João Guimarães Rosa - Tutaméia - (Ou "Terceiras
Estórias") - Conto "Retrato de Cavalo". (Rosa, João Guimarães;
Ed. Nova Fronteira, 5a ediçâo, Rio de Janeiro: 1985; pgs. 146 a 150.)
Análise:
"Dai, pois, como já se disse, exigir a primeira leitura
paciência, fundanda em certeza de que, na segunda, muita coisa, ou tudo, se
entenderá sob luz inteiramente outra." Schopenhauer.
A citação a Schopenhauer, logo ao início do índice, indica
como os mini-contos das terceiras estórias devem ser (re)lidos. Se um romance
não se faz apreendido integralmente em única leitura, tampouco mini-romances
como os constantes desse livro, idem. Embora a preferência deste que vos
escreve seja pelas primeiras estórias, especificamente, o conto "A
Terceira Margem do Rio", há aspectos interessantes no conto objeto acima.
A surpresa que nos traz o conto é que o cavalo mencionado é
tão personagem como os outros três criados: Bio, Iô Wi e sua namorada.
Bio, o protagonistra principal, é idiossincrático e genuíno
como os seres da humanidade: "um retrato é pior do que mau-olhado (p.
148)"; longe de representar superstição, como muitas das análises
consideram atributos do protagonista.
Afinal, o casamento de Iô Wi e sua namorada, não só
representa, sem supertisções, a estória de um passado enamorado, como a
incerteza de um matrimònio futuro. Falar-se-ia de um tempo único, mesclando
passado, presente e futuro, por meio de abstrações sobre um retrato.
É nítica a crítica ao método científico Cartesiano.
Descartes propõs a realidade em um nível dualístico ("res cogitans" e
"res extensa"; respectivamente, mente e matéria). Neste conto,
Guimarães Rosa, ao mesclar figuras-objeto por meio da linguagem, dá vida à "res
extensa" tranformando-a em "res cogitans": como, por exemplo,
"Cavalo de terrível alma!" - p. 149).
Assim, o cavalo que Bio montava, cavalo este adquirido de
Nhô Moura, era aquele da sua imaginação, autêntica "res cogitans".
Mas, ao final do conto, há o que de melhor oferece o autor aos seus leitores.
Há a morte de (supostamente) dois cavalos e duas idéias às
tais mortes associadas. Haveria uma morte do cavalo imaginário de Bio:
"cavalo tão cidadão (p. 149)"; logo "res cogitans"; e as
ações de Nhô Wi indo em direção oposta. De propósito, para inserir o leitor
nesta mescla de objeto-sujeito. E surge a narrativa final. Nhô wi faz traz a
confusão ao enredo.
Diz Nhô Wi (da verve "res extensa"), para
surpresa: "Você Bio enterrou seu Lirialvo"; "Bio você quer o
retrato?"; e "Bio, a gente nunca se esquece..." (pgs. 149).
Eduardo Ribeiro Toledo