Sempre morei em casa, mas meu coração
Sempre foi um guri de apartamento,
Um navio que navegava na varanda da casa,
Um pedaço bovino e inerte num supermercado,
Embora incrivelmente consciente de estar morto.
Sempre fui tão estranho a mim mesmo
Como os advérbios de tempo à linguagem quotidiana.
Sempre fui um sempre que jamais compreendera o amanhã,
O ontem o o hoje, sempre ignorante ao presente.
Sempre fui o sujeito de mãos nos bolsos,
Sempre fui o passante da rua asfaltada,
Sempre fui o que passava, via tudo e não via nada.
Sempre fui o tolo debaixo de um toldo de loja,
Esperando pelo vendedor de guarda-chuvas que nunca veio.
Ah, aspirações no asfalto, molhadas de chuva,
Embaixo de meus pés!
Ah, aspirações que não passam de palavras no coração!
Como me mandastes, fui ao Japão,
Mas deixei meu futuro numa noite úmida, em Shibuya.
Agora, ó minhas aspirações no asfalto, não passais
De folhas de um jornal que ninguém leu,
De estúpidas e ridículas aliterações de um poema na página,
De uma pequena pena que escreve uma tristeza sem lágrimas
Na página.
E não há nem nobreza no solo seco que há escondido em mim,
Pois o asfalto ainda é chuvoso.
Ah, pudera voltar ao quarto de há séculos,
Deitar na cama atemporalmente infantil,
Olhando as estrelas fosforescentes do teto,
Vivenciando os sonhos que me visitavam
Com toda a verdade da infância!
Mas eu, guri de asfalto que sempre morou em casa,
Cresci.
E algo cresceu e ainda cresce aqui dentro,
Algo que transborda mais que o mar,
Que mata mais que tsunamis, que minhas estúpidas
Aspirações de adulto no asfalto
Não conseguem evitar.
Algo que desesperadamente deseja sair, mas não tem como,
Algo furioso como um animal recém enjaulado,
Algo sedado pela incompreensível
Injeção da desilusão.
15 de agosto de 2011
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