quinta-feira, 26 de outubro de 2017

Comunicações



Eu falo de mim — daqui —
desta central
pelo microfone do corpo
por esse fio que vem do fundo
eu me irradio

assim, numa transmissão de
sustos e rangidos
veia e voz, ao vivo, sob tanto
sangue: pantera escarlate
que passa e pisa

e se espatifa nesse chão
pata de lacre
grito, pingo sobre o alvo
tão tátil da minha carne
nos panos

repentinos do meu espanto
nas janelas
onde me debruço sucessivo
e vário, sequência de mim
em fotonovelas

me desdobro — quadro por quadro
nos desenhos
de dentro do que sou e projeto
aos poucos, plano e pausa
para fora

com a vida que me veste
pelo avesso:
filmes de sêmen onde publico
figuras de suor e celuloide
numa lâmina

de velocidade e de lembrança
em fotogramas
de esperas e procuras — falha
folha de slides-células, sopro
e pulso

página de pele em que escrevo
o uso
a articulada letra do meu gesto
o rascunho de unhas e rasuras
feito à unha

nas nuas marcas do meu corpo
no espaço
e nos lençóis da claridade
monograma, silhueta, cadência
e a fala

que se imprime nesta fita
neste sulco
a linguagem como um fim
a linguagem por um fio
e a morte em morse.


 De Armando Freitas Filho

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