para olímpia e enedino
meus pais
era uma vez um menino
menino do interior
amamentado com carinho
engatinhava na terra
solto petas ruas
tomava banho de chuva
na bica do sobrado velho
roubava fruta na feira
cocada na barraca do primo
era uma vez um menino
menino do interior
foi crescendo
livro na pasta
bola no campinho
expulso de escotas
andava pelos pastos
atrás de jumentas
amava também as meninas
o corpo chorava envolvido
entre o conselho e o castigo
severo dos velhos pais
era uma vez um menino
adolescente do interior
foi pensando
conheceu josé de alencar
beijou os lábios de iracema
viu jorge amado
amou gabriela
ouviu o cavaleiro da esperança
chorou com os capitães da areia
riu com monteiro lobato
passeou com érico veríssimo
olhando os lírios dos campos
sonhou com machado de assis
idolatrou castro alves
mordeu a isca da poesia
era uma vez um adolescente
adolescente do interior
foi pensando
andou com hermann hesse
vestido como sidarta
mergulhou nas florestas
em nascentes de rios límpidos
bebeu com Nirvana
ultrapassou os muros dos tempos
percorreu ruas das sociedades
envolveu-se com marx
papeou sobre as esquinas
visando tomeá-las
chocou-se em vielas
o peso da liberdade
fez na sua mente moradia
filosofou nos bares da vida
buscando sabedoria
afogou-se
em oceanos de frustrações
embarcações sem lemes
perdido entre perdidos
ironicamente anarquizado
viveu no cômodo mal-bom•viver
sentindo no luxo o lixo
sentindo no lixo o luxo
virou geléia geral
sob as fantasias dos líderes
serenamente evaporou
queria vida
era uma vez um homem
homem do mundo
foi vivendo
sem medo sem ódio
alto como o céu
cheio como a esperança
perpetuou-se na fortaleza
infinita da poesia
Milton Gama
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