sexta-feira, 8 de novembro de 2019

O MÊS PRESENTE




Sinto que o mês presente me assassina,
As aves atuais nasceram mudas
E o tempo na verdade tem domínio
Sobre homens nus ao sul de luas curvas.
Sinto que o mês presente me assassina,
Corro despido atrás de um cristo preso,
Cavalheiro gentil que me abomina
E atrai-me ao despudor da luz esquerda
Ao beco de agonia onde me espreita
A morte espacial que me ilumina.
Sinto que o mês presente me assassina
E o temporal ladrão rouba-me as fêmeas
De apóstolos marujos que me arrastam
Ao longo da corrente onde blasfemas
Gaivotas provam peixes de milagre.
Sinto que o mês presente me assassina,
Há luto nas rosáceas desta aurora,
Há sinos de ironia em cada hora
(Na libra escorpiões pesam-me a sina)
Há panos de imprimir a dura face
À força de suor, de sangue e chaga.
Sinto que o mês presente me assassina,
Os derradeiros astros nascem tortos
E o tempo na verdade tem domínio
Sobre o morto que enterra os próprios mortos
O tempo na verdade tem domínio,
Amém, amém vos digo, tem domínio
E ri do que desfere verbos, dardos
De falso eterno que retornam para
Assassinar-nos num mês assassino.

Mário Faustino

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