sexta-feira, 12 de julho de 2019


Não tenho certeza se inventei o som dos pés magros a comer a rua maldita e discretamente expurgada de um desvario matutino, ou as poças do líquido urbano que de praxe hidrata pombos e pneus carecas - como mãe de peito cheio e dolorido.

Afundo as ideias na cena melodiosa, abarrotada em gemidos de fome e céu, no denso e uniforme borraceiro, imperfeita por sentidos e direções. Não sei do pertencer de cada elemento, disposto a fino ajuste, no passar de gente triste e apressada.

Por mim, tanto faz.

É na ponta do ser que posso sentir o real de mundo. Algum deus desatina compasso entre o medo e o peso do ar, que se rarefez apenas para patinar meus pulmões e murchar desejos, nesta manhã.

Tenho os pés doentes de mundo. Deve ser por isso.

Pisei, sem querer, no resto de um gato morto. Nada senti. Foi esses dias.
A morte seca, sem miúdos e sem pulsar, não move minha atenção, meu amor ou, até mesmo, meu nojo. No entanto, desconfio que tal repente foi um sonho.

O pouco de corpo crava a carne no centro de um universo difuso e sonolento. Não tem ninguém nas janelas, nos córregos, na rotina de um domingo amaldiçoado. Observo minha base diluir e unir-se ao chão sujo, bem no meio da cidade. E ninguém por perto a fim de relatos futuros.

A chuva leva meu sangue para o bueiro da General Osório. E a cidade me tem pelos pés, enquanto fico nula ao transmutar meus temores. Afundo a vida na dor melodiosa dos desprezos meus. E isso acalma.

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Entrada na emergência
Nulificação parcial dos dedos,

Pé esquerdo.

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Não tenho certeza
se inventei meus
pedaços, general.

Camila Passatuto

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