Folheia meus fios na sombra de leis que secam a existência
de um povo amordaçado pelas próprias vestes.
Retira da cruz esmaltada nossa mártir confusa. Sacrifica um
espaço na linha de produção falsificada pelos lobos. Reproduz a poesia mola,
seca uma caatinga inteira no peito metrópole. Seca.
Eu estarei entregue. Atada nos cortes congressistas e
clérigos. Eu estarei ali. Na morbidez noturna de uma iluminação falha da
periferia em nós.
Alumia meus versos. Que estou morta na voz enlamaçada e
latina dos pedintes do centro.
- Uma pedra queimada.
Minha alma se dobra e aquece o umbral da Júlio Prestes.
Mune esse tempo ruim que malsina nossa paz. Vai. A chuva
ácida é literatura de pergaminho nos bueiros atolados.
Eu escrevo sob um rancor oxidado. Sem medo.
Saca essa arma entre os olhos e salva, nos lampejos aluados,
as esquinas de estrofes anêmicas.
O poder suga até a última tripa.
Vem. Limpa a poeira dos dentes.
Pois a linha de frente acabou de se render.
Folheia meus fios com os dedos mais leves no assentar de cor
e liberdade.
Governo nenhum candonga a miséria que levo na boca em
percal.
Folheia meus fios na loucura mais tênue do assimilar de
vida.
Salva um dia por vez.
Sem temer.
Camila Passatuto
Do livro "Nequice: Lapso na Função Supressora"
(Editora Penalux)
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