eu devo
estar na Terra para cometer todos os erros possíveis
embora
tenha mais de ano que não pratico meu cinismo
desde o
dia em que a melhor atriz da nossa geração
me falou
que nunca conseguia saber se eu estava sincero ou não
tem mais
de ano que tento não ser ambíguo
sei que
pago um preço por ao longo da vida
ter me
interessado menos pela engenhosidade analítica que pel´A Razão Gulosa
sem a
arte, que é para mim uma das facetas do amor, a vida seria intolerável
sem
outras manifestações amorosas até que tenho me virado
mas sem o
mínimo que encontro na arte, não
“a vida é
um arquipélago de amor atormentado”, faz quase dois anos que
este
verso de Blake me persegue diariamente
tinha
vento na cidade
quando os
rios iam
o verde
abria o azul
quando as
plantas faziam alimento e remédio
o dia era
o dia e a noite era a noite pelo simples fato de que eu dormia e acordava
agora
qualquer horário é nenhum
submersos
ficam bem os peixes, nós não
meu corpo
está ficando bárbaro novamente
a começar
pelo ouvido que não sabe escutar
a começar
pelas mãos que não sabem mais fazer carinho
a começar
pelo cérebro que virou um pirão
“os
homens esqueceram que todas as deidades residem no coração humano” (Blake)
e vai que
viver é uma eterna procura por diminuir nossa imensa solidão
por isso
o amor é o amor
se eu
pudesse afirmar que não trago a falta dentro da minha ansiedade
ou
melhor, que dentro da falta não trago ansiedade
aí eu
estaria novamente pronto para as festas de vocês
as
seguidas e incansáveis pequenas festas dentro de uma guerra
escrevo
como eu fosse um poeta marinheiro
ou nem
sequer um poeta, só um marinheiro
o que
vale é a doçura em mar salgado
extrair
ternura do gestor cultural
extrair
ternura do poder aquisitivo
extrair
ternura fechando acordos societários
estatólatras
pode que sejamos todos, até eu, que quero mais é que se foda
ah tá
tudo bem, agora falem mais uma vez o quanto sou fofo
digam
digam me digam o que eu sei
Luis Felipe Leprevost
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