— Oi, cumpadi, tava passando aqui perto, vim entregá umas
lenha na casa do Bentão, resorvi fazê um visitinha pro amigo.
— Deixa disso, home! Não precisa tanta justificava pra
visitá um amigo, cumpadi.
— Então, aproveitando, como tá na boca do povo, vim sabê do
amigo se é verdade...
— Deixa de cerimônia, vá logo pro assunto.
— Como tava falando... o povo tá dizendo que o amigo vai
entrá na polícia.
— Mais se é isso que o povo tá falando, pois é, é a mais
pura das verdade. Pro começo vou saiípra vereador. Dispois, saio pra prefeito.
— Mais então... num era o cumpadi que dizia que os político
é uma cambada safado, vagabundo, de mode que só se elege por conta de troca de
galinha por voto, e com promessa de trabalho fácir pros coitado ignorante?
— Falei e sustento. Mais de tanto falá, e vê que as coisa
não muda, resorvi fazê arguma coisa. Do jeito que tá não dá pra ficá. O povo
não sab votá porque não tem pessoas de bem pra ele escolhê.
— Também acho. As coisa tem de mudá de rumo. O cumpadi na
política vai limpá toda essa sujeira que tá aí.
— E num é, home? Num dá pra ficá quieto com tanto malefício
dessa gente. Mudando de prosa, fiquei sabendo que a cumadi deu a luz pra um
rapagão forte que nem um toro. Como vai ela?
— Tá acamada, de quarentena, pra se recuperá.
— A cumadi tem de si alimentá bem. Quando tiver indo, pára
no quintar e pega uma galinha gorda pra fazê uma canja.
— Isso é bão, ela tá fraquinha mesmo.
— É, o cumpadi vai ter mais uma boca. Mais onde come oito,
come nove, num é?
— E onde come nove, come déis, cumpadi. Mais a coisa num tá
fácir não. Parece que todo mundo só usa fogão a gás, e agora ainda vem esse tar
de forno microonda. Dizem que é a modernidade que chegô.
— Dispois de me elegê, vou arrumá pro amigo entregá lenha lá
na câmera dos vereador.
— Ia ser loco de bão. Mais já tive por lá, oferecendo meus
serviços na câ-mera, um dos vereador me falô que fogão a lenha não é
politicamente correto.
— Mas isso que nós vai vê dispois que eu me elegê. É claro
que é correta¬mente político ajudá nosso conterrâneo. Não se zangue, não só vô
colocá o fogão a lenha como vô contratá o amigo pra cuidá do fogo pra fazê café
pros vereador. O expediente é curto, duas hora por dia treis veis por semana e
o salário é bão.
— Mais eu fico muito agradecido da lembrança e da confiança
do amigo. Então por isso que eu vim aqui, queria me oferecê pra ajudá na
campanha, pode contá com meu apoio. Então eu vou indo pra casa, cumpadi.
— Não esqueça da galinha gorda.
— Não vou esquece, não. Inté.
— Inté.
Mais tarde, em casa…
— E daí, home, falô com aquele avarento do cumpadi pra te
pagá a lenha que tá devendo faiz uma data? Falô também que se ele entra na
polí-tica não vai recebê um voto sequer da nossa família?
— Não diga uma coisa dessas, muié. Ele mandou inté uma
galinha gorda pra ocê, me prometeu emprego na câmera. A política amolece o
coração do home, ele é otra pessoa.
— Se é assim, vamô apoiá ele.
JDamasio Contos de gaveta
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