Um anjo esquisito pousou do meu lado,
em versos obscenos revelou segredos,
costurou enredos mal alinhavados,
abriu as janelas, riu de debochado,
acendeu incensos, fumou um cigarro,
praguejou de um jeito bem desaforado,
arrebentou rosários, desmanchou mandalas,
bebeu meu absinto, ficou embriagado,
abriu suas asas, chorou como criança,
pediu café amargo, fumou outro cigarro
e nas teclas do piano cantou seus desenganos.
E quando um outro anjo veio em seu socorro,
gritou feito demente, saltou pela janela,
caiu sobre a roseira, manchou rosas de sangue,
correu em disparada, tropeçou no meio fio,
sujou asas de lama, não olhou pra lado algum,
atravessou a rua, morreu atropelado,
nasceu pra vida agora, deitado na sarjeta,
e assim pobre coitado, não tem nada de seu.
E quando amanheceu andou pela cidade,
tomou muita aguardente, fumou um baseado,
cheirou mil carreirinhas, roubou a sacristia,
trocou tiros com a polícia, chorou mais uma vez.
E quando um outro anjo veio em seu socorro,
sangrou sangue dos tolos, manchou confessionário,
e sem extrema unção morreu mais uma vez.
Nasceu do outro lado, do ventre da serpente,
não sabe o seu nome, nem sabe que morreu.
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