Eu espero o amanhã.
Hoje não. Hoje há medo
espreitando-me a alma
Hoje o trivial, a rotina.
Amanhã o extraordinário,
a vida que vale a pena.
Hoje a carne flácida
caída no lençol sujo
não merece a glória
da experiência plena
desse amor ideal
ou desse poder criador
dando-me asas
para alcançar a essência
do que é matéria inerte
e forma aparente.
Hoje não. Hoje o choro
contido como um segredo.
Pois essa vida medíocre,
é simples e previsível
mas também mete medo,
que é o medo do nada
além de dia após dia
viver um dia após outro
esvaindo-me aos poucos
numa resignada agonia.
Amanhã, amanhã quem sabe
eu seja diferente.
Hoje eu sou a minúscula
e insignificante partícula
da grande massa
na qual posso sumir
sem precisar pensar.
Na qual posso me esgotar
até o esquecimento
da liberdade de sonhar,
da maldição de querer
o que não posso me dar.
Hoje é melhor morrer
sem precisar me matar.
Morrer assim, calada
sufocada no buraco
do meu próprio não-ser
ouvindo-me respirar.
Iriene Borges
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