quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

eu devo estar na Terra para cometer todos os erros possíveis

embora tenha mais de ano que não pratico meu cinismo
desde o dia em que a melhor atriz da nossa geração
me falou que nunca conseguia saber se eu estava sincero ou não
tem mais de ano que tento não ser ambíguo

sei que pago um preço por ao longo da vida
ter me interessado menos pela engenhosidade analítica que pel´A Razão Gulosa

sem a arte, que é para mim uma das facetas do amor, a vida seria intolerável
sem outras manifestações amorosas até que tenho me virado
mas sem o mínimo que encontro na arte, não
“a vida é um arquipélago de amor atormentado”, faz quase dois anos que
este verso de Blake me persegue diariamente

tinha vento na cidade
quando os rios iam
o verde abria o azul
quando as plantas faziam alimento e remédio
o dia era o dia e a noite era a noite pelo simples fato de que eu dormia e acordava
agora qualquer horário é nenhum
submersos ficam bem os peixes, nós não

meu corpo está ficando bárbaro novamente
a começar pelo ouvido que não sabe escutar
a começar pelas mãos que não sabem mais fazer carinho
a começar pelo cérebro que virou um pirão
“os homens esqueceram que todas as deidades residem no coração humano” (Blake)

e vai que viver é uma eterna procura por diminuir nossa imensa solidão
por isso o amor é o amor

se eu pudesse afirmar que não trago a falta dentro da minha ansiedade
ou melhor, que dentro da falta não trago ansiedade
aí eu estaria novamente pronto para as festas de vocês
as seguidas e incansáveis pequenas festas dentro de uma guerra

escrevo como eu fosse um poeta marinheiro
ou nem sequer um poeta, só um marinheiro
o que vale é a doçura em mar salgado
extrair ternura do gestor cultural
extrair ternura do poder aquisitivo
extrair ternura fechando acordos societários
estatólatras pode que sejamos todos, até eu, que quero mais é que se foda

ah tá tudo bem, agora falem mais uma vez o quanto sou fofo
digam digam me digam o que eu sei
Luis Felipe Leprevost


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