Há uma hora da noite, a mais escura, em que tudo se torna
claro.
O caminho de volta está vedado. Há anjos entediados cujas
espadas flamejantes desenham parábolas inverossímeis no ar.
O Eufrates e o Rio Belém estão secos e os mendigos, insones,
transitam por seu leito. Roma está em chamas.
Curitiba também. Todos os pássaro que grasnam
são de mau agouro.
E nenhum poema será capaz de refazer as alamedas do Éden
Pois de seu desenho nem Deus se lembra.
Há uma hora da noite, a mais escura, em que você enxerga
claro:
a infância e a infâmia, o amor e o opróbrio.
A própria verdade é uma sentença rota
abandonada em alguma rótula quebrada.
Ah, aquelas tardes longas
são agora só memória
e em seu lugar só nos resta o vil trabalho
e o assentimento do engodo.
Há algumas horas da vida em que você enxerga tão claro
que é como se fosse cego.
Otto Leopoldo Winck
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