Aquática paisagem, faixas de areia e uma seqüência de
morros, horizonte simulando música. Quiosques vendem camarões e mariscos.
Meninos magros e morenos jogam bola com uma cabeça decepada. A velha senhora
inglesa lê o Herald Tribune com lentes bifocais. O sorveteiro anuncia profecias
apocalípticas. Há um furacão nas ilhas Fidji. Esferas planas surgem no céu de
Okinawa, como pegadas de urso. Um sargento aposentado em Kansas conversa com os
peixes. Não há nada que seja realmente absurdo. Tudo está escrito em algum
lugar, nas Tábuas de Esmeralda, no Popol Vuh, no Livro Tibetano dos Mortos. Há
quem diga que a espuma no oceano é uma linguagem. Há uma lógica irrefutável no
movimento dos astros. O destino foi escrito nas palmas de nossas mãos. Tudo
isso ignoro, não me diz respeito; palavras são detritos como algas, conchas ou
brincos oferecidos à deusa das águas. Eu só deslizo as pinças entre
possibilidades. Invisto minha carapaça vermelho-marrom, que você tanto ama, até
o centro da dúvida, para encontrar minha fábula. Eu sou a imagem deste enigma,
a contradição de um crustáceo.
Cláudio Daniel
2007
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