quinta-feira, 12 de outubro de 2017

Cadeira de balanço



Na varanda da velha casa, havia semanas que a cadeira fazia ruídos, mesmo sem algum vento para embalá-la. No quarto, suplicas ecoavam no vazio:
__ Mamãe, tô com medo; papai, não fique zangado comigo.
Enquanto a voz aos poucos se esvaía, a morte, que não possuía face nem forma, fazia-se ouvir, arrastando um chinelo de pano pelo assoalho barulhento.
__ Não me abandone, mamãe! Paizinho, eu não tive culpa. Foi um acidente. Quem vem chegando?
Pela janela, olhava o dia sendo lentamente tomado pela escuridão.
__ Eu sinto falta de seu colo, mamãe, estou com muita dor. Papai, eu estava brincado. Quem vem chegando? É você, papai? Vem trazer meu chá?
Enquanto a agonia permanecia no quarto, na sala, a morte, indiferente, aproxima-se vagarosamente.
__ Papai, foi muito rápido. Praticava tiro ao alvo em uma velha lata com a velha espingarda. Sei que amava demais aquele cavalo. Perdoe-me, mamãe! Não me abandone! Tenho medo de morrer no escuro, ascenda a lamparina.
Nem mesmo as lágrimas tinham mais força para escorrer em sua face, ficavam presas nos cantos dos olhos.
Sem cerimônia, a morte adentrou no quarto sem bater. A cadeira de balanço parou. O espírito desvencilhou-se do seu corpo aos 87 anos, assim como o sol se desvencilha das nuvens carregadas.
Livre do peso do corpo, alegrou-se ao ver pela janela seu pai cavalgando montado no velho alazão. Apeou, aproximou-se, estendendo-lhe as mãos, conduziu-o até a sua velha mãe, que, sentada minutos antes estava inquieta na cadeira de balanço, abriu os braços e falou:
__ Vem cá, filhinho! Antes de partimos sente no colo da mamãe. Faz meio século que espero este momento.
perdão pelos erros, tive que redigitar.

Do livro : Conto dos contos e outros contos, JDamasio,2001



Nenhum comentário: