sexta-feira, 4 de novembro de 2016

How come my dog don´t bank


Eu vou levar o cachorro pra passear, eu falei pra ela. Eu nem tinha um cachorro. E ela pareceu não se importar com o que eu disse. Ela preferiu acreditar que eu tinha um cachorro e que eu tava levando ele pra passear. Foi nessa hora que eu pensei que eu sempre quis ter um cachorro. Eu lembro do meu amigo falando... é, eu tinha um amigo. Um daqueles amigos que as mulheres odeiam que você tenha como amigo. Um daqueles que sempre estão te ligando de madrugada e dizendo “vamos beber uma?”. Aí ela grita da sala: “É aquele filho da puta do seu amigo que quer beber outra, né?” E aí você diz num fiapo de voz: “Não é outra. Eu não bebi a primeira ainda”. Aí ela diz: “Foda-se. Manda esse seu amigo pro inferno. Ou manda ele arrumar uma mulher. Ou um outro amigo. Ou uma bosta de um cachorro... que beba com ele de preferencia pra ele parar de te ligar pra você beber outra”. Pois é, eu tinha um amigo. Ele desistiu de mim. Todos os meus amigos desistiram de mim. Eu devia mesmo ter um cachorro. Talvez o cachorro não desistisse de mim. Acho que é por isso que chamam de fidelidade canina. Bom, mas agora é tarde. Eu não tenho um cachorro. E nem amigos. Mas isso não importa muito pra ela. Eu dizer que eu vou levar o cachorro que nós não temos pra passear basta pra ela. O importante é que eu saia da presença dela. Por alguns minutos, ou algumas horas de preferencia. Eu devia aproveitar e ir beber com meus amigos. Mas como já disse, eu não tenho mais amigos. E se eu tivesse amigos ou um cachorro, eu poderia então beber com eles ou perguntar para o meu cachorro: “O que nós fizemos das merdas das nossas vidas?” Esse mesmo amigo. Esse que não é mais meu amigo e que desistiu de mim... que arrumou outro amigo ou então pelo menos descolou um cachorro pra beber com ele...bom, esse meu amigo quando ficou sabendo que eu ia casar, falou: “Descola um cachorro, meu amigo. E um sofá grande e confortável”. Eu perguntei por que. E ele disse: “O sofá é onde você vai passar a maior parte das suas noites e o cachorro é o único que vai te receber com amor quando chegar em casa”. Ele foi cruel. Ele tava certo. E eu tava certo em querer acreditar que ele tava errado. Afinal o que seria de nós, pobres desgraçados românticos se não nos sobrasse essa fé inabalável em miragens?

E eu levo o cachorro que não tenho pra passear. E eu ando com ele pela rua deserta do meu bairro de madrugada. E naquelas casas frias há homens e mulheres tristes e frustrados com suas vidas tristes e crianças que ainda não sabem que são tristes, mas não vai demorar para que descubram. Afinal as crianças crescem e entopem o mundo com suas presenças tristes de adultos sem esperança. E há os cachorros que irracionalmente buscam o afeto dessas pessoas tristes com seus olhos tristes de cachorros que imploram por amor e afeição. Os cachorros que uivam para a lua solitários como o homem que anda na rua conversando com seu cachorro imaginário.

(Mário Bortolotto)


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