sábado, 26 de novembro de 2016

André Giusti

Poema de meu novo livro, Os Filmes em que Morremos de Amor, pela Editora Patuá. 

*
Os frequentadores do restaurante natural
vestem camisetas de Marley Gandhi Luther King e Mandela.
Usam cabelo rasta
ferrinhos no nariz no beiço acima do olho
acendem incensos
e outras coisas
que fazem fumaça também
pra libertar a essência cósmica
interior transcendente de não sei onde
(eles não explicam muito bem).
Praticam taishi
meditação
terapias do além
seguem o guru malabarashibalabadoooom
e gritam que matar boi é crueldade
animalidade bestialidade
inferioridade espiritual.
Os frequentadores do restaurante natural
vão às passeatas
pedir pelo aborto
o amor entre iguais
o fim da corrupção
e ao fórum social
pela igualdade entre os povos.
Mas se a mulher pobre nordestina negra
aparece com criança no colo
catarro descendo
eczema à vista
cabelo ensebado
vendendo pano de prato
(um é três dois é cinco
ou intera a minha passagem, moço?)
olham pra ela de soslaio,
discretamente nauseados
procuram em volta o gerente:
"nesse mundo liberal escroto
nem se pode mais comer
sossegado um quiche

de alho poró e tomate seco".

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