela janela de vidro

Marilia Kubota
Hoje há o medo na cidade. Eu saio à noite e sinto medo. Tristeza por viver assim, acuada. Há grandes discussões políticas na bolha, talvez porque estas discussões camuflam a realidade que nos bate na cara todos os dias e todas as noites: o medo de um embate violento com outro ser desigual que se tornou nosso inimigo invisível.

Marilia Kubota

Arcano

Meu deus, quantos somos
na vida, no amor
no abandono;
quantos sonhos perdemos
entre servos e donos
de perversos enganos;
e depois de iludidos
no ludíbrio dos anos
só nos resta a seresta
a relíquia dos danos.

Fernando Fortes


curar-se: não só das debilidades físicas. curar-se das perdas, costurando o eu anterior e o eu cindido.

Marilia Kubota

sábado, 15 de abril de 2017


na ânsia de ser amado
frequenta-se todos os lugares
onde o amor
não pode ser encontrado

[Priscila Prado poesia & prosa]

Senilidade


Quando vejo o rosto de um idoso, não me prendo a manchas e rugas, mas ao belo molde que ainda é, e tento resgatar a imagem original. Vou retraçando as linhas até me dar por satisfeito. Em geral, os olhos traem inesperada vivacidade. Não me detenho à decrepitude, mas à história que cada qual construiu. Não aos passos inseguros, mas à sólida aventura que viveu. Muito menos ao esquecimento, mas às ricas memórias. Assim que descobri que a vida continua além da linha do horizonte, todos os idosos se tornaram cofres de significados. Nesses cofres, a serem abertos em tempo oportuno, eles guardam os significados que coletaram ao longo da vida. O problema é que alguns acabam por esquecer o segredo. Cabe a mim, como médico e amigo (outro ser humano), ajudá-los a reencontrar. É trabalhoso, mas vale cada sorriso, cada lágrima.

Marcio Leite

Voltando-se para a madrugada mais um caminhar
sob os olhos das estrelas nada a lamentar
a cidade numa prece silenciosa velava a si
sonhando solares liberdades queimava-se
na escuridão .


Wilson Roberto Nogueira
quem te prendeu?
-o implícito.
quem te acusou?
-o tácito.
quem te moveu?
-o ilícito."

RR

Sem milagre

Quando aumentam as dificuldades , é importante manter a fé. Darvino era um respeitado líder religioso. A fama de seus milagres ultrapassava em muito os limites de Itaquera.Populoso bairro da periferia paulistana.Era domingo.Darvino ia realizar uma importante cura espiritual. Seu companheiro Eurípedes estava numa cadeira de rodas. Darvino gritava."Levanta , filho de Deus. " Eurípedes contorcia o rosto numa máscara de dor. "Vai. E anda ! "A música aumentava de volume.Foi quando tudo parou.Corte de luz.Apagão  preventivo. Eurípedes manteve-se imóvel .Os fiéis não viram milagre nenhum . No escuro alguém levou a grana das contribuições. Darvino se revolta e pensa em aderir a um partido de oposição.Sem luz, não se vai para a frente.

Voltaire de Sousa.in Vida Bandida. FSP. Mais !10/07/01

Sem Título

Fim de linha
inútil
Retocar o cotidiano

Morte
Cartada definitiva da solidão
A roupa nova perdeu o sentido

Se depois do amor
Chegar o vazio
Não se espante
São artimanhas da solidão.

Helena Arcoverde

Definição de esperança

A esperança é quase a coisa, quase sabor, quase contorno, em sendo nada. Esperança é a árvore de Natal do pensamento, a flor que se cheira no bordel das cinco estrelas decadentes, endereço de carta que volta...A esperança é um oásis de miragens justinhas no deserto fervendo do desejo; cada um e todos os chuveiros que se penduram nas câmaras de gás da felicidade. A esperança é uma sacanagem quando se dá, um valor quando se tem. A esperança é fantástica. Dois pontos gordos do LSD hidrófobo da vontade. A esperança é corna, é mantida , última a saber que nunca alcança.

Fernando Bonassi. in Da Rua. Mais !FSP. 29/04/00

CATHERINE


Eu pensei, por um instante vão,
que você resgataria
minha solidão.
Percebi, só por um instante
que o seu sorriso
seria bastante.
Eu vi na sua juventude
a minha, espelhada
em plenitude.
Confesso, há muito
não via o espelho
de meu espírito.
Espero, lentamente,
que seu distanciamento
tenha sido instante.

Bento Ferraz

Nomeação

Marte avisa
Olha a pista
De onde pisa

Fecha o escudo
Muda o mundo
Abre tudo

Perde o perdido
Acha o esquecido
Tudo esclarecido

Espera a chuva
Vá sem luva
Muda a uva

E mudando 
E mudando
Mudei-me até cansar
Até achar um jeito
de melhor ficar
A Hora é esta
não vá embora
Tudo se manifesta
como outrora
E mau segundo
Perdeu-se no mundo
E achou-me lá

Esperaria a eternidade
Para poder salvar
 E de vidas salvas Nada restou
Até a esperança Com elas se acabou.

Luciana Rodrigues Sálvaro
1999


Tarefa obscura

Da primeira dúvida à última tacada, conheço a lama miraculosa. Âncora em punho caçando o mínimo.Para que mais vivem os poetas?Tantas águas.Teatro sonâmbulo, baralho tosco, cartas espatifadas contra silêncio e bruma. De carne e osso , porém além. O que retorce a turba e treme diante de um sopro?Sofro e desfruto o fundo do poço, de onde são nítidos os astros. Sílabas vulneráveis.Tarefa obscura. Vamos, verbo, avança além do ruído e faz da fala um mar tão límpido que lave resíduos de guerras, todas perdidas. Velas abertas. Navegar o imperecível. Aceno para o poeta de olhos glaucos, que há pouco partiu a bordo de seu verso: Nada se diz senão o indizível.


Ledusha Spinardi.in Risco no Disco. FSP. Mais !08/11/1998
A Via Crucis foi uma selvageria,
a Crucificação uma brutalidade;
mas em três, quatro horas, acabou a agonia,
baixou a eternidade.

Eu vivo aqui, crucificada noite e dia,
carrego da manhã à tarde
o meu lenho de opróbrio e a noite me excrucia,
lenta, fria, covarde.

Ah, como eu preferiria
que me crucificassem de uma vez, sem o alarde
de algum terceiro dia!

Mas toca-me seguir nessa monotonia,
a agonia de alçar-me do catre
e abrir de novo os braços, vazia.

Bruno Tolentino




Sonora Cafeina


Um dia amor, foi mais que iludir sua ausência nesses úteros de areia

Talvez amor, eu não devesse ter feito das tripas coração quando o corpo perdeu o gosto e ser estranhos era ser feliz

Amor, quem de nós dois ainda não deu uma olhada para trás e pensou numa chance a mais?

É sempre verão amor, teu humor anda de ralo abaixo e sabe que aqui é inverno nos ossos e em todo resto

Os meses que passam como soro no braço como antes

A carne alheia na boca como roupas usadas de um defunto

E ainda amor, eu conto nos ponteiros o tempo que não temos mais

Redson Vitorino            


Gárgula


Dois haitianos dividem
o cachimbo
com a sinhazinha ecoville
na sarjeta, sob escombros
da senzala;

passo ao lado.

Na real, azumbizados
seduzidos pela pomba
giratória dominante,
vestida em sua melhor pele
cor de leite,
que dos negros jorra

entre seus lábios.


Ricardo Pozzo



ANTES DA POSSE


O nosso partido cumpre o que promete.
Só os tolos podem crer que
não lutaremos contra a corrupção.
Porque, se há algo certo para nós, é que
a honestidade e a transparência são fundamentais.
para alcançar nossos ideais
Mostraremos que é grande estupidez crer que
as máfias continuarão no governo, como sempre.
Asseguramos sem dúvida que
a justiça social será o alvo de nossa acção.
Apesar disso, há idiotas que imaginam que
se possa governar com as manchas da velha política.
Quando assumirmos o poder, faremos tudo para que
se termine com os marajás e as negociatas.
Não permitiremos de nenhum modo que
nossas crianças morram de fome.
Cumpriremos nossos propósitos mesmo que
os recursos económicos do país se esgotem.
Exerceremos o poder até que
Compreendam que
Somos a nova política.
---
Autor lusitano anônimo


Fonte : Olinto   Simões

PÁSCOA NO SERTÃO


o menino,
lá no grande Sertão:
lápis
é graveto seco,
papel
é árido chão...
Sob a bacia do Sol
ele
desenha um barco
no rio de mel
cheio de peixe e pão
olha o céu
ao deitar o sonho no chão:
os olhos orvalhados
é
sua terrível oração!
João Francisco Lima Santos


BREVE ODE AO FÓSFORO

Há um quê de rispidez
na brevíssima decolagem
que o palito faz (arisco)
da caixa ao ar:
este portátil prometeu
não se nega a mais que isto.
E tem mais o que fazer?
Viver já é atrito.
.
André Ricardo Aguiar


[Poema que sempre me pedem para publicar ou acender, sei lá]

sexta-feira, 14 de abril de 2017

Lua Azul de Agosto



Diz a lenda que o mês de agosto...
É o mês do terror e do desgosto!
Mas, neste agosto, apareceu a Lua Azul
Que iluminou o mundo de norte a sul!

Agosto teve dois períodos de Lua Cheia,
Que transformou lobisomens em reis...
Pois o amor é a chama que se incendeia,
Quando a paz faz parte de todas as leis!           

Esta Lua já beijou um vulcão enlouquecido...
Junto com suas chamas da brava cor carmim!
Então as cores azuis e verdes buscaram o cupido...
No espaço sideral que nunca terá fim!

Agosto teve duas luas cheias misteriosas,
Que transformaram bruxas perigosas...
Em fadas com sapatilhas de bailarinas...
Realizando desejos de pobres meninas!

A Lua Azul abriu um portal de harmonia,
Onde vários seres tocaram em sua luz,
Emanando pura poesia e doce alegria...
Curando toda ferida e qualquer pus!

A mágica Lua Azul de agosto...
Mostrou-me o céu com gosto...
Refletindo seu manto em meu rosto...
E livrando-me de qualquer encosto.
Luciana do Rocio Mallon


O Homem Nu Ganhou uma Bicicleta Gigante


É com orgulho que me lembro...
Do dia vinte e dois de setembro!
Quando em Curitiba teve a Marcha das Bicicletas...
Todas lindas e maravilhosas, sem pneus carecas!

Naquele ensolarado e belo dia...
Ocorreu algo com harmonia:
A estátua do Homem Nu da praça,
Sempre cheia de leveza e graça,

De uma maneira nobre e elegante,
Ganhou uma bicicleta gigante!
Mas, no começo, com tanta platéia...
O Homem Nu não entendeu a idéia...

E reclamou sem pudor...
Com uma cara de horror:
“- Não quero uma bicicleta,
Pois não tenho nem cueca!

O “Oil Man” é que deveria ganhar este presente...
Afinal, com estas festas eu nunca fico contente!
Mês passado me vestiram com uma roupa de cozinheiro...
E eu fiquei envergonhado, depressivo e nada faceiro!”

Mas, naquele evento, com o passar do tempo...
O Homem Nu viu ciclistas cheios de alegria...
Então desejou com sentimento...
Andar de bicicleta com harmonia!

Reza a lenda que nas noites de luar...
O Homem Nu sai do seu lugar...
Para com a sua bicicleta andar!

Ele voa com a sua bicicleta perto da Lua...
Como o E.T. daquele filme espacial...
Do céu, acena para a Mulher Nua,
Que é a sua paixão especial.
Luciana do Rocio Mallon


Lenda do Corsário Zulmiro e Cigana Hortênsia



Um das lendas urbanas mais famosas do Paraná é o causo do pirata Zulmiro e de seu tesouro que foi enterrado num dos túneis subterrâneos do bairro das Mercês, na cidade de Curitiba. Existem várias versões para este causo, a mais romântica é que Zulmiro, chamava-se na realidade Summers e era um corsário inglês, uma espécie de militar que era pago para abater os navios dos piratas maus. Reza a lenda que Summers e seus soldados invadiram um navio-pirata que estava carregado de tesouros roubados. Mas, Summers se apaixonou por uma cigana que estava dentro da embarcação, desembarcou no porto de Paranaguá, pegou um dos baús e fugiu com esta donzela para Curitiba, onde enterrou o tesouro. Vamos ler esta lenda abaixo:

Há muitos anos atrás, na Europa existia uma cigana chamada Naranda, que não conseguia engravidar. Um certo dia, a sua caravana parou em frente a um jardim de hortênsias.  Assim, Naranda aproveitou a tranqüilidade para orar e oferecer um lenço para a padroeira dos ciganos:
- Santa Sara Kali, ofereço-lhe este lenço abençoado...
- Por favor, faça com que eu engravide!
- Se eu ficar gestante de uma menina, ela se chamará Hortênsia como as lindas flores deste jardim.
Algum tempo depois Naranda engravidou e teve uma menina com lindos olhos azuis. Conforme a promessa ela batizou a garota com o nome de Hortênsia. A pequena cresceu em beleza e tornou-se uma linda mulher. Desde criança esta menina gostava de tudo que era relacionado ao mar: água, peixes, areia, navios e principalmente piratas. Hortência gostava de histórias sobre corsários e o seu sonho era se casar com um, apesar de saber que uma cigana só pode se casar com outro cigano.
Um certo dia, a caravana parou perto de um porto e os ciganos se apresentaram no local. As mulheres dançaram com lenços, leques e pandeiros para o público. Porém, no meio da platéia havia um conde mau que se apaixonou, a primeira vista por Hortênsia e mandou raptá-la. Assim, naquela noite homens encapuzados invadiram o acampamento e levaram Hortênsia, que foi colocada como prisioneira dentro do porão do castelo do conde. Porém, a cigana tinha uma lixa mágica escondida na saia e lixou as grades. Então, ela saiu correndo em direção ao acampamento, mas notou que não havia mais ninguém lá. Logo, esta moça percebeu que os guardas do conde estavam a perseguindo. Deste jeito, a jovem fugiu até o porto e se escondeu no porão de um navio sombrio que logo partiu. Naquele porão ela notou que existiam tesouros nos baús. Mas, de repente, esta moça escutou um barulho e se escondeu dentro de um baú vazio. Porém abriram o baú e Hortênsia viu uma mulher e um pirata com um papagaio no ombro. Desta maneira o homem perguntou:
- Quem é você?
- O que você está fazendo aqui?
- Pois, saiba que iremos jogá-la aos tubarões.
A donzela respondeu:
- Por favor, não me matem.
- Eu sou a cigana Hortênsia...
De repente a mulher interrompeu:
- Você é cigana?
A jovem respondeu:
- Sim!
Desta maneira, a mulher continuou:
- Eu sou Beth a esposa, do pirata Ricardo, chefe deste navio.
- Você sabe jogar tarô e ler o futuro nas mãos?
Hortênsia respondeu:
- Sim.
Beth indagou:
- Poderia fazer estas coisas para mim e para as esposas dos outros piratas?
A donzela respondeu:
- Claro.
A mulher explicou a Ricardo:
- Por favor, não jogue a cigana no mar, pois ela não é perigosa. Devemos ter medo apenas dos corsários ingleses que se dizem piratas, mas são pagos para abater os navios de nós, os piratas verdadeiros.
Então Hortênsia leu a sorte das pessoas do navio e ajudou nas tarefas domésticas.
Porém, de repente, todos ouviram tiros de um canhão. Logo um dos piratas gritou:
- São os corsários ingleses!
Desta maneira uma grande batalha começou até quando os corsários ingleses invadiram o navio dos piratas e tomaram o comando da situação. Assim, no meio daquela confusão, o corsário Summers olhou para Hortênsia e se apaixonou por ela. No desespero, a donzela disse:
- Por favor, não me mate, pois eu não faço parte do grupo de piratas. Sou apenas uma cigana...
O rapaz perguntou:
- Você aceita fugir comigo?
A jovem disse:
- O que?
Summers repetiu:
- Você aceita fugir comigo?
- O navio irá desembarcar daqui a pouco no porto de Paranaguá. Podemos pegar um baú de tesouros e irmos até a Vila Nossa Senhora da Luz...
A cigana exclamou:
- Sim, eu aceito!
- Vamos embora logo!
Então, o corsário pegou um dos baús e fugiu com Hortênsia para a Vila de Nossa Senhora da Luz, que hoje é Curitiba. Lá, Summers mudou seu nome para Zulmiro, já que estava sendo procurado pela justiça inglesa. Ele gastou uma parte do tesouro, porém a outra metade ele enterrou num dos túneis, que os jesuítas construíram no bairro das Mercês. Reza a lenda que este baú está emparedado nos subterrâneos, mas que um dia será achado e que os fantasmas de Zulmiro e Hortênsia passeiam no Bosque Gutierrez nas noites de Lua Cheia.
Luciana do Rocio Mallon


Lenda do Fantasma da Coxa Branca de Curitiba


A lenda abaixo foi contada pelo Nhô Naldo, um senhor de 97 anos, que é um torcedor do time de futebol chamado Coritiba e freqüentador antigo do terreiro místico mais famoso do bairro Juvevê em Curitiba. Este senhor autorizou-me a escrever este causo na Internet:
No começo do século vinte surgiu um time chamado “Coritiba Footbal Club”, que nos primeiros anos, era formado por jogadores descendentes de alemães com as seguintes características físicas: loiros, altos e muito brancos.
Reza a lenda que num jogo de 1939 um torcedor do time adversário começou a xingar um jogador do Coritiba em voz alta:
- Coxa Branca!
- Coxa Branca!
Então, os torcedores do time rival começaram a berrar juntos:
- Coxa Branca!
- Coxa Branca!
Então o apelido pegou.
Naquela mesma época existia Guilherme, um adolescente que sonhava em ser um jogador de futebol do Coritiba. Para isto, ele freqüentava uma escolinha de futebol. Um certo dia, este menino atravessou a rua distraído, foi atropelado por um carro, quebrou a perna direita e teve que amputá-la a partir da coxa. Este garoto ao saber da notícia ficou arrasado e pediu para que conservassem a perna no formol e colocassem, dentro de um vidro, em seu quarto. Os pais dele atenderam a este estranho pedido.
Guilherme, depois do acidente, passou a freqüentar lugares místicos e um deles era um terreiro famoso localizado no bairro Juvevê. Uma vez numa sessão, ele confessou à mãe-de-santo:
- Um dos meus sonhos é que o time do Coritiba seja para sempre um grande campeão e que a minha perna amputada jogue no estádio Couto Pereira.
Assim, a “curandeira” disse:
- Realizarei o seu pedido:
- Basta trazer a sua perna que está no formol. Deste jeito a enterrarei perto do estádio do “Coxa-Branca” e ela fará uma magia. Pois, sua perna criará vida e de uma forma invisível trará sorte ao time do Coritiba.
Desta maneira, Guilherme obedeceu à sensitiva.
Então, alguns dias depois, este garoto estava assistindo a um jogo na televisão e viu uma perna branca correndo só pelo estádio. Quando de repente, esta perna-fantasma entrou na perna de um jogador real e este rapaz fez o gol. Depois o garoto perguntou se os seus amigos tinham visto a mesma coisa e eles falaram que não.
Reza a lenda que muitas pessoas sensíveis já viram uma coxa branca fantasma perambular pelo Estádio Couto Pereira e algumas outras pessoas comentam que este causo traz sorte ao time do Coritiba até hoje.
Se o Recife tem o famoso causo da “Perna Cabeluda”, Curitiba tem a Lenda Urbana da Coxa Branca.
Luciana do Rocio Mallon